Carlos Newton
O que é a natureza?… Bem, sempre podemos filosofar, como fazia o jornalista Apparicio Torelly, o célebre Barão de Itararé. Como diretor do jornal “A Manha”, ele costumava dizer que “de onde não se espera é que não sai nada mesmo”. Assim, fico pensando como se comportaria o Barão diante da surpreendente mudança de procedimento do presidente Jair Bolsonaro, que nem Freud conseguiria entender.
O fato concreto é que hoje está completando um mês a metamorfose ambulante que atingiu o presidente da República, algo capaz de espantar o próprio Raul Seixas, que não tinha medo de bruxarias e chegou a compor o “Rock do Diabo”, com seu parceiro Paulo Coelho.
NINGUÉM REPAROU? – Parece inacreditável, mas ninguém comenta na mídia essa transformação de Jair Bolsonaro. Como somente eu toco no assunto, fico preocupado, achando que podem pensar que o editor da Tribuna está com um parafuso a menos, igual àquele primeiro chanceler de Bolsonaro, que voltou a ser burocrata no Itamaraty e jamais chegará a embaixador.
O fato é que eu reparei que desde o fatídico dia 8 de setembro, quando os otimistas aguardavam um golpe militar de Bolsonaro e os pessimistas esperavam um golpe militar sem Bolsonaro, o presidente da República se tornou um outro homem.
Nunca mais falou nas “quatro linhas”, deixou de mencionar “meu Exército”, parece ter esquecido a missão de “comandante-em-chefe das Forças Armadas”, passou a respeitar os ministros do Supremo, chegou até a elogiar seu arqui-inimigo Luis Roberto Barroso, o que é isso, minha gente? Parece que o mundo, de um dia para outro, virou de cabeça para baixo, assustando até os terraplanistas.
MUDANÇA DE HÁBITOS – O mais estranho é que o presidente mudou tanto que até deixou de frequentar o “cercadinho” na portaria do Palácio da Alvorada, onde toda manhã, religiosamente, o chefe do governo deixava seus cuidados para confraternizar diretamente com o povo, ao vivo e a cores, cercado pelas câmaras da mídia nacional.
No dia 11 de setembro, quando recebi a informação de que o presidente recebera “um tranco” do Alto Comando do Exército (a expressão foi mesmo esta – “um tranco”), achei que a explicação fazia sentido.
Afinal, ligar para Michel Temer, com quem jamais se relacionou, mandar um jatinho buscá-lo, assinar um texto escrito por ele e depois telefonar para o ministro Alexandre de Moraes, pedindo desculpas, tudo isso era estranho demais, realmente só explicável por uma interferência direta do Exército.
E O CERCADINHO? – Nesta quinta-feira, um mês depois, procurei a mesma fonte e indaguei se o Alto Comando também teria proibido Bolsonaro de frequentar o “cercadinho”, que funcionava para ele como uma catarse, além da finalidade eleitoral. E a resposta – monossilábica, como sempre – foi negativa.
Em tradução simultânea, este ano o Sete de Setembro foi um grito do Exército pela democracia, digamos assim. O presidente Bolsonaro foi instado a agir democraticamente, sem fazer ameaças e sem desrespeito às instituições. Mas pode voltar ao “cercadinho” quando bem entender, apenas precisa moderar as declarações, e isso é praticamente impossível.
Perguntei também pelo general Braga Netto, que vivia fazendo ameaças às instituições e nunca mais deu um pio. E a resposta foi singela: “Sem comentários”.
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P.S. – Esse “tranco” na verdade pegou em cheio o general Braga Netto. O ministro da Defesa estava convicto de que, na hipótese de um golpe militar, Bolsonaro seria afastado por incompetência e ele se tornaria o Castelo Branco dos novos tempos. Bem, sonhar não é proibido. Mas os militares hoje preferem orgulhosamente olhar para a frente e deixam o resto para trás. (C.N.)