Cleidiana Ramos, do A TARDE
Fernando Amorim / Agência A Tarde
Ialorixá Jaciara Santos comemora decisão da Justiça
Os herdeiros da ialorixá baiana Gildásia dos Santos e Santos, a mãe Gilda, ganharam mais um round da luta travada com a Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd). O Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou a igreja a indenizar os filhos e o marido da sacerdotisa do candomblé por danos morais.
Segundo profissionais da área de direito, é a primeira vez que o STJ decide sobre uma ação que envolve intolerância religiosa cometida por uma instituição. “O que temos ainda em andamento são processos em que indivíduos isolados cometem o crime. Mas, neste caso, a ação partiu de forma institucionalizada, ou seja, por um órgão pertencente à Iurd, no caso, a Folha Universal”, explica o promotor de justiça Almiro Sena. Ele é o titular da Promotoria de Justiça de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa, criada há 11 anos e de forma pioneira pelo Ministério Público da Bahia.
Pela decisão do STJ, os herdeiros, em conjunto, vão receber pouco mais de R$ 145 mil, cabendo R$ 20.750 para cada um. Segundo um dos advogados dos herdeiros, Maurício Araújo, o valor será corrigido, tendo como parâmetro o ano de 1999, quando aconteceu a ofensa. Desta forma, a indenização ficará em cerca de R$ 400 mil. Ainda cabe recurso de ambas as partes. Neste caso, o julgamento será feito pelo chamado “pleno” do tribunal. A atual sentença foi dada pela Quarta Turma.
O total fixado pelo STJ ficou abaixo da indenização de R$ 1,3 milhão estabelecida na sentença do juiz Clésio Rômulo, da 17ª Vara Cível da Bahia, em 2004. Um ano depois, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ) fixou um novo valor: R$ 960 mil.
“O valor dado pelo STJ está bem abaixo do que pretendíamos, mas comemoramos a condenação histórica. O STJ reconheceu a intolerância religiosa praticada pela Iurd”, explica Araújo. Segundo o advogado, os herdeiros apresentarão recurso para contestar o valor. “Vamos aguardar a publicação da sentença, que deve ocorrer a partir da próxima terça”, comenta.
Na avaliação de Maurício Araújo, o STJ seguiu uma padronização de valores que costuma adotar. “A meu ver, a indenização poderia ser mais alta por conta da peculiaridade do dano”, avalia Araújo. Em casos de danos morais, a legislação estabelece pisos específicos para evitar situações, como por exemplo, enriquecimento a partir da ação.
A TARDE entrou em contato com a assessoria de comunicação da Iurd, que fica em São Paulo. Foram obedecidas todas as exigências feitas pela assessoria para a obtenção de resposta da igreja – envio de e-mail formal, com detalhamento do assunto. Ao final do prazo, a assessoria informou que a direção da Iurd não deu nenhum tipo de resposta sobre o pedido da reportagem.
LUTA – A origem da ação judicial contra a Iurd foi a publicação, em 1999, de uma foto da mais alta sacerdotisa do terreiro Ilê Axé Abassá de Ogum, localizado em Itapuã, numa reportagem da Folha Universal intitulada "Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida dos clientes".
Mãe Gilda morreu de infarto em 21 de janeiro de 2000, um dia após assinar a procuração para a abertura do processo. “Minha mãe tinha a saúde fragilizada e piorou depois do choque de ver sua foto na reportagem”, conta a ialorixá Jaciara Santos, filha biológica e sucessora de mãe Gilda no comando do terreiro. Embora considere baixo o valor da indenização concedida pelo STJ, ela afirma que a decisão tem um forte simbolismo.
“Foram nove anos de luta, mas estou feliz por ver a Iurd condenada”, diz a ialorixá, que neste sábado, 20, participa de uma marcha contra a intolerância religiosa no Rio de Janeiro. Ela também participou de uma ação contra a intolerância religiosa realizada nesta sexta-feira, 19, em Salvador.
JURISPRUDÊNCIA – Para a coordenadora local da Koinonia, Jussara Rêgo, a decisão do STJ abre jurisprudência. “Embora a indenização tenha sido baixa, abriu-se a possibilidade de punição para casos semelhantes”, diz. A Koinonia é uma ONG que assessora comunidades como as dos terreiros.
O advogado Samuel Vida, professor da Ufba e da Ucsal, também elogia a decisão. “O reparo que faço é em relação ao valor da indenização. A política de fixação de valores irrisórios pelos tribunais reduz o efeito pedagógico da punição”, diz Samuel Vida, que é coordenador do Afro-Gabinete de Articulação Institucional e Jurídica (Aganju).
A batalha dos herdeiros de mãe Gilda tornou-se um símbolo da luta pela liberdade de culto em todo o Brasil. O dia da sua morte é a data nacional de combate à intolerância religiosa por meio de um projeto do deputado federal Daniel Almeida (PCdoB), que foi sancionado pelo presidente Lula no ano passado. A ação foi inspirada numa lei vigente em Salvador e que partiu da iniciativa da vereadora Olívia Santana (PCdoB).
Fernando Amorim / Agência A Tarde
Ialorixá Jaciara Santos comemora decisão da Justiça
Os herdeiros da ialorixá baiana Gildásia dos Santos e Santos, a mãe Gilda, ganharam mais um round da luta travada com a Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd). O Superior Tribunal de Justiça (STJ) condenou a igreja a indenizar os filhos e o marido da sacerdotisa do candomblé por danos morais.
Segundo profissionais da área de direito, é a primeira vez que o STJ decide sobre uma ação que envolve intolerância religiosa cometida por uma instituição. “O que temos ainda em andamento são processos em que indivíduos isolados cometem o crime. Mas, neste caso, a ação partiu de forma institucionalizada, ou seja, por um órgão pertencente à Iurd, no caso, a Folha Universal”, explica o promotor de justiça Almiro Sena. Ele é o titular da Promotoria de Justiça de Combate ao Racismo e à Intolerância Religiosa, criada há 11 anos e de forma pioneira pelo Ministério Público da Bahia.
Pela decisão do STJ, os herdeiros, em conjunto, vão receber pouco mais de R$ 145 mil, cabendo R$ 20.750 para cada um. Segundo um dos advogados dos herdeiros, Maurício Araújo, o valor será corrigido, tendo como parâmetro o ano de 1999, quando aconteceu a ofensa. Desta forma, a indenização ficará em cerca de R$ 400 mil. Ainda cabe recurso de ambas as partes. Neste caso, o julgamento será feito pelo chamado “pleno” do tribunal. A atual sentença foi dada pela Quarta Turma.
O total fixado pelo STJ ficou abaixo da indenização de R$ 1,3 milhão estabelecida na sentença do juiz Clésio Rômulo, da 17ª Vara Cível da Bahia, em 2004. Um ano depois, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ) fixou um novo valor: R$ 960 mil.
“O valor dado pelo STJ está bem abaixo do que pretendíamos, mas comemoramos a condenação histórica. O STJ reconheceu a intolerância religiosa praticada pela Iurd”, explica Araújo. Segundo o advogado, os herdeiros apresentarão recurso para contestar o valor. “Vamos aguardar a publicação da sentença, que deve ocorrer a partir da próxima terça”, comenta.
Na avaliação de Maurício Araújo, o STJ seguiu uma padronização de valores que costuma adotar. “A meu ver, a indenização poderia ser mais alta por conta da peculiaridade do dano”, avalia Araújo. Em casos de danos morais, a legislação estabelece pisos específicos para evitar situações, como por exemplo, enriquecimento a partir da ação.
A TARDE entrou em contato com a assessoria de comunicação da Iurd, que fica em São Paulo. Foram obedecidas todas as exigências feitas pela assessoria para a obtenção de resposta da igreja – envio de e-mail formal, com detalhamento do assunto. Ao final do prazo, a assessoria informou que a direção da Iurd não deu nenhum tipo de resposta sobre o pedido da reportagem.
LUTA – A origem da ação judicial contra a Iurd foi a publicação, em 1999, de uma foto da mais alta sacerdotisa do terreiro Ilê Axé Abassá de Ogum, localizado em Itapuã, numa reportagem da Folha Universal intitulada "Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida dos clientes".
Mãe Gilda morreu de infarto em 21 de janeiro de 2000, um dia após assinar a procuração para a abertura do processo. “Minha mãe tinha a saúde fragilizada e piorou depois do choque de ver sua foto na reportagem”, conta a ialorixá Jaciara Santos, filha biológica e sucessora de mãe Gilda no comando do terreiro. Embora considere baixo o valor da indenização concedida pelo STJ, ela afirma que a decisão tem um forte simbolismo.
“Foram nove anos de luta, mas estou feliz por ver a Iurd condenada”, diz a ialorixá, que neste sábado, 20, participa de uma marcha contra a intolerância religiosa no Rio de Janeiro. Ela também participou de uma ação contra a intolerância religiosa realizada nesta sexta-feira, 19, em Salvador.
JURISPRUDÊNCIA – Para a coordenadora local da Koinonia, Jussara Rêgo, a decisão do STJ abre jurisprudência. “Embora a indenização tenha sido baixa, abriu-se a possibilidade de punição para casos semelhantes”, diz. A Koinonia é uma ONG que assessora comunidades como as dos terreiros.
O advogado Samuel Vida, professor da Ufba e da Ucsal, também elogia a decisão. “O reparo que faço é em relação ao valor da indenização. A política de fixação de valores irrisórios pelos tribunais reduz o efeito pedagógico da punição”, diz Samuel Vida, que é coordenador do Afro-Gabinete de Articulação Institucional e Jurídica (Aganju).
A batalha dos herdeiros de mãe Gilda tornou-se um símbolo da luta pela liberdade de culto em todo o Brasil. O dia da sua morte é a data nacional de combate à intolerância religiosa por meio de um projeto do deputado federal Daniel Almeida (PCdoB), que foi sancionado pelo presidente Lula no ano passado. A ação foi inspirada numa lei vigente em Salvador e que partiu da iniciativa da vereadora Olívia Santana (PCdoB).
Fonte: A Tarde