Dos 8 cemitérios privados de Salvador, apenas o Campo Santo garante 30% das covas rasas gratuitamente à população de baixa renda
Perla Ribeiro
Enquanto familiares realizam verdadeiras peregrinações em busca de um lugar para enterrar seus mortos, cemitérios particulares descumprem a lei municipal que determina a doação gratuita à população de baixa renda de 30% dos túmulos em quadras de covas rasas. Dos oito cemitérios privados existentes em Salvador, apenas um cumpre à risca a medida prevista no anexo 5 da Lei de Ordenamento do Uso e da Ocupação do Solo, de nº 3.377/84.
Responsável pela fiscalização, a Superintendência de Controle do Uso do Solo do Município (Sucom) alega que, quando não destinam espaço para pobres, os cemitérios devem apresentar contrapartidas ao município. Porém, procurada diversas vezes, a assessoria do órgão não informou quais foram. Caso a determinação fosse seguida à risca, a população carente deveria ter acesso a mais de duas mil vagas por ano nos cemitérios privados de Salvador. Porém, dentre eles, apenas o Campo Santo destina, em uma ala menos nobre, covas rasas gratuitas. Os sepultamentos diários no espaço são limitados entre duas e três vagas.
Responsável por 67% dos enterros da capital, o cemitério Quinta dos Lázaros, que possui 18 mil covas rasas, tem operado no seu limite. Os 6.100m2 de área não comportam mais a demanda de enterros. Com a suspensão provisória dos enterros no local, a população que não tem como desembolsar qualquer centavo para enterrar os entes agora tem que encarar uma nova via-crúcis. Além da dor da perda, é preciso paciência para encontrar vaga em cemitérios gratuitos.
Enquanto resolvia questões burocráticas para liberação do corpo de um vizinho, a vendedora M.N.S. não escondia o desapontamento. “Dá vontade de desistir e deixar enterrar como indigente, mas eu não faço isso porque ele foi uma pessoa muito boa. Era como um pai para mim”, disse, ao ser informada que teria que ir de cemitério em cemitério para checar onde havia vagas para enterrar o aposentado Maurício de Jesus Ribeiro, 67 anos. Sem dinheiro sequer para arcar com as passagens de ônibus, ela não sabia como faria o percurso.
Para ajudá-la, um funcionário da funerária deu as primeiras coordenadas: “No Cemitério Municipal de Pirajá, não tem cova para adulto, Itapuã está cheio, em Brotas só enterra quem tem comprovante de residência da área. Tem que tentar Paripe e Plataforma”, indicou, referindo-se à disponibilidade de vagas em apenas cinco dos dez cemitérios municipais. Destes, seis estão distribuídos na capital e quatro nas ilhas de Paramana, Bom Jesus, Maré e Ponta de Nossa Senhora. Os de Salvador estão em Pirajá, Plataforma, Periperi, Paripe, Brotas e Itapuã.
Por mais dramática que possa parecer, a realidade de M.N.S não assusta, tampouco surpreende, uma vendedora de uma funerária que atua no Instituto Médico-Legal Nina Rodrigues (IML) e preferiu não se identificar. “Essa dor-de-cabeça é todo dia. Recentemente, diante do sofrimento da família, acabei emprestando o comprovante de residência de uma irmã minha para que o morto pudesse ser enterrado no Campo Santo”, contou.
Diante do excesso de demanda, o gerente administrativo do Campo Santo, Antônio Quadros, explica que a única saída é adotar critérios para enterro no local. “Priorizamos as pessoas que moram na região, mas em alguma situações abrimos exceções. Não há como atender a todos”, justifica Quadros. As covas rasas estão situadas na parte dos fundos do Campo Santo, em uma área marginal à ribanceira, que ocupa 5.500m2 dos pouco mais de 55.000m2 utilizados pelo cemitério.
Somente em 2007, o Cemitério Quinta dos Lázaros sepultou 14.072 pessoas. Da média diária de 38 enterros, mais de 20 deles são gratuitos e em covas rasas. Mesmo o cemitério sendo público, conseguir um lugar em sua parte “mais nobre” tem um custo. Porém, os recursos não são destinados aos cofres públicos, mas sim, à Arquidiocese de Salvador e à Irmandade de Nossa Senhora da Conceição da Praia.
Apesar de a população desconhecer, a administração do Jardim da Saudade informou que o cemitério possui 300 vagas em 150 jazigos para os menos favorecidos. Mas há uma ressalva: essas vagas só podem ser utilizadas pelos idosos que a prefeitura encaminha ao Abrigo Salvador e também pelos funcionários de menor poder aquisitivo.
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CUSTOS DE ENTERRO
Jardim da SaudadeR$10.733 (compra do lote, caixa de concreto, lápide, suporte, gravação do número, despesas de sepultamento, aluguel do templo e missa). Média mensal: 100 enterros.
Campo SantoDe R$1.179 (enterro em carneiro sem direito a velório) a R$3.058 (aluguel da campa por três anos, incluindo velório e sepultamento). Média mensal: 180 enterros.
Bosque da Paz R$3.264 (aluguel do lote). Média mensal: entre 80 e 90 sepultamentos.
Quinta dos LázarosR$350 para adulto e R$220 para criança para enterros nos carneiros. A missa sai por R$100.
Ordem Terceira de São FranciscoR$685 o aluguel de carneiro por três anos. Média mensal: entre 30 e 40 sepultamentos.
Ordem Terceira do CarmoR$400 no carneiro por três anos. Média mensal: seis sepultamentos.
Fonte: Correio da Bahia
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