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terça-feira, maio 11, 2021

Esquema do Tratoraço demonstra que o presidente Bolsonaro resolveu “nomear” donos do Orçamento


Charge 10/05/2021

Charge do Marco Jacobsen (Arquivo Google)

Vera Magalhães
O Globo

Quando a emenda constitucional 100, de 2019, foi aprovada e promulgada, a impressão que se tinha era de que o Orçamento passaria a ser mais previsível, por ter execução dita impositiva, sobretudo das emendas. Isso daria ao Legislativo, na teoria, independência em relação ao Executivo, e acabaria com o jogo de liberação a conta-gotas de emendas, a depender das necessidades do governo de aprovar matérias no Congresso.

Mas como tudo no Brasil acaba desvirtuado e acochambrado, os novos mecanismos estabelecidos a partir da aprovação do Orçamento impositivo viraram formas de reduzir a transparência da execução orçamentária e para que o governo fizesse parcerias com alguns “donos” dos recursos orçamentários para fidelizar uma base parlamentar que até então não tinha.

FAMÉLICO CENTRÃO – Foi o amplo acesso aos recursos públicos por meio do rachuncho do Orçamento da União que fez com que o sempre famélico Centrão se aproximasse do governo, e que sedimentou a candidatura e a eleição de Arthur Lira (PP-AL) para a presidência da Câmara.

Davi Alcolumbre, o “dono” do esquema no Senado, também preparou o terreno para a própria reeleição, que foi barrada pelo Supremo Tribunal Federal.

É por isso que esses são os principais nomes do esquema revelado pelo jornal O Estado de S.Paulo em detalhada reportagem neste domingo sobre o que foi batizado de “Orçamento secreto”, ou “tratoraço”. O que se detalha ali é um dos muitos esquemas possibilitados a partir das inovações da era Bolsonaro no trato do Orçamento.

UM CONTA SECRETA – A reportagem foca no esquema no Ministério do Desenvolvimento Regional, mas ele não está restrito à pasta de Rogério Marinho. A possibilidade de que haja uma “conta” de bilhões numa pasta, e que a partir de ofícios de senadores e deputados esse dinheiro seja remetido às bases eleitorais, sem precisar de emendas tradicionais (que exigem convênios e são listadas na própria peça orçamentária, portanto, mais transparentes) existe também em pastas como Educação e Saúde.

A presença de parlamentares de quase todas as siglas nos ofícios mostra que o esquema era “secreto” apenas para a sociedade: deputados e senadores estão carecas de conhecer as chamadas emendas “RP9”, sigla que designa as emendas do relator do Orçamento.

Sob Bolsonaro e depois do Orçamento impositivo, essas emendas viraram um cheque polpudo em branco, que o relator da proposta pode emitir, contemplando deputados e senadores a partir de critérios nada claros.

PARA REDUTO ELEITORAL – O mecanismo foi aprimorado: a Secretaria de Governo, sob o comando do general Luiz Ramos, estabeleceu o modelo de ofícios mostrado pelo Estadão, em que o deputado ou senador usa o dinheiro “a que tem direito” e envia para o seu reduto eleitoral.

Mas por que parlamentares da oposição aparecem na lista, como tentou dizer Rogério Marinho para tentar negar a irregularidade patente no uso de dinheiro público?

Porque, neste caso, Davi Alcolumbre contemplou senadores da oposição esperando ter seu voto para a reeleição e, depois que foi barrado no baile pelo STF, para seu candidato, Rodrigo Pacheco. Mas o “fundão” de recursos é o mesmo, e o seu “dono” é o senador do Amapá.

PEQUENA CASTA – Isso mostra que as emendas chamam “do relator”, mas seu uso é definido por uma pequena casta, que hoje inclui Lira e Alcolumbre, mas que tem a anuência de ministros políticos (a sucessora de Ramos, Flávia Arruda, herdou também o “software” da operação).

Além das emendas “RP9”, há outras brechas para que o Orçamento seja loteado com menor possibilidade de controle de órgãos como o TCU. É o caso, por exemplo, das chamadas transferências especiais, emendas sem nenhum carimbo nem controle que são transferidas diretamente dos deputados e bancadas para Estados e municípios, de novo sem necessidade de projeto ou convênio. Já existem ações contra essas transferências. Uma delas foi impetrada no STF pelo líder do Novo na Câmara, Vinícius Poit (SP).

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