Arthur Guimarães, Felipe Grandin e Paulo Renato Soares
G1
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O Jornal Nacional teve acesso aos extratos bancários da quebra de sigilo da loja de chocolates do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos), localizada em um shopping na Barra da Tijuca, na Zona Oeste do Rio. O documento revela que, entre março de 2015 e dezembro de 2018, o estabelecimento do parlamentar recebeu 1.512 depósitos em dinheiro.
Entre essas operações, várias foram feitas de forma fracionada e sucessiva, com valores repetidos. A defesa de Flávio Bolsonaro nega qualquer irregularidade nas contas do senador. Ao fazer o cruzamento dos dados se percebeu que, neste período, foram feitos por exemplo 63 depósitos de R$ 1,5 mil em dinheiro; outros 63 de R$ 2 mil; e mais 74 depósitos no valor de R$ 3 mil.
DEPÓSITOS – A tabela mostra que, desses de R$ 3 mil, 12 depósitos foram feitos na boca do caixa e 62 no terminal de autoatendimento. Nesse tipo de depósito é usado um envelope. O banco onde a loja tem conta só aceita 50 notas por envelope e o total máximo em cada um de R$ 3 mil. A quebra do sigilo, autorizada pela Justiça, revela que em muitos dias a loja teve que repetir a operação várias vezes. Em 12 datas diferentes, foram vários depósitos de R$ 3 mil no mesmo dia.
De acordo com o documento da investigação, em 28 de novembro de 2016, por exemplo, foram sete depósitos fracionados de R$ 3 mil, totalizando R$ 21 mil. Em 18 de dezembro de 2017, foram dez depósitos de R$ 3 mil, o que soma R$ 30 mil. Já em 25 de outubro de 2018 foram 11 depósitos também de R$ 3 mil, chegando a R$ 33 mil em um único dia. Na época, qualquer depósito acima de R$ 10 mil tinha que ser notificado às autoridades de controle financeiro que investigam a lavagem de dinheiro. Ao fazer depósitos fracionados – para ficar abaixo desse valor – a loja escapava dessa fiscalização.
Na documentação obtida pelo JN agora, entre 2015 e 2018, dos 1,5 mil depósitos em dinheiro recebidos pela loja de chocolates de Flávio, só um atingiu o valor em que começa a exigência de a operação ser comunicada às autoridades. Todos os outros ficaram abaixo disso. O Ministério Público do Rio afirma que havia realização de aportes de recursos em espécie na conta bancária da empresa de forma desproporcional ao seu faturamento.
RACHADINHA – O MP diz também que existe coincidência dos depósitos em dinheiro no mesmo período em que o ex-assessor de Flávio, Fabrício Queiroz, arrecadava parte dos salários dos assessores da Alerj, no esquema da “rachadinha”.
Os promotores afirmam também que a franquia da Kopenhagen foi usada como conta de passagem por que os créditos espúrios retornavam para Flávio Bolsonaro como lucros fictícios com a finalidade de lavar dinheiro de crimes antecedentes. O senador Flávio Bolsonaro comprou a loja no início de 2015. Nos dois primeiros meses como dono, ele fez uma retirada de lucro: R$ 180 mil. O MP diz que no mesmo período, o sócio de Flávio não fez nenhuma retirada.
O Jornal Nacional já mostrou que a conta pessoal de Flávio Bolsonaro recebeu 48 depósitos em dinheiro vivo entre junho e julho de 2017, quando ele era deputado estadual. Os depósitos tinham sempre o mesmo valor, de R$ 2 mil. Foram todos feitos no autoatendimento da agência bancária da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj).
SUSPEITA – Um relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf ), atual Unidade de Inteligência Financeira (UIF), afirmou que o fato de terem sido feitos de forma fracionada desperta a suspeita de ocultação da origem do dinheiro. Na época, o senador disse que fez depósitos fracionados no caixa eletrônico porque não queria enfrentar fila e esperar o caixa conferir o dinheiro na frente de várias pessoas.
A defesa de Flávio Bolsonaro nega qualquer irregularidade nas contas do senador e esclarece que todas as informações sobre o caso já foram prestadas ao Ministério Público e não pode comentar detalhes de investigação sob segredo de Justiça. A defesa diz que já representou ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e foi instaurado procedimento para apurar os constantes vazamentos de informações.
A defesa de Fabrício Queiroz disse que ele nunca trabalhou na loja de chocolates e que desconhece os fatos relativos à sua administração.