Por Josias de Souza
O surto de descaramento que varre Brasília registrou duas novas manifestações. Numa, um desembargador convocado para atuar como ministro do Superior Tribunal de Justiça, Jesuíno Rissato, anulou condenações impostas pela Lava Jato a 13 pessoas. Entre elas o ex-ministro Antonio Palocci, o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Netto, o ex-príncipe das empreitadas Marcelo Odebrecht e o casal de marqueteiros de antigas campanhas petistas João Santana e Mônica Moura.
Noutra erupção de desfaçatez, o ministro do Tribunal de Contas da União Raimundo Carreiro força a porta para votar no plenário do órgão auditoria nos gastos do cartão de crédito corporativo de Bolsonaro. Relator do processo, Carreiro foi indicado pelo presidente para o cargo de embaixador do Brasil em Portugal. Corre no TCU um pedido de suspeição contra ele. Mas Carreiro não se deu por achado. Seu relatório sobre a auditoria seria votado nesta quarta-feira, em sessão secreta. O absurdo foi momentaneamente adiado. Mas o ministro-embaixador insiste em retomar o assunto na semana que vem.
No caso do STJ, o doutor Jesuíno anulou sentença emitida pelo então juiz Sergio Moro em 2017. Refere-se a uma megacorrupção de cerca de R$ 200 milhões. Coisa confessada e comprovada. Não se discute o roubo, mas a foro de julgamento. Alegou-se que parte do desvio financiou o caixa dois de campanhas eleitorais do PT. E o juiz, escorando-se em jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, determinou que o processo recomece do zero na Justiça Eleitoral. Jesuíno substitui no STJ o relator da Lava Jato, ministro Felix Fischer, que está de licença médica. O titular do posto não tomaria decisão semelhante à do substituto.
No episódio do TCU, o ministro Raimundo Carreiro aguarda apenas que o Itamaraty defina uma data para que assuma a embaixada brasileira em Lisboa. Mas ele se sente à vontade para julgar os gastos do cartão de Bolsonaro. Numa conversa com a Folha, ele atribui o pedido para que se declare suspeito não à indicação para a embaixada, mas ao fato de ter sido elogiado por Bolsonaro. "Não vou declarar-me suspeito", ele disse.
O Congresso deveria analisar a hipótese de votar um projeto de Constituição que o historiador Capistrano de Abreu sugeriu para o Brasil há mais de um século. Teria apenas dois artigos. Artigo 1º: Todo brasileiro deve ter vergonha na cara. Artigo 2º: Revogam-se as disposições em contrário.
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