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quarta-feira, setembro 28, 2022

Profissionais do improviso - Editorial




Na gestão bolsonariana, governo e Congresso são especialistas em criar despesas populistas sem dizer de onde virá o dinheiro, e depois correm para inventar os meios para financiá-las

Só faltou planejar, mas isso está fora dos padrões atuais de Brasília. Primeiro se inventa a despesa, depois se procura o dinheiro ou se imagina uma fonte tributária. O Auxílio Brasil será mantido em R$ 600 no próximo ano, prometeu de novo o ministro da Economia, mas isso dependerá de uma nova tributação de lucros e dividendos. Disso dependerá também a correção da tabela do Imposto de Renda, compromisso eleitoral do presidente Jair Bolsonaro, empenhado há mais de três anos na busca da reeleição. O mesmo conceito de gestão pública predomina entre os congressistas. Senadores têm procurado, nos últimos dias, formas de custear o piso da enfermagem, estabelecido por lei e suspenso, por precaução, pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Um grupo de parlamentares sugeriu o uso de verbas do orçamento secreto para cobrir esse gasto. Se isso ocorrer, um desmando orçamentário será usado para remediar um tropeço legislativo.

Sem planos, sem metas, sem programas e, a rigor, sem política econômica, o País se move como um ônibus desgovernado, sem rumo e sem segurança. Excetuada a ação federal nos primeiros meses da pandemia, o Brasil tem vivido sob o domínio da imprevidência e da improvisação. A redução e a posterior suspensão da ajuda emergencial, entre setembro de 2020 e abril de 2021, poderão ser citadas, durante décadas, como provas de um incrível desgoverno. Num país ainda assolado pela onda inicial da covid-19, o Orçamento para 2021 foi concebido sem verba para continuação das medidas anticrise.

Nada houve, no entanto, de excepcional nesse descuido. Imprudência, improvisação e desprezo às necessidades sociais, incluídas educação e saúde, seriam marcas da gestão bolsonariana até o fim do mandato. Nesse trajeto, o presidente Jair Bolsonaro teve a seu lado, é preciso reconhecer, ministros compatíveis com suas características políticas e administrativas, incluído o responsável pela área econômica.

Como seu chefe, o ministro da Economia, Paulo Guedes, emprega linguagem agressiva para disfarçar suas falhas e proclama realizações imaginárias. Acusa economistas do mercado, de instituições internacionais e do Banco Central do Brasil de errar nas projeções econômicas. Pode ter havido erros e correções, mas insignificantes diante do pífio desempenho econômico nestes quase quatro anos.

Se houve algum grande fracasso, foi de Bolsonaro e de Guedes. Se o País crescer perto de 3% neste ano, sua expansão média em quatro anos continuará inferior à média mundial, como indicou o Estadão no último domingo. Nos três anos anteriores, o Brasil ficou em 32.º lugar num ranking de crescimento de 50 países, segundo cálculos citados naquela edição.

“Nós mudamos a dinâmica de crescimento da economia brasileira”, disse o ministro, nesta semana, em entrevista à Rádio Guaíba. Por enquanto, a mudança mais evidente foi a redução do ritmo da atividade, num ambiente de alto desemprego e muito empobrecimento. Os R$ 900 bilhões de “investimentos contratados para os próximos dez anos”, por meio de concessões e privatizações, são por enquanto uma vaga promessa de um governo caracterizado, até agora, pelo emperramento econômico e pela escassa geração de potencial produtivo.

No segundo trimestre, o valor investido em capital fixo equivaleu a 18,7% do Produto Interno Bruto (PIB), praticamente a mesma proporção de um ano antes (18,6%). Em vários períodos, nos últimos 20 anos, a taxa igualou e até superou 20%.

Além disso, a gestão Bolsonaro nada fez de sério para deter a desindustrialização do País. “Somos cuidadosos com a indústria, queremos reindustrializar o País”, disse o ministro Guedes. O problema era evidente em 2019, mas agora o ministro fala em cuidar do assunto se o presidente for reeleito. Ele reivindica um segundo mandato para tarefas negligenciadas no primeiro. Também promete criar um fundo de erradicação da pobreza, como se renegasse duas das principais façanhas bolsonarianas, o empobrecimento de milhões e o restabelecimento da fome. Será uma transfiguração milagrosa? 

O Estado de São Paulo

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