por Carlos Chagas
BRASÍLIA - O ministro da Justiça e o presidente do Supremo Tribunal Federal continuam, para dizer o mínimo, criando polêmicas. Tarso Genro nega ter sido repreendido pelo presidente Lula, em sua tentativa de rever a Lei de Anistia e levar torturadores ao banco dos réus. Só que o presidente Lula, naquela mesma hora, declarava que a questão não é do Executivo, mas do Judiciário. Mandou Tarso ficar quieto e a ordem, pelo jeito, não está sendo cumprida.
Já Gilmar Mendes surpreendeu meio mundo numa conferência pronunciada em São Paulo. Disse que a opinião pública não deve interferir nas decisões do Supremo Tribunal Federal, justificou um novo processo civilizatório, mesmo que signifique a liberdade de criminosos, e ainda criticou os juízes de primeira instância, porque são coagidos a conceder mandatos de prisão por medo da opinião pública. Ainda culminou defendendo limitações à liberdade de imprensa, pois os meios de comunicação, muitas vezes, cumprem função equivocada.
Nas democracias, todos têm o direito de expor e sustentar suas idéias, mas, convenhamos, os dois andam exagerando. E não é de hoje, pois dias atrás bateram cabeça na questão das algemas e da concessão de habeas-corpus a supostos ladrões do colarinho branco.
Nem adianta replicar as esdrúxulas colocações do presidente da mais alta corte nacional de justiça, porque se ela decide dissociada da opinião pública, em boa coisa não vai dar essas decisões. O meritíssimo não foi juiz de primeira instância, passou da advocacia para o Supremo sem o aprendizado judiciário, mas como se sentirão seus hoje colegas mais jovens diante da acusação? Quanto aos meios de comunicação, equivocam-se, é claro, e muito. Devem ser responsabilizados e punidos, mas a posteriori, depois do erro, jamais a priori, com limitações ao direito de informar.
O ministro da Justiça não conseguirá explicar que tenha recuado publicamente, mas insiste em dizer que não errou ao atropelar a Lei de Anistia.
Faltam conselhos
Admite o ministro da Coordenação Política a retirada da medida provisória enviada duas semanas atrás ao Congresso, transformando a secretaria em Ministério da Pesca e criando 295 novos cargos a serem preenchidos sem concurso. A razão parece a discordância da maioria dos deputados e senadores, tanto pelo desperdício inexplicável quanto pela falta de urgência relevância que a Constituição exige para a edição das MPs. Bastaria um projeto de lei para mudar mais uma vez a estrutura do Executivo, se aceita pelo Legislativo.
A gente sente em especial no curso do segundo mandato do presidente Lula a ausência de conselhos e de conselheiros ao redor de seu gabinete, no Palácio do Planalto. A rejeição da medida provisória significaria amplo desastre político para o governo, mas a sua retirada não fica atrás.
Desde que foi criado, pela Constituição de 1988, jamais se reuniu o tal Conselho da República, constituído de luminares e de experientes cidadãos, daqueles que a idade suprimiu as ambições e que apenas contribuiriam para o melhor funcionamento das instituições. O resultado aí está.
Adiamento perigoso
Foi mais uma vez adiada a decisão da Justiça Eleitoral e penduricalhos da utilização das Forças Nacional de Segurança nas favelas do Rio, visando minimizar a ação do crime organizado nas campanhas para as eleições municipais. O governo fluminense terá motivos de auto-afirmação para rejeitar a presença de tropa federal em seu território, mas a pergunta que se faz é se, enquanto isso, os bandidos deixam de afirmar ainda mais sua soberania absoluta nas regiões por eles dominadas. É humilhante verificar que candidatos a prefeito, para subir o morro, necessitem de licença de seus donos, não raro sendo barrados nos primeiros degraus.
A impressão é de que inexiste um Brasil uno e indivisível, mas três Brasis isolados e diferenciados: o federal, o estadual e o municipal. À medida que se aproximam as eleições, mais cresce o risco de um entrevero grave, apesar da evidência de estarem os candidatos a prefeito acomodados e acovardados à mercê do narcotráfico. Trata-se de uma evidência a mais de que qualquer deles, se eleito, desconhecerá a maior das mazelas a dominar a antiga capital. Ficará tudo como está nessa estranha discussão sobre se a cocaína e a maconha são federais, estaduais ou municipais...
A quem pensam enganar?
Abre a mídia internacional, e a nacional, também, amplos espaços para condenar a Rússia pela invasão da Geórgia. Nem haverá que contestar, trata-se de um ato de truculência tão a gosto dos povos eslavos, mas salta aos olhos que nessa nova crise sobressaia a impávida palavra do presidente dos Estados Unidos, condenando os russos. Mr. Bush exige a retirada das tropas e lembra o governo democrático dos georgianos.
O diabo é que não olha para os próprios pés, porque os americanos invadiram o Afeganistão e o Iraque, só para lembrar suas mais recentes incursões em todo o planeta. E quem for pesquisar a respeito do moderno armamento das forças armadas da Geórgia, não se surpreenderá quanto à origem. Ou aquele país não se encontra prestes a ingressar na Otan?
Fonte: Tribuna da Imprensa
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