segunda-feira, dezembro 01, 2025

Governo deve substituir sistema de inteligência após falhas de segurança

 

Governo deve substituir sistema de inteligência após falhas de segurança

Por Mateus Vargas e Raquel Lopes/Folhapress

01/12/2025 às 06:52

Foto: Nelson Jr./Arquivo/STF

Imagem de Governo deve substituir sistema de inteligência após falhas de segurança

Ricardo Lewandowski

O Ministério da Justiça e Segurança Pública deve substituir, no primeiro semestre de 2026, a plataforma Córtex, que cruza dados de pessoas, empresas e veículos e é um dos pilares das atividades de inteligência das polícias de todo o país.

O debate ocorre enquanto a pasta comandada Ricardo Lewandowski, além da Polícia Federal, apura episódios de mau uso da plataforma. Como a Folha revelou, cerca de 70 milhões de CPFs foram registrados como autores de mais de 213 milhões de consultas por meio da conta do governo do Rio de Janeiro no Córtex.

Segundo documentos obtidos pela Folha, o novo sistema é tratado como uma modernização do Córtex. A ideia é reduzir riscos incidentes de segurança por meio de auditorias automatizadas, além de aumentar transparência e rastreabilidade das consultas feitas, segundo os mesmos papéis.

A nova plataforma ainda estaria preparada para trabalhar com inteligência artificial e rodar tecnologias de reconhecimento facial. Integrantes do ministério, porém, afirmam que esse tipo de serviço ainda requer debate público exaustivo e não deve ser adotado em curto prazo.

Após detectar as falhas de segurança, o ministério abriu um recadastramento dos órgãos que utilizam o Córtex, processo que foi chamado de "prova de vida institucional". De 18 a 28 de janeiro, a plataforma ficará bloqueada.

Depois dessa data, apenas as entidades recadastradas receberão de volta as credenciais de acesso.

O Córtex teve o uso regulamentado em 2021, no governo Jair Bolsonaro (PL). A plataforma só pode ser usada por integrantes de órgãos que firmam convênio com o governo federal para obter informações em tempo real, principalmente sobre pessoas e placas de veículos.

De forma geral, o sistema é acessado por agentes de segurança por meio de um site do Ministério da Justiça.

Os órgãos conveniados, como polícias e municípios, ainda podem puxar as informações da plataforma federal para programas próprios, sendo que alguns deles têm tecnologias de reconhecimento facial.

Em nota, o Ministério da Justiça diz que o Córtex não é um sistema de vigilância, não acessa câmeras em tempo real nem utiliza inteligência artificial ou faz reconhecimento facial. "Ele cruza placas com informações oficiais para apoiar a recuperação de veículos, o cumprimento de mandados e a atuação coordenada" dos órgãos de segurança, afirma o ministério.

No caso do Rio de Janeiro, por exemplo, os agentes de segurança usam um sistema local, que cruza dados do Córtex, durante abordagens de rotina, para conferir se determinada placa é de um carro roubado ou se uma pessoa tem um mandado de prisão em aberto. Os programas Muralha Paulista e Smart Sampa também usam dados do Córtex.

A estratégia de reunir um imenso volume de informações em plataformas é alvo de questionamentos sobre a violação da privacidade e risco de vazamento de dados.

Para o coordenador de Assimetrias e Poder na Data Privacy Brasil, Pedro Saliba, os planos de substituir o Córtex "arrastam consigo riscos a direitos fundamentais, especialmente a proteção de dados e privacidade". Ele afirma que não fica explícita qual a forma de controle externo das atividades de investigação e de outras ferramentas da plataforma.

Saliba diz ainda que a possibilidade de adotar tecnologias de inteligência artificial e reconhecimento facial ou de voz aumentaria a opacidade do processamento das informações. Ele afirma que portaria do próprio Ministério da Justiça impede acesso a dados sigilosos sem decisão judicial ou vinculação clara com uma investigação.

"Apenas com o controle externo é capaz de evitar a sobreposição do Poder Executivo na capacidade de agregar dados para tomadas de decisões, efetivando-se a separação informacional de Poderes", diz ele.

Desde 2024, o Ministério da Justiça tem feito auditorias na plataforma e acionado diversos órgãos para cobrar explicações sobre suspeitas de uso indevido. O caso do Rio é considerado um dos mais graves por integrantes da pasta. No entanto, as contas de outros estados também teriam sido usadas de forma irregular.

"Os elementos técnicos identificados foram encaminhados à Polícia Federal para investigação de autoria e materialidade. Destaca-se que a apuração está em fase preliminar, sem conclusões definitivas, e não há, neste momento, atribuição de responsabilidade a qualquer órgão ou instituição, já que nenhuma linha de investigação foi concluída", diz o Ministério da Justiça.

Integrantes da pasta suspeitam que os dados do Córtex tenham sido raspados em consultas robotizadas por meio de chaves originalmente concedidas à Polícia Militar do Rio de Janeiro, e que estavam sendo usadas em programa da Secretaria de Governo. A forma de acesso indevida e o destino das informações obtidas ainda estão sob apuração.

Nos últimos meses, o ministério também acelerou a substituição do Córtex. Um documento de julho afirma que a ideia é "criar ótimas condições para o desenvolvimento de aplicações dentro da plataforma" que estejam alinhadas com as tecnologias mais modernas relacionadas a "processamento de dados em tempo real, análise de vínculos, inteligência artificial, machine learning, reconhecimento facial e de voz e deep learning".

Em nota, o ministério afirma que o Córtex está em "processo de substituição gradual por uma solução tecnológica mais moderna, robusta e segura, dotada de padrões ampliados de proteção, governança, rastreabilidade e integridade".

Em reunião de outubro do Comitê de Governança Digital e Segurança da Informação e Comunicação, o plano foi apresentado como medida para "superar algumas das limitações históricas de escalabilidade, segurança, governança e ausência de padronização" do programa.

Integrantes do governo ainda reconheceram que a plataforma apresenta dificuldades técnicas e falhas de segurança por causa da "defasagem de linguagens" e desenvolvimentos paralelos.

"Esse panorama ocasionava uma baixa confiabilidade no Córtex por parte de seus operadores, o que serviu de certa forma como força motriz para a criação do Projeto PIN", diz ainda a ata da reunião, obtida pela Folha.

Outro documento interno do Ministério da Justiça afirma que o projeto visa modernizar a infraestrutura tecnológica e ampliar as funcionalidades do Córtex, com a implantação de um "Data Lake nacional", ou seja, um repositório que armazena grandes volumes de dados, além de uma camada de governança e análise de dados.

Integrantes do governo afirmam ainda que o sistema, que ainda não foi batizado, terá mais segurança em relação ao anterior e deve dificultar o vazamento de bases de dados.

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