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quarta-feira, agosto 21, 2024

Vivemos uma crise civilizatória? Bem, só iremos responder daqui a 500 anos

Publicado em 20 de agosto de 2024 por Tribuna da Internet

Charges: Civilização!?

Charge do Genildo (Arquivo Google)

Luiz Felipe Pondé
Folha

Vivemos uma crise civilizatória? Acho que não. A questão é mais complexa do que pensa nossa vã propaganda política. A expressão “crise civilizatória” me parece mais clara como marketing de ideias do que como conceito, daí ser tão útil na polarização em ambas as margens do rio. Um reparo epistemológico — não acho que exista nenhuma definição simples de “civilização”. A definição, nesse caso, ocuparia um livro de no mínimo 200 páginas — livro “Grammaire de Civilisations”, do historiador Braudel, seria um bom começo para o leitor atento.

Aliás, como dizia Pascal no século 17, existem palavras do uso corrente que é melhor nem tentar definir, porque atrapalha a comunicação. “Civilização” cai como uma luva nesse reparo epistemológico pascaliano.

É UMA UTOPIA – Suspeito que a expressão seja um caso pouco analisado de utopia pura e simples. Aliás, creio que a imensa maioria das pessoas que usa a palavra “civilização” o faz dentro desse caso de utopia, quando não com intenção de autopropaganda política pura e simples.

“Civilização é uma sociedade que vive por valores.” Essa frase chega a ser hilária de tão absurdamente imprecisa. A palavra “valores” em si não merece tanto crédito assim, para além do uso quando falamos no valor do dólar em relação ao real.

Não que não possam existir comportamentos positivamente valorizados num grupo social, mas, sim, que essa valorização “não segura muita água”, como se fala em filosofia em inglês, querendo dizer que não fica muito tempo de pé.

E OS VALORES? – A realidade “para além dos valores” costuma sempre vencer no dia a dia, entre pessoas e entre nações. Os advogados são a prova cabal da nulidade dos valores. O Google diz algo assim —civilização é um estado avançado do desenvolvimento humano em termos estéticos, econômicos, sociais, políticos e ainda culturais.

Tomemos uma variável —escravidão, difícil de ser considerada “avançada”. Roma tinha escravos, Grécia tinha escravos, a Europa iluminista ganhava dinheiro com escravos, inclusive alguns filósofos considerados “progressistas”.

Não vou dizer os nomes neste texto porque, antes de tudo, não levo a sério a expressão “progressista” e, depois, porque não quero investir na palhaçada do cancelamento. Enfim, toda “civilização” até hoje tinha muitos escravos. Onde ia se encontrar força motora antes da revolução industrial que não fosse

NAS COLÔNIAS – A Europa começou a usar essa expressão para se diferenciar de suas colônias, estas não civilizadas. Uma crítica ao pensamento colonial derruba essa ideia em segundos. Indígenas não seriam civilizados, africanos ou negros, tampouco.

Indígenas e africanos negros tampouco se salvariam pelo critério utópico de uma civilização —critério este que alimenta quem fala dessa tal crise— na medida em que alguns eram canibais e outros também praticavam escravidão em seu mercado.

A esquerda no Brasil em 2022 cravou entre a propaganda política do PT para presidente que os bolsonaristas representavam uma crise civilizatória. Falou-se tanto nisso que a expressão “crise civilizatória” ficou próxima do uso banalizado da expressão “energia” para além da física. Por outro lado, a ideia cara à direita de que há uma crise na “civilização ocidental” joga no colo da esquerda a culpa por isso, principalmente no campo do comportamento sexual, dissolução das famílias e da educação das crianças.

CRISE CIVILIZATÓRIA – Por incrível que pareça, ambos os lados fazem uso da mesma expressão vazia para se referir ao presente. Apesar de a esquerda não gostar muito dessa coisa de “civilização ocidental”, pensa no ideário iluminista e humanista europeu para dizer que bolsonaristas geram crise civilizatória. O mesmo ideário que a direita considera seu “tesouro ocidental”.

Mesmo que usemos a expressão “crise civilizatória” num sentido frouxo semanticamente, tomando por exemplo a democracia como núcleo positivo da civilização em crise —o que está longe de ser evidente, por exemplo, para chineses—, só daqui a uns 500 anos alguém poderá dizer algo sobre o período em que vivemos.

Por enquanto, melhor silenciar e cuidar do nosso jardim.

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