Diogo Magri
El País
Nunca antes na história um ministro do Meio Ambiente brasileiro foi investigado por supostas violações ambientais. O ineditismo foi quebrado nesta quarta-feira, 19, quando Ricardo Salles apareceu entre os investigados da Polícia Federal sob acusação de envolvimento num “grave esquema de facilitação ao contrabando de produtos florestais”.
As 35 ordens de busca e apreensão que vasculharam propriedades de Salles e servidores apontados por ele para a pasta aconteceram em São Paulo, no Distrito Federal e no Pará e vem num péssimo momento para o fiel integrante do gabinete Jair Bolsonaro.
APOIO DOS EUA – Enquanto o Governo brasileiro tenta se livrar da imagem de “vilão ambiental” e se aproximar do Governo Joe Biden, foram justamente autoridades norte-americanas que ajudaram a deflagrar a operação da PF, ao denunciar irregularidades em carregamentos de madeira exportados para os Estados Unidos.
O objetivo da Operação Akuanduba, segundo a PF, é apurar crimes de corrupção, advocacia administrativa, prevaricação e facilitação de contrabando por meio da exportação ilegal de madeira que teriam sido cometidos por agentes públicos e empresários do ramo madeireiro.
Além de Salles, estão entre os investigados 10 funcionários do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e do Ministério do Meio Ambiente, que foram nomeados pelo ministro e afastados de seus cargos —entre eles o presidente do Ibama, Eduardo Bim.
FORO PRIVILEGIADO – A investigação de Salles, que tem foro privilegiado por ser ministro, foi autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, um desafeto do bolsonarismo.
Além das buscas, apreensões e afastamentos, Moraes determinou “a suspensão imediata” de uma despacho, editado no ano passado, que permitia a exportação de produtos florestais sem a necessidade da emissão de autorizações. Ordenou também a quebra de sigilo bancário e fiscal de Salles e outros investigados.
A justificativa da decisão leva em conta “os depoimentos, os documentos e os dados que sinalizam para a existência” do esquema de contrabando.
ESQUEMA INTERNACIONAL – “A situação que se apresenta é de grave esquema criminoso de caráter transnacional. Esta empreitada criminosa não apenas realiza o patrocínio do interesse privado de madeireiros e exportadores em prejuízo do interesse público (…) mas, também, tem criado sérios obstáculos à ação fiscalizatória do poder público no trato das questões ambientais com inegáveis prejuízos a toda a sociedade”, afirma a PF, em trecho reproduzido na decisão de Moraes.
Segundo explica o documento, o papel de Salles no esquema criminoso foi evidenciado após a apreensão nos Estados Unidos de madeira ilegal exportada do Pará pelas empresas Ebata Produtos Florestais Ltda. e Tradelink Madeiras Ltda.
As autoridades norte-americanas não aceitaram os pareceres e fizeram a denúncia à Justiça brasileira, o que motivou o início das investigações em janeiro de 2021 e culminou nos mandados desta quarta (19).
ASSESSOR DE SALLES – Os indícios da participação do ministro no contrabando foram reforçados pelo depoimento de outro servidor do Ibama, Hugo Leonardo Mota Ferreira, à Polícia Federal.
O depoente, que atua no Instituto desde 2015, destacou a participação Leopoldo Penteado Butkiewicz, assessor especial de Salles, dizendo que “nunca tinha visto um assessor direto do Ministro do Meio Ambiente atuar de forma direta no Ibama (…) tendo por diversas vezes dado ordens diretamente [a Ferreira] e intercedido em favor de autuados”.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Saudades de Itamar Franco, aquele presidente que exonerava qualquer ministro acusado de corrupção, para que se defendesse, e depois o renomeava, caso fosse inocente, como ocorreu com o chefe da Casa Civil, Henrique Hargreaves. (C.N.)