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quarta-feira, agosto 02, 2023

Amizade com Lula e críticas à Lava Jato podem ser entraves a Zanin no STF

Quarta-Feira, 02/08/2023 - 09h40

Por Folhapress

Amizade com Lula e críticas à Lava Jato podem ser entraves a Zanin no STF
Foto: Ricardo Stuckert / Divulgação

A amizade com o presidente Lula (PT) pode deixar o novo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal), Cristiano Zanin, de fora de eventuais processos que envolvam diretamente o chefe do Executivo, mas não de temas de interesse do governo. O ex-advogado de Lula toma posse nesta quinta-feira (3).
 

Para especialistas, o próprio Zanin deve se declarar suspeito se Lula voltar a ser alvo de ações penais. Já em relação à operação Lava Jato, a crítica enquanto advogado não o impede, em tese, de julgar ações em que não tenha atuado ou seja beneficiado, mas a suspeição pode ser questionada. Essas análises deverão ocorrer caso a caso.
 

As regras de suspeição previstas para magistrados pelo Código de Processo Civil e Código de Processo Penal são mais subjetivas do que as de impedimento, previstas pelas mesmas normas para vetar o julgamento de ações de cônjuges e parentes, por exemplo.
 

No caso da suspeição, o ministro não pode julgar processos de amigos íntimos ou inimigos, assim como ações em que tenha interesse. Em março, ao ser questionado sobre a intenção de indicar Zanin, Lula chamou o advogado de "amigo e companheiro". Em julho, com Zanin já aprovado pelo Senado, Lula negou a proximidade e disse que "nunca indicou um amigo para o Supremo".
 

"Não era amigo, era meu advogado. E pessoa extremamente capaz, foi escolhido porque é um homem do presente e do futuro. É muito estudioso, dedicado e sério", afirmou, acrescentando que "nunca vai precisar" de um favor de Zanin.
 

A escolha de nomes próximos ao chefe do Executivo é comum, mas por vinculações ligadas ao governo, e não diretamente ao presidente, caso de Zanin.
 

André Mendonça, indicado por Jair Bolsonaro, Alexandre de Moraes, por Michel Temer, e Dias Toffoli, por Lula, e Gilmar Mendes, por Fernando Henrique Cardoso, são ministros da atual composição da corte que integraram os governos dos presidentes que os indicaram.
 

Toffoli e Gilmar Mendes foram da AGU (Advocacia-Geral da União); Moraes, ministro da Justiça, e Mendonça exerceu esses dois cargos no governo Bolsonaro.
 

Zanin atuou na defesa de Lula em processos da operação Lava Jato, inclusive aquele que levou o petista à prisão.
 

Em junho, ao ser sabatinado no Senado, Zanin foi questionado pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE) se pretende se declarar suspeito em eventuais futuros processos contra Lula. Ele respondeu, mais uma vez, que analisará cada caso.
 

Zanin não negou a proximidade a Lula, mas disse que a convivência não criou uma relação de subordinação.
 

Eloísa Machado Almeida, professora da FGV Direito SP e coordenadora do grupo de estudos Supremo em Pauta, afirma que por ter sido advogado pessoal de Lula em ações penais, Zanin deve se declarar impedido de atuar em tais casos.
 

"É uma vedação clara, objetiva, imposta pela lei. Sendo considerado amigo pessoal de Lula, entendo que não deverá atuar em casos nos quais haja interesse particular, pessoal, de Lula, como eventuais futuras ações penais, por exemplo", diz.
 

A professora destaca que no STF a análise tanto sobre impedimento quanto de suspeição acaba sendo feita pelo próprio ministro, o que considera ruim, por revelar que o controle da imparcialidade dos integrantes da corte é frágil.
 

Uma pesquisa feita pelo grupo Supremo em Pauta apontou que, dos 111 casos apresentados à corte sobre impedimento e suspeição até o final de 2018, praticamente todos foram arquivados.
 

A pesquisadora Luiza Ferraro, uma das autoras do estudo, afirma que o entendimento do STF tem sido de que a atuação pretérita como advogado não indica necessariamente uma relação de amizade e suspeição do ministro.
 

"A questão da suspeição nessas relações de amizade é vista caso a caso, a profundidade delas e o quanto o caso em concreto tem a ver com essa relação de amizade", diz, acrescentando que a tendência é que Zanin não seja impedido de julgar casos relacionados ao governo Lula ou à Lava Jato.
 

Doutor em direito pela USP e professor assistente no Insper, Luiz Fernando Esteves afirma que não há um parâmetro claro na legislação sobre amizade ou inimizade de ministros, mas que declarações prévias de Lula têm peso e devem ser consideradas para que ele não atue em processos em que ele seja parte.
 

Professor de direito administrativo da USP, Vitor Rhein diz ser improvável que Zanin seja considerado suspeito em casos que não tenham envolvimento direto de Lula.
 

"Se houver uma ação direta de inconstitucionalidade de interesse vital do governo, não dá para alegar que Zanin seria suspeito por ser amigo ou próximo de Lula. É óbvio que ele vai ser extremamente permeável a conversas, mas não dá para alegar suspeição."
 

Em relação a processos da operação Lava Jato, os especialistas reforçam que Zanin deve declarar impedimento naquele em que ele ou a esposa advogaram, mas que a opinião sobre a operação não impede o julgamento de outros casos. Sobre a suspeição, por outro lado, há divergência.
 

Miguel Godoy, professor de direito constitucional da UnB (Universidade de Brasília) e da UFPR (Universidade Federal do Paraná), considera positivo que a sociedade saiba quais são as posições prévias do ministro e que isso não o torna suspeito.
 

"Ruim é quando os ministros, depois de tomarem posse, ficam se manifestando sobre processos que estão em andamento ou poderão vir a julgar. Isso é um erro e uma violação da Lei Orgânica da Magistratura", diz.
 

Para Esteves (Insper), as opiniões de Zanin podem gerar questionamento sobre sua imparcialidade.
 

"Se o ministro verificar que não consegue separar a análise acadêmica da operação Lava Jato daquela que precisa ter julgando os processos, a atitude mais adequada seria ele declarar a própria suspeição."
 

Outra dificuldade apontada por Rhein (USP) é conseguir diferenciar os processos em que Zanin não foi advogado, mas que possam beneficiar ou prejudicar aqueles em que ele ou a esposa atuaram. Nesses casos, o ministro também não deve atuar, diz.

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