Carlos Newton
O ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, demonstrou ser altamente irresponsável ao convocar a imprensa no domingo, dia 24, para afirmar que a prisão dos irmãos Brazão e do delegado Rivaldo Barbosa marcava o fim das investigações sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista Anderson Gomes, ocorrido há seis anos.
“A Polícia identificou os mandantes e os demais envolvidos. É claro que poderão surgir novos elementos que levarão eventualmente a um relatório complementar da Polícia Federal, mas, nesse momento, os trabalhos foram dados como encerrados”, disse o ministro da Justiça, intrometendo-se claramente no trabalho da Polícia Federal, que a ele é subordinada.
SEM PROVAS – Dois dias depois, a imprensa mostrou que Lewandowski está completamente equivocado. Oportuna reportagem de Ítalo Nogueira e Bruna Fantti, na Folha desta terça-feira, revela que o relatório da Polícia Federal que justificou a prisão dos mandantes não apresenta provas materiais que confirmem as acusações feitas pelo autor dos disparos, o ex-policial militar Ronnie Lessa, na delação premiada.
A chamada legislação anticrime, aprovada em 2019, determina que, por si só, a delação não é suficiente para condenação dos réus, sendo indispensável haver provas materiais de corroboração.
Em seu relatório, a PF reconhece as dificuldades em comprovar pontos da delação de Lessa, em razão de o crime ter sido praticado há seis anos, acrescentando também que houve envolvimento de agentes de segurança capazes de encobrir rastros e dificultar as investigações.
SEM ESPERANÇAS – O pior é que a Polícia Federal diz não ter a menor possibilidade de encontrar essas provas materiais.
“Diante do abjeto cenário de ajuste prévio e boicote dos trabalhos investigativos, somado à clandestinidade da avença perpetrada pelos autores mediatos, intermediários e executor, se mostra bem claro que, após seis anos da data do fato, não virá à tona um elemento de convicção cabal acerca daqueles que conceberam o elemento volitivo voltado à consecução do homicídio de Marielle Franco e, como consequência, de seu motorista Anderson Gomes”, afirma o relatório.
A frase é peremptória – avisa que “não virá à tona” uma prova cabal do envolvimento dos mandantes. Mesmo assim, o relatório pede a prisão dos irmãos Brazão e do delegado Rivaldo Barbosa, que foi acatada pelo ministro Moraes e festejada pelo ministro Lewandowski, vejam o alto grau de irresponsabilidade dessa gente.
TUDO ERRADO – Por causa da suposta participação de um deputado federal, o inquérito foi parar no gabinete de Moraes no Supremo, que mandou prender logo os três suspeitos, mesmo sem haver provas materiais contra eles, repita-se ad nauseam, como dizem os juristas.
A PF não conseguiu confirmar nem mesmo os encontros de Ronnie Lessa com os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão, relatados na delação. Além disso, sequer estabeleceu-se uma vinculação entre a família Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa, ex-chefe de Polícia Civil acusado de participar da preparação do homicídio e atuar para obstruir as investigações.
E são indispensáveis essas provas para comprovar que o delator disse a verdade ao depor. Caso contrário, a delação não vale uma nota de três reais. E tudo, inclusive as prisões, passa a ser de mentirinha, como dizem as crianças.
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P.S. 1 – Tudo isso parece uma grande Piada do Ano, mas não tem nenhuma graça. Pelo contrário, mostra que a Polícia Federal, com tantos serviços prestados na Lava Jato, agora tornou-se tão leviana quanto o Supremo, que condenou como “terrorista” uma professora de 72 anos, aposentada e carente, recém operada do fêmur. Como não fez selfie no 8 de Janeiro, ela pegou apenas 14 anos de prisão. Se tivesse mandado alguma mensagem a parentes ou amigos, a condenação subiria para 18 anos.
P.S. 2 – Bem, quando não se pode contar com a Polícia nem com a Justiça, é hora de olhar o aeroporto com mais simpatia. (C.N.)