PRMEIRA CÂMARA CÍVEL
AGRAVO DE INSTRUMENTO N° 38036-6/2008
AGRAVANTE: MUNICÍPIO DE JEREMOABO
ADVOGADO: OAB/BA 4425 ANTÔNIO FERNANDO DANTAS MONTALVÃO
AGRAVADO: JOÃO BATISTA MELO DE CARVALHO
ADVOGADO: OAB/BA 14620 - MICHEL SOARES REISRELATORA: Heloísa Pinto De Freitas Vieira Gradd
DECISÃO O MUNICÍPIO DE JEREMOABO, por seu advogado legalmente habilitado, ingressou com o presente agravo de instrumento contra decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da Comarca de Jeremoabo, nos autos da Ação de Desconstituição de Ato Legislativo n.° 67/2008, que deferiu, em parte, o pedido liminar, para suspender os efeitos do Decreto Legislativo n.° 001/2005 da Câmara Municipal de Vereadores de Jeremoabo que reprovou as contas prestadas pelo Autor relativas ao exercício de 2003.
Relata que o Agravado ingressou com Ação Declaratória de Nulidade de Ato Legislativo, registrada sob o n.° 67/2008, objetivando demonstrar suposta ilegalidade no julgamento das aludidas contas municipais pela Câmara de,Vereadores daquele município, alegando que não teriam sido observados os procedimentos legais exigidos para a rejeição.
O MM. Juízo a quo, em 03 de junho de 2008, proferiu decisão, deferindo em parte o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, para determinar a suspensão dos efeitos do Decreto Legislativo n.° 001/2005 da Câmara Municipal de Vereadores de Jeremoabo que reprovou as contas prestadas pelo Autor relativas ao exercício de 2003.
Irresignado com a decisão de primeiro grau ingressou com o presente recurso, objetivando, liminarmente, a concessão de efeito suspensivo à decisão e, no mérito, a extinção do processo de conhecimento sem julgamento do mérito, ou a cassação da antecipação de tutela deferida nos autos daquela Ação n.° 67/2008.
Alega, preliminarmente, a necessidade de extinção do processo de origem, sem julgamento do mérito, tendo em vista a ilegitimidade passiva da Câmara de Vereadores do Município, ausência de intimação do Ministério Público Estadual, bem como encontrar-se a decisão recorrida sem a necessária fundamentação; afirmando, no mérito, não ter a medida antecipatória observado as normas que disciplinam o julgamento das contas do Chefe do Executivo Municipal, em especial, o artigo 31, da Constituição Federal.
Sob tais fundamentos requer a sustação da decisão que suspendeu os efeitos do Decreto Legislativo n.° 001/2005, que rejeitou as contas do Município de Jeremoabo, vinculadas ao exercício de 2003, pugnando ao final, pela extinção do processo de origem sem julgamento do mérito, ou a sua cassação definitiva.
Foram atendidos pelo agravante os requisitos legais relativos à tempestividade, aos traslados e ao preparo do recurso, razão pela qual, recebo e dou seguimento ao agravo.
É o relatório. DECIDO.
Preliminarmente, é preciso discorrer acerca do interesse recursal do Município agravante, tendo em vista que não integrou a lide originária, vez que a mesma foi proposta pelo Agravado contra a Câmara Municipal de Jeremoabo.
O artigo 499, §1° do CPC estabelece que o recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público.
Desse modo, o Município de Jeremoabo, alegando a qualidade de terceiro prejudicado, interpôs o presente agravo de instrumento, sob o fundamento de possuir interesse jurídico em impugnar a decisão recorrida.
A Ação Declaratória de Nulidade de Ato Legislativo n.° 67/2008 tem por objeto a análise da legalidade da rejeição de contas pelo Legislativo Municipal, apresentadas pelo Agravado, quando da chefia do Poder Executivo, relativa ao exercício financeiro de 2003.
Assim, entendo presente o interesse do Município de Jeremoabo, em recorrer da decisão, por ser manifesto o seu empenho no deslinde do feito, em razão do teor da matéria discutida na ação originária, como bem ressaltou o Superior Tribunal de Justiça em situação análoga:
PROCESSUAL CIVIL -CÂMARA MUNICIPAL - PERSONALIDADE JUDICIÁRIA. A Câmara Municipal não tem personalidade jurídica e sim judiciária, e pode estar em Juízo defendendo os seus interesses. Tendo o Município interesse a defender na lide, deve ele figurar em seu pólo passivo. Recurso provido. (REsp 241.637/BA, Rei. Ministro GARCIA VIEIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17.02.2000)
Quanto à presença dos requisitos autorizadores da concessão do efeito suspensivo para o agravo entendo-os presentes, na hipótese que ora é submetida à apreciação desta Corte, sobretudo o fumus bonijuris. Eis os motivos: O mecanismo de prestação de contas de valores públicos foi expressamente determinado pelo texto constitucional, ao dispor nos artigos 70, 71 e 75, que a fiscalização contábil, financeira, orçamentária e patrimonial da União, dos Estados e Municípios e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Poder Legislativo, mediante controle externo, com o auxílio do Tribunal de Contas.
Ressalta, ainda, a Magna Carta que as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta será da competência privativa do respectivo Tribunal de Contas (art. 71,11/CF). Acerca do tema o egrégio STJ, tem esposado o entendimento de que a prestação de contas públicas é realizada a partir do controle externo empreendido pelo Poder Legislativo, com o auxílio do Tribunal de Contas, nos termos dos artigos 70 e 75 da CF. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONTROLE EXTERNO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ATOS PRATICADOS POR PREFEITO, NO EXERCÍCIO DE FUNÇÃO ADMINISTRATIVA E GESTORA DE RECURSOS PÚBLICOS. JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DE CONTAS. NÃO SUJEIÇÃO AO DECISUMDA CÂMARA MUNICIPAL. COMPETÊNCIAS DIVERSAS. EXEGESE DOS ARTS. 31E 71 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Os arts. 70 a 75 da Lex Lezwn deixam ver que o controle externo - contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial - da administração pública é tarefa atribuída ao Poder Legislativo e ao Tribunal de Contas. O primeiro, quando atua nesta seara, o faz com · o auxílio do segundo que, por sua vez, detém competências que lhe são próprias e exclusivas e que para serem exercitadas independem da interveniência do Leeislativo.
O conteúdo das contas globais prestadas pelo l Chefe do Executivo é diverso do conteúdo das contas dos administradores e gestores de recurso público. As primeiras demonstram o retrato da situação das finanças da unidade federativa (União, Estados, DF e Municípios). Revelam o cumprir do orçamento, dos planos de governo, dos .programas governamentais, demonstram os níveis de endividamento, o atender aos limites de gasto mínimo e máximo previstos no ordenamento para saúde, educação, gastos com pessoal.
Consubstanciam-se, enfim, nos Balanços Gerais prescritos pela Lei 4.320/64. Por isso, é que se submetem ao parecer prévio do Tribunal de Contas e ao julgamento pelo Parlamento (art. 71, I c/c. 49, IX da CF/88). As segundas - contas de administradores e gestores públicos, dizem respeito ao dever de prestar (contas) de todos aqueles aue lidam com recursos públicos, captam receitas, ordenam despesas (art. 70. parágrafo único da CF/88).
Submetem-se a julgamento direto pelos Tribunais de Contas, podendo gerar imputacão de débito e multa (art. 71.11 e i 3"da CF/88). Destarte, se o Prefeito Municipal assume a dupla junção, política e administrativa, respectivamente, a tarefa de executar orçamento e o encargo de captar receitas e ordenar despesas, submete-se a duplo julgamento. Um político perante o Parlamento precedido de parecer prévio: o outro técnico a cargo da Corte de Contas. Inexistente, in casu, prova de que o Prefeito não era o responsável direto pelos atos de administração e gestão de recursos públicos inquinados, deve prevalecer, por força ao art. 19, inc. II, da Constituição, a presunção de veracidade e legitimidade do ato administrativo da Corte de Contas dos Municípios de Goiás. Recurso ordinário desprovido.(RMS 11060 / GO, Ministra LAURITA VAZ, TZ - DJ 16.09.2002 p. 159) - Grifei. Neste caso, examina-se, em caráter liminar, eventual existência de violação à princípios constitucionais quando do julgamento político realizado pelo Parlamento Municipal, após o parecer prévio do Tribunal de Contas do Município. Vejamos. Dispõe o artigo 31 da Constituição Federal que: Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei. § 1°. O controle externo da Câmara Municipal será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas, dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver. 2°. O parecer prévio, emitido pelo órgão competente sobre as contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da Câmara Municipal.
A teor desse dispositivo, para a apreciação das contas do Chefe do Executivo, faz-se necessário, preliminarmente, o parecer prévio do Tribunal de Contas, para que se verifique a conformidade dos atos administrativos às normas do ordenamento jurídico e aos controles internos. Nesse parecer prévio, o Tribunal de Contas emite opinião técnica, sugerindo ao Poder Legislativo a aprovação ou rejeição das contas, de forma fundamentada, nos termos do artigo 71, inciso I, da Constituição Federal. Prescreve, ainda o artigo 31, §2°, da Carta Maior que, para contrariar o parecer prévio do Tribunal de Contas é preciso o quorum de dois terços dos membros da Câmara de Vereadores. Na espécie, o Tribunal de Contas dos Municípios aprovou as contas apresentadas pelo Agravado, com ressalvas.
Porém, as mesmas foram rejeitadas pela Câmara de Vereadores, por sete votos a dois, como demonstra o documento de fls. 70/74 (Ata da Assembléia Ordinária de 24 de fevereiro de 2005). Assim, não vislumbro a fumaça do bom direito, apontada pelo Juízo a quo em sua decisão, pois a doutrina e a jurisprudência pátria direcionam-se no sentido de que a oportunidade para o gestor realizar a sua defesa, quando do julgamento das contas municipais, dar-se-á no âmbito do Tribunal de Contas, e não no julgamento político realizado pelo Poder Legislativo.
Destaca-se, pela leitura dos autos, que houve a observância do contraditório quando do julgamento pela Corte da Contas do exercício financeiro de 2003, pois em momento algum se insurgiu o Agravado, na petição de fls. 37/68 acerca do julgamento realizado por aquele Tribunal de Contas. Sobre o tema, leciona Hely Lopes Meirelles: O controle de contas do Município deve ser exercido nos seguintes aspectos: da natureza dos fatos controlados (contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial); da amplitude do controle (Administração municipal direta e indireta); da legalidade; legitimidade; economicidade; aplicação das subvenções; e de renúncia de receita. Combinando-se esses dispositivos constitucionais, temos as diretrizes para a tomada de contas do Executivo e do próprio Legislativo, pela Câmara.
As contas já chegarão à Edilidade com parecer do Tribunal ou do órgão equivalente, facilitando, assim, a apreciação e julgamento do plenário, que após a votação na forma regimental consubstanciará a deliberação concernente às do prefeito em decreto legislativo, e às do presidente da Mesa em resolução. Para esse julgamento a Câmara poderá ouvir previamente os seus órgãos internos, afim de esclarecer os vereadores sobre as contas apresentadas e respectivo parecer do Tribunal ou órgão equivalente, mas não se nos afigura possível qualquer diligência externa, pois àquela altura já está encerrada a fase instrutória do processo, realizada pelo próprio Tribunal de Contas. A admitir-se novas diligências ou inspeções, ficaria superada a apreciação prévia do órgão estadual, e, conseqüentemente, invalidado o parecer instituído pela Constituição, como ato final da instrução, e antes do qual o prestador das contas deve ter oportunidade de defesa sobre os pontos impugnados. O que se pode permitir é o oferecimento de impugnação da Câmara às contas do prefeito e deste às do presidente da Mesa, logo que subirem à apreciação do tribunal de Contas ou órgão equivalente. Com essa impugnação os interessados facilitarão o exame e as diligências instrutórias, na fase própria e pelo órgão competente. ( MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro, 6.ed. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 500-1) Nelson Nery Costa discorrendo sobre a mesma matéria, afirma:
O parecer prévio, emitido pelo órgão competente, sobre as contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da Câmara Municipal. Reafirma-se que a Câmara Municipal é o Poder que faz realmente o controle das contas do Executivo local, através de processo de julgamento político, de modo que no Tribunal de Contas ocorre apenas um processo administrativo de controle. (COSTA, Nelson Nery. Curso de Direito Municipal Brasileiro, Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 268.)
O Exmo. Min. Relator Gilmar Mendes, no julgamento do Recurso Especial Eleitoral no 22.384, na ação anulatória proposta por ex-Prefeito contra decisão da Câmara de Vereadores que rejeitara suas contas, assim decidiu, adotando o parecer do Ministério Público: Na realidade, o ato impugnado não poderia violar os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, em razão de competir à Câmara Municipal somente o julgamento das contas do recorrente (art. 31, § 2^ da CF), cabendo a instrução do respectivo processo ao TCE, onde foram deduzidas as provas.
Todavia, em momento algum se insurgiu o recorrente contra o procedimento levado a efeito pela Corte de Contas. [...]."(Fl. 276.) Não há se falar, portanto, em cerceamento de defesa, (julgado em 18/09/2004) Na mesma linha de intelecção segue a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. MUNICÍPIO DE MAXIMIUANO DE ALMEIDA.
NÃO APROVAÇÃO DAS CONTAS DO PREFEITO PELO TRIBUNAL DE CONTAS. REJEIÇÃO DAS CONTAS PELO LEGISLATIVO MUNICIPAL. ATENDIMENTO AOS DISPOSITIVOS LEGAIS. DOIS TERÇOS DOS VOTOS DA CÂMARA MUNICIPAL. LEGALIDADE. IMPROCEDÊNCIA PELA ORIGEM. AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO RESPEITADOS. SENTENÇA QUE SE MANTÉM. NÃO PROVIMENTO EM GRAU RECURSAL. PRECEDENTES DESTA CÂMARA.
Restou comprovada a ausência de lesão ao direito de defesa e ao contraditório do autor por ocasião da apreciação do parecer da Corte e Contas pela Câmara Municipal de Vereadores, tendo em vista oportunização de contraditar as citadas irregularidades por ocasião do primeiro procedimento. Rejeitado o pedido de extinção do processo, ante a ocorrência do disposto no artigo 879, III do Código de Processo Civil. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. Por maioria. (Apelação Cível N" 70011927340, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator Des. Wellington Pacheco Barros, julgada em 27/07/2005). Entendo, pois, que a decisão agravada equivocou-se ao reconhecer a existência de periculum in mora para conceder a antecipação dos efeitos da tutela, porque o Decreto Legislativo n.° 001/2005 data de 25 de fevereiro de 2005, ao passo que o Agravado somente ingressou com a ação judicial questionando a sua legalidade em abril de 2008, ou seja, três anos depois.
O periculum in mora para a concessão do efeito suspensivo pretendido resta evidenciado, na medida em que a manutenção dos efeitos da decisão atacada significará a suspensão da inelegibilidade do Agravado, e, assim, possibilitará o registro de sua candidatura, que, ao final, poderá ser cancelada, acaso seja julgada improcedente a ação de conhecimento, gerando um verdadeiro tumulto no processo eleitoral municipal. Ante o exposto, CONCEDO O EFEITO SUSPENSIVO a este agravo de instrumento, determinado a suspensão dos efeitos da decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da Comarca de Jeremoabo, nos autos da Ação de Desconstituição de Ato Legislativo n.° 67/2008, restabelecendo, assim, o Decreto Legislativo n.° 001/2005.
Intime-se o Agravado para apresentar resposta ao presente recurso, no prazo legal. Oficie-se ao MM. Juízo a quo para que cumpra a presente decisão e forneça informações, nos termos do artigo 527, inciso rv, do Código de Processo Civil.
Salvador, 17 de julho de 2008.
HELOÍSA PINTO DE FREITAS VIEIRA GRADDI
RELATORA:
Relata que o Agravado ingressou com Ação Declaratória de Nulidade de Ato Legislativo, registrada sob o n.° 67/2008, objetivando demonstrar suposta ilegalidade no julgamento das aludidas contas municipais pela Câmara de,Vereadores daquele município, alegando que não teriam sido observados os procedimentos legais exigidos para a rejeição.
O MM. Juízo a quo, em 03 de junho de 2008, proferiu decisão, deferindo em parte o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, para determinar a suspensão dos efeitos do Decreto Legislativo n.° 001/2005 da Câmara Municipal de Vereadores de Jeremoabo que reprovou as contas prestadas pelo Autor relativas ao exercício de 2003.
Irresignado com a decisão de primeiro grau ingressou com o presente recurso, objetivando, liminarmente, a concessão de efeito suspensivo à decisão e, no mérito, a extinção do processo de conhecimento sem julgamento do mérito, ou a cassação da antecipação de tutela deferida nos autos daquela Ação n.° 67/2008.
Alega, preliminarmente, a necessidade de extinção do processo de origem, sem julgamento do mérito, tendo em vista a ilegitimidade passiva da Câmara de Vereadores do Município, ausência de intimação do Ministério Público Estadual, bem como encontrar-se a decisão recorrida sem a necessária fundamentação; afirmando, no mérito, não ter a medida antecipatória observado as normas que disciplinam o julgamento das contas do Chefe do Executivo Municipal, em especial, o artigo 31, da Constituição Federal.
Sob tais fundamentos requer a sustação da decisão que suspendeu os efeitos do Decreto Legislativo n.° 001/2005, que rejeitou as contas do Município de Jeremoabo, vinculadas ao exercício de 2003, pugnando ao final, pela extinção do processo de origem sem julgamento do mérito, ou a sua cassação definitiva.
Foram atendidos pelo agravante os requisitos legais relativos à tempestividade, aos traslados e ao preparo do recurso, razão pela qual, recebo e dou seguimento ao agravo.
É o relatório. DECIDO.
Preliminarmente, é preciso discorrer acerca do interesse recursal do Município agravante, tendo em vista que não integrou a lide originária, vez que a mesma foi proposta pelo Agravado contra a Câmara Municipal de Jeremoabo.
O artigo 499, §1° do CPC estabelece que o recurso pode ser interposto pela parte vencida, pelo terceiro prejudicado e pelo Ministério Público.
Desse modo, o Município de Jeremoabo, alegando a qualidade de terceiro prejudicado, interpôs o presente agravo de instrumento, sob o fundamento de possuir interesse jurídico em impugnar a decisão recorrida.
A Ação Declaratória de Nulidade de Ato Legislativo n.° 67/2008 tem por objeto a análise da legalidade da rejeição de contas pelo Legislativo Municipal, apresentadas pelo Agravado, quando da chefia do Poder Executivo, relativa ao exercício financeiro de 2003.
Assim, entendo presente o interesse do Município de Jeremoabo, em recorrer da decisão, por ser manifesto o seu empenho no deslinde do feito, em razão do teor da matéria discutida na ação originária, como bem ressaltou o Superior Tribunal de Justiça em situação análoga:
PROCESSUAL CIVIL -CÂMARA MUNICIPAL - PERSONALIDADE JUDICIÁRIA. A Câmara Municipal não tem personalidade jurídica e sim judiciária, e pode estar em Juízo defendendo os seus interesses. Tendo o Município interesse a defender na lide, deve ele figurar em seu pólo passivo. Recurso provido. (REsp 241.637/BA, Rei. Ministro GARCIA VIEIRA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 17.02.2000)
Quanto à presença dos requisitos autorizadores da concessão do efeito suspensivo para o agravo entendo-os presentes, na hipótese que ora é submetida à apreciação desta Corte, sobretudo o fumus bonijuris. Eis os motivos: O mecanismo de prestação de contas de valores públicos foi expressamente determinado pelo texto constitucional, ao dispor nos artigos 70, 71 e 75, que a fiscalização contábil, financeira, orçamentária e patrimonial da União, dos Estados e Municípios e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Poder Legislativo, mediante controle externo, com o auxílio do Tribunal de Contas.
Ressalta, ainda, a Magna Carta que as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta será da competência privativa do respectivo Tribunal de Contas (art. 71,11/CF). Acerca do tema o egrégio STJ, tem esposado o entendimento de que a prestação de contas públicas é realizada a partir do controle externo empreendido pelo Poder Legislativo, com o auxílio do Tribunal de Contas, nos termos dos artigos 70 e 75 da CF. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONTROLE EXTERNO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ATOS PRATICADOS POR PREFEITO, NO EXERCÍCIO DE FUNÇÃO ADMINISTRATIVA E GESTORA DE RECURSOS PÚBLICOS. JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DE CONTAS. NÃO SUJEIÇÃO AO DECISUMDA CÂMARA MUNICIPAL. COMPETÊNCIAS DIVERSAS. EXEGESE DOS ARTS. 31E 71 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Os arts. 70 a 75 da Lex Lezwn deixam ver que o controle externo - contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial - da administração pública é tarefa atribuída ao Poder Legislativo e ao Tribunal de Contas. O primeiro, quando atua nesta seara, o faz com · o auxílio do segundo que, por sua vez, detém competências que lhe são próprias e exclusivas e que para serem exercitadas independem da interveniência do Leeislativo.
O conteúdo das contas globais prestadas pelo l Chefe do Executivo é diverso do conteúdo das contas dos administradores e gestores de recurso público. As primeiras demonstram o retrato da situação das finanças da unidade federativa (União, Estados, DF e Municípios). Revelam o cumprir do orçamento, dos planos de governo, dos .programas governamentais, demonstram os níveis de endividamento, o atender aos limites de gasto mínimo e máximo previstos no ordenamento para saúde, educação, gastos com pessoal.
Consubstanciam-se, enfim, nos Balanços Gerais prescritos pela Lei 4.320/64. Por isso, é que se submetem ao parecer prévio do Tribunal de Contas e ao julgamento pelo Parlamento (art. 71, I c/c. 49, IX da CF/88). As segundas - contas de administradores e gestores públicos, dizem respeito ao dever de prestar (contas) de todos aqueles aue lidam com recursos públicos, captam receitas, ordenam despesas (art. 70. parágrafo único da CF/88).
Submetem-se a julgamento direto pelos Tribunais de Contas, podendo gerar imputacão de débito e multa (art. 71.11 e i 3"da CF/88). Destarte, se o Prefeito Municipal assume a dupla junção, política e administrativa, respectivamente, a tarefa de executar orçamento e o encargo de captar receitas e ordenar despesas, submete-se a duplo julgamento. Um político perante o Parlamento precedido de parecer prévio: o outro técnico a cargo da Corte de Contas. Inexistente, in casu, prova de que o Prefeito não era o responsável direto pelos atos de administração e gestão de recursos públicos inquinados, deve prevalecer, por força ao art. 19, inc. II, da Constituição, a presunção de veracidade e legitimidade do ato administrativo da Corte de Contas dos Municípios de Goiás. Recurso ordinário desprovido.(RMS 11060 / GO, Ministra LAURITA VAZ, TZ - DJ 16.09.2002 p. 159) - Grifei. Neste caso, examina-se, em caráter liminar, eventual existência de violação à princípios constitucionais quando do julgamento político realizado pelo Parlamento Municipal, após o parecer prévio do Tribunal de Contas do Município. Vejamos. Dispõe o artigo 31 da Constituição Federal que: Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei. § 1°. O controle externo da Câmara Municipal será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas, dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver. 2°. O parecer prévio, emitido pelo órgão competente sobre as contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da Câmara Municipal.
A teor desse dispositivo, para a apreciação das contas do Chefe do Executivo, faz-se necessário, preliminarmente, o parecer prévio do Tribunal de Contas, para que se verifique a conformidade dos atos administrativos às normas do ordenamento jurídico e aos controles internos. Nesse parecer prévio, o Tribunal de Contas emite opinião técnica, sugerindo ao Poder Legislativo a aprovação ou rejeição das contas, de forma fundamentada, nos termos do artigo 71, inciso I, da Constituição Federal. Prescreve, ainda o artigo 31, §2°, da Carta Maior que, para contrariar o parecer prévio do Tribunal de Contas é preciso o quorum de dois terços dos membros da Câmara de Vereadores. Na espécie, o Tribunal de Contas dos Municípios aprovou as contas apresentadas pelo Agravado, com ressalvas.
Porém, as mesmas foram rejeitadas pela Câmara de Vereadores, por sete votos a dois, como demonstra o documento de fls. 70/74 (Ata da Assembléia Ordinária de 24 de fevereiro de 2005). Assim, não vislumbro a fumaça do bom direito, apontada pelo Juízo a quo em sua decisão, pois a doutrina e a jurisprudência pátria direcionam-se no sentido de que a oportunidade para o gestor realizar a sua defesa, quando do julgamento das contas municipais, dar-se-á no âmbito do Tribunal de Contas, e não no julgamento político realizado pelo Poder Legislativo.
Destaca-se, pela leitura dos autos, que houve a observância do contraditório quando do julgamento pela Corte da Contas do exercício financeiro de 2003, pois em momento algum se insurgiu o Agravado, na petição de fls. 37/68 acerca do julgamento realizado por aquele Tribunal de Contas. Sobre o tema, leciona Hely Lopes Meirelles: O controle de contas do Município deve ser exercido nos seguintes aspectos: da natureza dos fatos controlados (contábil, financeiro, orçamentário, operacional e patrimonial); da amplitude do controle (Administração municipal direta e indireta); da legalidade; legitimidade; economicidade; aplicação das subvenções; e de renúncia de receita. Combinando-se esses dispositivos constitucionais, temos as diretrizes para a tomada de contas do Executivo e do próprio Legislativo, pela Câmara.
As contas já chegarão à Edilidade com parecer do Tribunal ou do órgão equivalente, facilitando, assim, a apreciação e julgamento do plenário, que após a votação na forma regimental consubstanciará a deliberação concernente às do prefeito em decreto legislativo, e às do presidente da Mesa em resolução. Para esse julgamento a Câmara poderá ouvir previamente os seus órgãos internos, afim de esclarecer os vereadores sobre as contas apresentadas e respectivo parecer do Tribunal ou órgão equivalente, mas não se nos afigura possível qualquer diligência externa, pois àquela altura já está encerrada a fase instrutória do processo, realizada pelo próprio Tribunal de Contas. A admitir-se novas diligências ou inspeções, ficaria superada a apreciação prévia do órgão estadual, e, conseqüentemente, invalidado o parecer instituído pela Constituição, como ato final da instrução, e antes do qual o prestador das contas deve ter oportunidade de defesa sobre os pontos impugnados. O que se pode permitir é o oferecimento de impugnação da Câmara às contas do prefeito e deste às do presidente da Mesa, logo que subirem à apreciação do tribunal de Contas ou órgão equivalente. Com essa impugnação os interessados facilitarão o exame e as diligências instrutórias, na fase própria e pelo órgão competente. ( MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro, 6.ed. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 500-1) Nelson Nery Costa discorrendo sobre a mesma matéria, afirma:
O parecer prévio, emitido pelo órgão competente, sobre as contas que o Prefeito deve anualmente prestar, só deixará de prevalecer por decisão de dois terços dos membros da Câmara Municipal. Reafirma-se que a Câmara Municipal é o Poder que faz realmente o controle das contas do Executivo local, através de processo de julgamento político, de modo que no Tribunal de Contas ocorre apenas um processo administrativo de controle. (COSTA, Nelson Nery. Curso de Direito Municipal Brasileiro, Rio de Janeiro: Forense, 1999, p. 268.)
O Exmo. Min. Relator Gilmar Mendes, no julgamento do Recurso Especial Eleitoral no 22.384, na ação anulatória proposta por ex-Prefeito contra decisão da Câmara de Vereadores que rejeitara suas contas, assim decidiu, adotando o parecer do Ministério Público: Na realidade, o ato impugnado não poderia violar os princípios do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, em razão de competir à Câmara Municipal somente o julgamento das contas do recorrente (art. 31, § 2^ da CF), cabendo a instrução do respectivo processo ao TCE, onde foram deduzidas as provas.
Todavia, em momento algum se insurgiu o recorrente contra o procedimento levado a efeito pela Corte de Contas. [...]."(Fl. 276.) Não há se falar, portanto, em cerceamento de defesa, (julgado em 18/09/2004) Na mesma linha de intelecção segue a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:
APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. MUNICÍPIO DE MAXIMIUANO DE ALMEIDA.
NÃO APROVAÇÃO DAS CONTAS DO PREFEITO PELO TRIBUNAL DE CONTAS. REJEIÇÃO DAS CONTAS PELO LEGISLATIVO MUNICIPAL. ATENDIMENTO AOS DISPOSITIVOS LEGAIS. DOIS TERÇOS DOS VOTOS DA CÂMARA MUNICIPAL. LEGALIDADE. IMPROCEDÊNCIA PELA ORIGEM. AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO RESPEITADOS. SENTENÇA QUE SE MANTÉM. NÃO PROVIMENTO EM GRAU RECURSAL. PRECEDENTES DESTA CÂMARA.
Restou comprovada a ausência de lesão ao direito de defesa e ao contraditório do autor por ocasião da apreciação do parecer da Corte e Contas pela Câmara Municipal de Vereadores, tendo em vista oportunização de contraditar as citadas irregularidades por ocasião do primeiro procedimento. Rejeitado o pedido de extinção do processo, ante a ocorrência do disposto no artigo 879, III do Código de Processo Civil. APELAÇÃO NÃO PROVIDA. Por maioria. (Apelação Cível N" 70011927340, Quarta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator Des. Wellington Pacheco Barros, julgada em 27/07/2005). Entendo, pois, que a decisão agravada equivocou-se ao reconhecer a existência de periculum in mora para conceder a antecipação dos efeitos da tutela, porque o Decreto Legislativo n.° 001/2005 data de 25 de fevereiro de 2005, ao passo que o Agravado somente ingressou com a ação judicial questionando a sua legalidade em abril de 2008, ou seja, três anos depois.
O periculum in mora para a concessão do efeito suspensivo pretendido resta evidenciado, na medida em que a manutenção dos efeitos da decisão atacada significará a suspensão da inelegibilidade do Agravado, e, assim, possibilitará o registro de sua candidatura, que, ao final, poderá ser cancelada, acaso seja julgada improcedente a ação de conhecimento, gerando um verdadeiro tumulto no processo eleitoral municipal. Ante o exposto, CONCEDO O EFEITO SUSPENSIVO a este agravo de instrumento, determinado a suspensão dos efeitos da decisão proferida pelo MM. Juiz de Direito da Comarca de Jeremoabo, nos autos da Ação de Desconstituição de Ato Legislativo n.° 67/2008, restabelecendo, assim, o Decreto Legislativo n.° 001/2005.
Intime-se o Agravado para apresentar resposta ao presente recurso, no prazo legal. Oficie-se ao MM. Juízo a quo para que cumpra a presente decisão e forneça informações, nos termos do artigo 527, inciso rv, do Código de Processo Civil.
Salvador, 17 de julho de 2008.
HELOÍSA PINTO DE FREITAS VIEIRA GRADDI
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