Professor da UnB acredita que o presidente Lula será o grande cabo eleitoral do seu partido nas próximas eleições. O Bolsa Família e o PAC também influenciarão 2010
Raphael Bruno
brasília
Professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB) há 36 anos, David Fleischer é um especialista nas áreas de eleições e partidos.Em entrevista ao JB, o professor fala sobre as perspectivas para o quadro eleitoral de outubro e assegura: impulsionado pelo programa Bolsa-Família e pela popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o PT deve obter crescimento significativo nas próximas eleições municipais, principalmente nas prefeituras menores do interior.
Qual será a capacidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva transferir nestas próximas eleições municipais sua elevada popularidade, confirmada em todas as pesquisas, para os candidatos da base?
– Se compararmos com 2004, a influência de Lula nestas eleições deve ser maior. Ele tem um prestígio muito alto, tanto ele como o governo têm aprovação nas pesquisas de opinião em torno de 70%. E Lula está viajando bastante inaugurando obras do PAC, inclusive gerando muitas críticas da oposição, e concentrando essas viagens nas cidades maiores. Até as eleições, ele deve visitar mais de cem cidades. Outro fator importante é o Bolsa Família. Em 2004, o programa ainda estava começando, e o que nós já observamos naquele ano foi que o PT finalmente conseguiu penetrar nos grotões e aumentou bastante sua cota nos municípios menores. Muita gente fala sobre como o Bolsa Família ajudou Lula nas eleições de 2006, quando o programa atingia dez milhões de famílias, mas agora já está chegando a 12 milhões. Então, provavelmente, o PT vai ter esse ano um resultado ainda melhor, penetrando mais nas cidades menores.
Os partidos da base vão para as eleições, na maioria das cidades, separados, à revelia da orientação do presidente Lula. Por que isso ocorre?
– A nível local, há condições que envolvem as peculiaridades de cada município, convivência entre os partidos, afinidades entre os líderes políticos. Nem sempre essas afinidades são maiores entre PT e PMDB, ou entre PT e os partidos do bloco de esquerda. Então Lula vai ter dois ou três palanques na maior parte das cidades maiores. O mesmo ocorre na relação entre PSDB e DEM. Tudo indica, por exemplo, que em mais ou menos 200 cidades as maiores afinidades são entre PT e PSDB. São cidades em que esses dois adversários vão se unir para eleger prefeito. Dependendendo muito das condições locais essas alianças são chamadas de esdrúxulas. Foi esse tipo de coligação que o Tribunal Superior Eleitoral tentou coibir em 2002 e 2006. Agora que acabou a verticalização, devemos ver algumas dessas coligações com mais freqüência.
Essa fragmentação pode prejudicar a governabilidade de Lula depois das eleições?
– Conforme o Estado e o município, pode sim haver ressentimentos entre os partidos da base. Mas é um problema que fica localizado. Provavelmente, quando o Congresso se reunir de novo, Lula não vai ter tanta dificuldade assim em manter a base unida. Ele vai ter essa substituição pelos suplentes dos que forem eleitos prefeitos, mas nada que atrapalhe a solidez do apoio a ele.
Os partidos da oposição também devem caminhar separados nas próximas eleições. De que forma isso pode afetar a parceria entre PSDB e DEM?
– O DEM tem dito fortemente que vai lançar candidato próprio em 2010. Não sei quem é o candidato mais viável do DEM. Talvez seja o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, o único governador do partido. Nos últimos meses, os dois partidos andaram se estranhando bastante tanto no Senado quanto na Câmara, principalmente nesse último episódio do ataque do senador José Agripino (DEM-RN) à ministra Dilma Roussef. O PSDB não gostou, achou que foi um erro político muito grave. Eles devem continuar juntos na oposição em 2009. Mas a intenção do DEM realmente é a candidatura própria em 2010, principalmente para marcar posição, porque em 2006 o partido perdeu muito espaço político. Vários líderes políticos se aposentaram, outros morreram. Então ele corre o risco de perder ainda mais espaço. Hoje tem gente que acha que a tendência do DEM é se tornar um partido médio.
Em que medida um bom desempenho agora nas eleições municipais pode alavancar as candidaturas em 2010?
– O impacto é forte. Já vimos isso em outros casos. Os partidos que se saem bem nas eleições municipais tem mais chances nas eleições federais e estaduais. O partido que consegue eleger mais prefeitos e vereadores já faz um base de cabos eleitorais mais forte para eleger deputados federais. O partido que consegue eleger o prefeito de capital se habilita bastante para a eleição do governador. Muitas vezes, o próprio prefeito se torna um candidato em potencial para se tornar governador. Por isso que estamos vendo 130 deputados federais candidatos a prefeito. Desses, uns 30 ou 40 devem se eleger. E o resto também estará, durante o recesso, tentando eleger seus aliados. Quanto mais aliados eleger agora, mais gente para ajudar na própria eleição dentro de dois anos. Então, como um ensaio geral, é muito importante.
O senhor apóia a idéia de que as eleições municipais e as federais sejam realizadas no mesmo ano?
– Eu creio que é bom ter as eleições desvinculadas, porque você concentra a campanha municipal nos problemas locais, não contamina o debate com temas nacionais. E vice-versa. Misturar não é bom, embora certamente seja mais econômico.
O senhor enxerga algum partido ou grupo político com mais chances de crescer ou de perder espaço de forma mais vigorosa em outubro?
– Além do provável crescimento do PT e do enfraquecimento do DEM, o que devemos observar com atenção é o desempenho do PSDB. Se a base municipal do PSDB se reduzir, vai dificultar e muito a eleição de José Serra. Partidos como PSB e PDT devem crescer. O PPS tem perdido espaço nas últimas eleições e é provável que continue assim, principalmente por conta da oposição a Lula. Outra grande dúvida é o PSOL. É um partido novo, pode ser que consiga sensibilizar o eleitor com suas propostas. E, como é pequeno, o PSOL só tem a crescer.
E a reforma política?
– A reforma proposta tinha três pontos muito importantes. Primeiro, a lista fechada, com o voto em legenda em uma lista pré-ordenada. Isso simplificaria a eleição proporcional e teríamos um conflito entre partidos e não mais candidatos individuais. Isso fortaleceria, do meu modo de ver, os partidos. Outra era a questão do fim das coligações nas eleições proporcionais junto com a questão do desempenho. A reforma não previa uma cláusula de desempenho, como a que foi derrubada pelo Supremo Tribunal Federal, mas previa a formação de federações partidárias para concorrer nas eleições de forma mais competitiva. Só que essa federação teria que permanecer junta durante três anos. Nem partidos nem parlamentares poderiam sair, então já eliminaria toda a questão da infidelidade partidária. A terceira era o financiamento público exclusivo, que era interessante para diminuir o caixa-dois e o abuso do poder econômico, mas era muito difícil de regulamentar, porque nossa Justiça Eleitoral não tem condições financeiras e humanas de fiscalizar. Seria um pouco irreal tentar coibir essas contribuições particulares. Mas, de forma geral, há esses prejuízos. Creio que as discussões em torno da reforma podem ser retomadas em 2009. Junto com outras propostas, como a questão do fim da reeleição, do mandato presidencial de cinco anos e o ressurgimento também da proposta de um terceiro mandato para Lula. Não sei se será aprovada, mas deve surgir sim.
Fonte: JB Online
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