Por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Certas iniciativas políticas não são o que parecem. Ou podem não ser pelo menos. A mais recente dúvida que paira sobre Brasília é porque o governo decidiu divulgar sua proposta de reforma política neste ano eleitoral, com o Congresso de braços cruzados até outubro.
Primeiro porque o presidente Lula sempre disse, até agora, que reforma política era assunto do Congresso. Depois porque há décadas que o tema se arrasta, morrendo sempre na indecisão de deputados e senadores, dispostos a não votar leis capazes de prejudicá-los.
Mesmo assim, esta semana, líderes oficiais liberaram para a imprensa os aspectos básicos do projeto a ser enviado proximamente à Câmara. São eles:
Fidelidade partidária: apenas de quatro em quatro anos um parlamentar poderá trocar de partido sem perder o mandato. Cláusula de barreira: só poderá funcionar no Congresso o partido que dispuser de pelo menos dez deputados federais.
Inelegibilidades: será negado registro a candidatos condenados pela primeira instância da justiça criminal, mesmo sem sentenças definitivas, transitadas em julgado. Financiamento público: caberá ao poder público prover os partidos de recursos em condições de sustentar as candidaturas de seus integrantes, proibidas as doações particulares de qualquer espécie.
Fim das coligações partidárias nas eleições: cada partido disputará apoiado nas próprias forças, sem alianças com outros.
Até que as sugestões são positivas, serviriam para aprimorar o processo político-eleitoral, mas a dúvida permanece. Sabendo que a maioria parlamentar transformará esse tigre num gatinho, porque ninguém pretende votar contra seus próprios interesses, qual o objetivo do palácio do Planalto em insistir na reforma?
São livres as especulações, e uma delas ganharia os corredores do Congresso se eles não estivessem vazios por conta das campanhas das eleições de outubro. Tem azeitona nessa empada.
Ninguém poderá impedir que um deputado qualquer, do PT ou dos penduricalhos, apresente emenda ao conjunto, acabando com a reeleição. Trata-se de uma aspiração nacional, já que poucos engoliram o golpe branco dado pelo sociólogo nas instituições, praticamente prorrogando o próprio mandato ao arrancar do Congresso a possibilidade de disputar um segundo mandato no exercício do cargo.
Um novo sistema seria implantado, com a proibição da reeleição, compensada pelo aumento dos períodos administrativos de presidentes da República, governadores e prefeitos, de quatro para cinco ou seis anos. Nessa hora, o apagador seria passado no quadro negro. Começaria tudo de novo. Todo brasileiro no gozo de seus direitos políticos poderia candidatar-se. Inclusive ele. Entenderam?
Um gringo impertinente
Encontra-se esta semana em visita à reserva Raposa-Serra do Sul, em Roraima, mister James Anaya, que apesar do sobrenome latino é cidadão norte-americano, nas funções de Relator Especial das Nações Unidas para Assuntos Indígenas. Está sendo recebido com toda pompa e circunstância pela Funai, pela Igreja e pelas variadas ONGs instaladas na região onde, para entrar, os brasileiros sofrem restrições. Até mesmo chefes militares.
As conclusões do gringo já estavam prontas antes mesmo que ele chegasse ao Brasil: mostra-se favorável a uma reserva contínua para os índios naquela região de Roraima, inclusive na fronteira com a Venezuela e com a Guiana. Sustenta que as tribos indígenas ali localizadas formam uma nação, apesar das diferentes etnias, línguas e costumes. A área, do tamanho da Bélgica, deveria ser fechada a todos que não fossem índios nem pertencessem às ONGs, ou seja, posta á margem da soberania nacional.
Daí para as Nações Unidas considerarem um pedido de independência dessa "nação", a distância é curta. Apenas por coincidência, a nova "nação" é plena de riqueza, com minerais nobres a dar com o pé. Um cacique qualquer feito presidente da nova república poderia muito bem celebrar acordos de cooperação com governos de países ricos e com multinacionais mineradoras.
A presença de James Anaya na Raposa-Serra do Sol, depois de passar por Brasília, coincide com a discussão travada no Supremo Tribunal Federal a respeito de ser mantida a reserva contínua ou estabelecidas ilhas de permanência indígena, possibilitando a permanência de outros cidadãos brasileiros, entre habitantes de pequenas cidades e fazendeiros. Há quem imagine poder o tiro sair pela culatra, ou seja, os ministros da mais alta corte nacional de justiça irritarem-se com essa óbvia pressão internacional. Tomara.
Está difícil
Apesar de todo o potencial político e financeiro, não demarra a candidatura de Márcio Lacerda à prefeitura de Belo Horizonte. É o mais rico dos pretendentes a prefeito em todo o país, conta com o apoio ostensivo do governador de Minas e do atual prefeito da capital mineira, mas não sai dos 9% de preferência eleitoral, conforme as pesquisas mais recentes.
A esperança dos que o lançaram está no recém-iniciado período de propaganda eleitoral gratuita. O problema é faltar ao candidato pique para convencer o eleitoral. Pelo menos, por conta de sua primeira intervenção, dominada pela imagem do governador e do prefeito.
Em política, tudo muda, mas se não mudar conforma-se aquela regra não escrita de que voto não se transfere. Talvez por isso o presidente Lula tenha saltado de banda quando sondado a respeito de comparecer ao palanque de Márcio Lacerda.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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