Márcio Falcão
TV Globo — Brasília
O ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal Celso de Mello afirmou nesta quarta-feira (6) que, a contragosto, o presidente Jair Bolsonaro se rendeu ao entendimento segundo o qual, na condição de investigado, tem de prestar depoimento pessoalmente à Polícia Federal.
Bolsonaro vinha pedindo para prestar esclarecimentos por escrito no inquérito que apura suposta interferência política dele na Polícia Federal — o que foi negado por Celso de Mello no ano passado, antes de o ministro se aposentar (vídeo abaixo). Ao recorrer da decisão, o presidente fez com que o tema fosse para o plenário do STF.
SÓ TESTEMUNHA – Celso de Mello, então relator do inquérito, determinou que — quando figura como investigado — o presidente tem de prestar esclarecimentos de forma presencial. Segundo o ministro, a Constituição só prevê depoimento por escrito se o presidente é testemunha em um inquérito.
Nesta quarta-feira, horas antes de o plenário do STF iniciar o julgamento que determinaria se o depoimento do presidente tem de ser presencial ou pode ser por escrito, a Advocacia-Geral da União (AGU) informou ao Supremo que Bolsonaro aceitou depor pessoalmente.
De acordo com o blog de Ana Flor, a opção de Bolsonaro foi uma estratégia para evitar que, ao julgar o caso, o Supremo criasse jurisprudência em relação ao tema.
MELLO COMEMORA – Em manifestação divulgada na noite desta quarta-feira, Celso de Mello afirmou que Bolsonaro “precisa convencer-se de que também ele é súdito das leis e da autoridade da Constituição”.
“Bolsonaro, a contragosto, rendeu-se à minha posição que, como antigo Relator do caso no Supremo Tribunal Federal, negou-lhe, corretamente, o direito (de todo inexistente) de responder ao seu interrogatório criminal por escrito”, escreveu o ministro Celso de Mello.
SEM PRIVILÉGIOS – De acordo com o ministro, a decisão dele “reflete e exprime a prevalência ético-jurídica da supremacia e da autoridade da Constituição e das leis da República (‘rule of law’) e não o interesse pessoal e particular do chefe de Estado”.
“Nada justifica a outorga de tratamento seletivo que vise a conceder determinados privilégios e favores a certos agentes públicos , atores políticos ou a determinados estamentos sociais, mesmo porque é a igualdade ‘o parágrafo régio’ que deve sempre prevalecer, de modo soberano, no Estado democrático de Direito”, escreveu Celso de Mello.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – E nesse vaivém, os inquéritos e processos contra políticos e personagens da elite vão se eternizando. Neste inquérito, por exemplo, tudo já está mais do que provado, desde que a Justiça conseguiu a gravação da reunião presidencial repleta de palavrões e expressões criativas, como “passar a boiada”. E la nave va, cada vez fellinianamente. (C.N.)