Pedro do Coutto
A liberação do vídeo gravado na reunião ministerial de 22 de abril comprova que nosso país encontra-se no meio de uma tempestade política e que o governo Bolsonaro não possui um projeto construtivo para o desenvolvimento econômico e social. Parecia algo inacreditável. Mas a verdade se impôs e chego à conclusão a respeito da gravidade de um conflito ideológico que dificilmente poderá encontrar uma saída.
A análise política para ser eficaz tem de ter como base uma serenidade crítica. Exatamente o contrário daquilo que o vídeo revelou. Não há serenidade crítica nem autocrítica.
ATAQUE AO SUPREMO – O ministro da educação atacou o Supremo Tribunal Federal defendeu a prisão dos ministros o que, na prática, corresponde ao fechamento do Poder Judiciário. Sim, porque a ordem de prisão abriria um vazio institucional deixando tudo na mão do Executivo. Se o STF fosse fechado, o mesmo aconteceria com o Poder Legislativo. Estaríamos assim em uma ditadura.
É bom lembrar que nem Getúlio Vargas na ditadura de 37 a 45 fechou a Corte Suprema. Na ditadura que o país enfrentou de 1964 a 1985 o STF funcionou, mas três ministros foram aposentados compulsoriamente. Evandro Lins e Silva, Gonçalves de Oliveira e Vitor Nunes Leal. O governo Castelo Branco impôs, com a nomeação dos substitutos uma maioria na Corte. Mas esta é uma questão que está incorporada à História.
REINO DA INTOLERÂNCIA – Hoje enfrentamos uma outra realidade, um novo cenário, um novo estilo que nasce da multiplicidade de opiniões, porém todas elas convergentes num só propósito: implantar a intolerância na Nação. O ministro da Educação sequer causou reação contrária de Jair Bolsonaro. O do Meio Ambiente defendeu de forma quase direta o processo de desmatamento que está agredindo a Amazônia. O ministro do Exterior dois meses antes da reunião havia se pronunciado criticando o relacionamento do Brasil com outros países nos quais ele interpreta como sabotadores do nosso país.
Outro ministro defendeu a reimplantação dos cassinos que foram proibidos de funcionar em 1946, logo no primeiro decreto-lei do presidente Eurico Dutra. De 46 até agora estão fechados. A ministra Damares, da Mulher e da Família, viu nos cassinos a presença de algo diabólico.
UM POVO ARMADO – O mais importante de tudo, de fato, foi o presidente da república defender com emoção o armamento geral no país. Um povo armado jamais será escravizado, ele disse. Identifiquei nessa afirmativa uma ameaça à segurança interna brasileira, como se o país estivesse em guerra civil. O fato de pessoas adquirirem armas é perigosíssimo por dois motivos fundamentais. Acirra questões de divergências simples e também insinua a eclosão de uma guerra civil.
Além disso contribui para que os grupos criminosos tenham acesso facilitado à compra de armas. Ao invés de desarmar os bandidos proporcionaria mais ainda seu fortalecimento. Sobretudo no Rio de Janeiro, cidade ocupada flagrantemente pelo crime organizado e também pela violência generalizada, inclusive com existência de milícias.
NÃO HÁ PROJETO – Nem uma palavra foi pronunciada em relação a qualquer projeto construtivo capaz de levar o Brasil a um processo consolidado de desenvolvimento econômico e social. Nada se ouviu a respeito de medidas voltadas para a recuperação da economia, abalada por contradições que surgem no dia a dia da vida nacional.
A frase usada pelo ministro Paulo Guedes em relação ao Banco do Brasil sintetiza uma visão global sobre o que se passou numa tarde de abril. Guedes disse que temos de vender logo o BB. Desdenhou da importância do Banco, reduzindo-o a uma coisa qualquer.
O desprezo ficou evidente.