Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Só há que ficar feliz e comemorar os números divulgados nos últimos dias pelo Ipea, a Fundação Getúlio Vargas, a Caixa Econômica, a Fiesp e outras instituições. Afinal, 3 milhões de brasileiros saíram da pobreza absoluta, onde só ficaram 24,1% dos nossos irmãos, quer dizer, 11 milhões. Além disso a classe média aumentou, chega a 51% da população.
Os ricos também, temos mais 28 mil deles espalhados pelas grandes capitais. Existem mais trabalhadores com carteira assinada e a indústria cresceu. Por último, os bancos estão financiando a aquisição de casa própria no prazo de até 25 anos.
Viva o Brasil, ainda que, com todo o respeito, a gente pergunte que Brasil está sendo objeto de tão ampla campanha de propaganda, coincidentemente às vésperas das eleições municipais. Porque há outro Brasil, paralelo a esse apregoado com fenomenal ajuda da mídia. Começando pelo fim: o sonho da casa própria pode estar sendo realizado para uns, mas o aumento desmedido dos juros faz endividados eternos, de um lado, e o paraíso dos banqueiros, de outro.
Sem esquecer que é bem maior o número daqueles que por falta de opção buscam nas favelas sua residência permanente. Basta olhar as fotografias para ver como esses guetos multiplicam-se a cada dia. E sujeitando seus inquilinos ao horror de subordinar-se a narcotraficantes e bandidos de toda espécie.
Melhor evidência não há de que a indústria cresceu: as empresas estrangeiras aqui sediadas enviaram para suas matrizes, só no primeiro semestre, 19 bilhões de dólares de remessa de lucros. Amplia-se o número de carteiras assinadas, porém, mais ainda, a multidão de camelôs espalhados pelas capitais, além dessa estatística constituir-se em avenida de uma só mão. Alguém sabe quantos trabalhadores foram despedidos desde janeiro, em todo o País, nas diversas atividades?
Vinte e oito mil ricos a mais num universo de 190 milhões de habitantes é número impressionante. A classe média aumenta pela inclusão de quem antes era pobre ou miserável, mas, do outro lado vê-se achatada pelo congelamento de seus salários, exceção de algumas categorias privilegiadas.
Registra-se, no conjunto, quem ganha de 1.880 reais a 4.500 reais por mês, mas a conta é capenga, pesa muito mais no mínimo do que no máximo. Sem falar que os incluídos tornam-se obrigatoriamente contribuintes e participam, sem querer, do maior assalto promovido pelo governo nos bolsos do cidadão comum.
Por último os que conseguiram superar a pobreza absoluta. Devem estar envergonhados, escondendo-se daquela multidão de pedintes que só faz aumentar nos semáforos e nas esquinas, nas calçadas e na porta de todas as casas, em grande parte crianças fora da escola. Ainda bem que as novas estatísticas esqueceram de abordar o trabalho infantil, que não sabemos se diminuiu ou aumentou...
Vai dar bolo
Fermenta, lá nas profundezas do Congresso, crise de razoáveis proporções. Até o fim do ano, precisarão estar definidos os nomes dos novos presidentes da Câmara e do Senado. Os atuais deputado Arlindo Chinaglia, do PT, e senador Garibaldi Alves, do PMDB, estão regimentalmente impedidos de reeleger-se.
A primeira dúvida é saber se a dobradinha partidária continuará mesmo invertida. Porque se o PMDB tem no seu presidente Michel Temer o candidato natural para suceder Chinaglia, o PT poderia, em condições normais de temperatura e pressão, indicar Tião Viana para o lugar de Garibaldi.
É aqui que as coisas enrolam. Porque insurge-se a bancada do PMDB no Senado, entendendo não ter nada a ver com o suposto acordo envolvendo o PT. Os senadores peemedebistas reivindicam manter a presidência da casa, tendo em vista sua ampla maioria. Quanto, a saber, quem será o escolhido, parece cedo, mas não terá sido um bom começo assistir-se à especulação de que o palácio do Planalto apreciaria muito a escolha de seu líder, Romero Jucá, hoje denunciado pelo procurador geral da República.
Na Câmara, Michel Temer começa a ser contestado pelo inefável baixo clero, que acima e além das diferenças partidárias, clama sempre pela atenção dos caciques. O grupo é majoritário e conta com deputados de todos os partidos, daqueles raramente procurados pela imprensa e deixados mais à mingua, ainda, em todas as decisões. Estão ameaçando repetir o fenômeno Severino Cavalcanti, de anos atrás.
Nessa hora, o PT estrila e argumenta que se for para assistir à eleição de um sem-face, apenas como represália, melhor preparar um companheiro. Os petistas apóiam Temer, mas se sentirem balançar suas chances, não hesitarão em correr em faixa própria. Ambições não faltam.
A concluir está o fato de que, com todo o respeito, nem no Senado, nem na Câmara, registra-se a preocupação pela busca dos melhores, dos mais respeitados e mais capazes. Daqueles que, como primeira prioridade, visariam aumentar a influência da instituição parlamentar. Existem? Claro. Mesmo correndo o risco de desagradar a uns e esquecer de outros, mas, acima e além dos partidos, aí estão Pedro Simon, José Sarney, Marco Maciel, Artur Virgílio e outros, entre os senadores. Como, entre os deputados, Ibsen Pinheiro, Virgílio Guimarães, Osmar Serraglio, Alberto Silva, Mauro Benevides e quantos mais? O jogo, porém, é mais partidário do que político. E olhem que poderá tornar-se regional...
Vão viajar
Reunia-se a Comissão de Constituição e Justiça do Senado para debater questões que, na teoria, interessariam à nação, como a da aquisição de terras na Amazônia e o uso indiscriminado de algemas pelos órgãos de segurança.
Como o Congresso oscila entre o recesso remunerado e o esforço concentrado, esta semana ficou nebulosa. Tentaram deixar a questão para a próxima, que por decisão do presidente Garibaldi Alves, seria deliberativa. Logo surgiram diálogos que seriam cômicos se não fossem trágicos:
"Semana que vem não. Eu vou viajar"."Vossa Excelência anda viajando muito"."Nem tanto, este ano será a segunda vez"."Mas na outra semana não haverá deliberação"."Então fica para a outra"."Mas na outra quem vai viajar sou eu".
Por essas e outras vai ficando claro que, salvo milagre, antes das eleições de outubro nada se decidirá. Nem no plenário nem nas comissões.
Chineses e mineiros gostam de dinheiro
No palácio da Liberdade, em Belo Horizonte, um assessor do governador Aécio Neves entrou triste em seu gabinete, lamentando que a Justiça Eleitoral tivesse divulgado o patrimônio dos candidatos à prefeitura da capital. O mais rico era o candidato da coalizão informal PSDB-PT-PSB, Márcio Lacerda, com dezenas de milhões de reais. Opinou que a maioria do eleitorado rejeita candidatos milionários.
Aécio nem vacilou. Retrucou que o auxiliar preocupava-se desnecessariamente, porque os mineiros, tanto quanto os chineses, gostam de ganhar dinheiro e até apreciam votar em candidatos ricos, daqueles que não precisam preocupar-se com o próprio futuro e ficam menos tentados em garanti-lo administrativamente.
Tudo certo, mas esse é um raciocínio peculiar a Minas. Já em São Paulo...
Fonte: Tribuna da Imprensa
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