Publicado em 28 de agosto de 2023 por Tribuna da Internet
Roberto Nascimento
Se os presentes eram de natureza personalíssima e de fato pertenciam ao presidente da República, conforme o argumento do advogado Paulo Cunha Bueno, defensor de Jair Bolsonaro, o mistério assim aumenta. Afinal, qual a razão de o ajudante de ordens Mauro Cid vender as joias nos EUA, receber em espécie e entregar o dinheiro ao chefe do governo, mas depois recomprá-las para entregar ao Tribunal de Contas da União?
E por que tamanha confusão feita pelo enigmático advogado Frederico Wassef, que confessou tudo depois de ter afirmado que não sabia nada das joias? E por que teve a desfaçatez de declarar que pagou a recompra do próprio bolso, em valor superior a R$ 300 mil, quando se sabe que está em péssima situação financeira, eivado de dívidas?
MENOR IMPORTÂNCIA – Embora o assunto seja sensacional, como tudo o que se refere a valiosas joias, na verdade esse episódio é de menor potencial destrutivo para Bolsonaro e Mauro Cid, se comparado com a trama golpista, que vinha sendo preparada desde 2021, quando a turma do golpe percebeu, através de pesquisas qualitativas, que Bolsonaro poderia perder a reeleição.
E por que perderia? Certamente, por causa dele mesmo, que assustou grande parte dos brasileiros com sua atuação na Pandemia, quando tentou desacreditar as vacinas, apostando todas as suas fichas num remédio ineficaz, a cloroquina, cuja eficiência jamais foi comprovada cientificamente.
E depois Bolsonaro ainda tentou emplacar uma bobagem, chamada de “imunidade de rebanho”, em que os mais jovens e saudáveis tinham possibilidade maior de sobreviver. Um desastre.
ÍMPETOS GOLPISTAS – O mais grave, juridicamente falando, é que depois Bolsonaro começou o ataque sistemático contra as urnas eletrônicas e tentou desacreditar os ministros da Suprema Corte, inclusive falava em aumentar a composição do colegiado, de 11 para 16 ministros, para controlar o Judiciário, na mesma receita autoritária de Nicolas Maduro, ditador da Venezuela.
Tentou-se até explodir um caminhão-tanque no Aeroporto de Brasília na véspera de Natal, quando o movimento é mais intenso. A torcida era para tudo dar certo, ou seja, que houvesse mortos e feridos e assim as Forças Armadas constitucionalmente entrariam em cena, repetindo o golpe de 1964.
A trama golpista teve apoio de oficiais militares das Forças Armas e do comando da PM de Brasília, claramente envolvidos nas ações para facilitar a invasão dos vândalos no quebra-quebra do dia 8 de janeiro.
COMANDO LEGALISTA – É importante relembrar esses fatos, para que não caiam no esquecimento. O golpe só não aconteceu porque os legalistas eram maioria no Alto-Comando do Exército. Agora, todos os militares envolvidos no planejamento e na execução da tentativa de golpe precisam responder a Inquérito Policial Militar, para investigar suas condutas delituosas.
A cúpula da PM do Distrito Federal, que possibilitou a invasão dos palácios e o vandalismo, já foi presa, em função do conjunto da obra. Mas falta investigar em profundidade o envolvimento dos militares que acobertaram o acampamento no Quartel-General de Brasília e que se omitiram na repressão aos golpistas.
O comandante do Exército, general Tomás Paiva, está certíssimo ao usar seu pronunciamento do Dia do Soldado para alertar a tropa sobre a necessidade de as Forças Armadas investigarem os militares da ativa que se empenharam abertamente pelo golpe. Então, que assim seja.