por: Carlos Chagas
BRASÍLIA - Começou ontem mais uma temporada do maior festival de baixarias do País, o horário de propaganda eleitoral gratuita. Candidatos a vereador começaram a apresentar-se, ficando para hoje a vez dos candidatos a prefeito, com ênfase para as capitais dos estados. O horror vai durar 45 dias, quando o cidadão comum, duas vezes por dia, de tarde e à noite, terá como opção desligar os aparelhos de rádio e televisão, caso não pretenda ver-se agredido por uma enxurrada de mentiras.
Indicam os institutos de pesquisa que apenas 22% dos ouvintes e telespectadores prestam atenção no que transmitem os alto-falantes e mostram as telinhas, durante o horário gratuito.
A enganação começa no rótulo: de gratuito, esse horário não tem nada. Os candidatos ricos gastam fortunas na preparação de suas performances, não tendo surtido efeito a determinação que os proíbe de apresentar cenas externas, multidões colhidas nos campos de futebol como se fosse aos comícios e depoimentos de atores e pessoas públicas em favor deles. Proibição eficaz, mesmo, só para cantores e cantoras, duplas caipiras e sucedâneas.
Já os candidatos pobres também se obrigam a botar a mão no bolso, dada à necessidade de contratação de agencias e de profissionais de marketing, mesmo que seja apenas para maquiá-los e aconselhar nas mensagens, além do aluguel de equipamento. Não pegou, até hoje, a sugestão do senador Pedro Simon, de que tudo deveria acontecer ao vivo, nos estúdios da TV e do rádio, restringindo-se a parafernália auxiliar a um banquinho, uma câmera e um microfone. Nessa hora, o eleitor veria saberia o mínimo da capacidade de cada um.
Houve tempo, durante a ditadura, em que prevalecia a famigerada "lei Falcão", permitindo somente a apresentação da imagem dos indigitados pretendentes a postos eletivos, com nome e número, à maneira dos criminosos nas delegacias. Mesmo assim, a atual formatação custa dinheiro, conforme as posses e as doações feitas a cada um.
Também não há nada de gratuito no que diz respeito às emissoras de rádio e televisão. Elas estão autorizadas a descontar do Imposto de Renda o tempo tomado pela Justiça Eleitoral, conforme as tabelas de publicidade. Deixam de recolher milhões aos cofres públicos.
Vale assistir esses espetáculos tão grotescos quanto despojados de debates efetivos sobre os problemas municipais, estaduais e nacionais? Por mais estranho que pareça, vale. Porque a propaganda eleitoral gratuita positivamente não nos indicará em quem votar, mas, no reverso da medalha, sempre nos dirá em quem não votar.
Desnudará quantos carecem das mínimas condições de exercer mandatos, menos pelos erros de português e de concordância que apresentem, mais pela comparação entre o que dizem e o que não dizem. No fim, ganha a democracia...
Quem sabe Bangladesh ou a Islândia?
Mandou-se o governador José Serra para a Inglaterra e para o Japão, de onde só retorna no final do mês. Isso se na volta não for convidado para visitar Bangladesh ou a Islândia. Foge o tucano-mor da campanha pela prefeitura de São Paulo, apesar de haver deixado gravada mensagem de apoio a Geraldo Alckmin, para apresentação no horário de propaganda eleitoral gratuita.
Serra parece na mesma situação do coitado que, se ficar o bicho come, mas, se correr, o bicho pega. Correu, mas não adianta nada, porque não apenas os adversários ressaltarão a fuga. Até os dois que imaginam contar com seu apoio mostram-se frustrados. Alckmin não se contentará com a pífia recomendação de voto. Gilberto Kassab e os dirigentes do DEM estarão anotando cada omissão do antigo patrono para, no futuro, apresentarem a conta. Provavelmente quando começar a campanha pela sucessão de 2010.
A saia justa em que se encontra o governador paulista deve-se à precipitação de ter-se comprometido com o vice-prefeito que assumiu seu lugar, quando da renúncia para candidatar-se ao Palácio dos Bandeirantes. Mas também corre por conta da disposição de Geraldo Alckmin dar o troco, dadas às queixas de que na campanha sucessória de 2006 não contou com o entusiasmo de Serra.
Tanto faz as causas, importa prospectar os efeitos. Ganhando Marta Suplicy, perdem os três, ou seja, Serra Alckmin e Kassab. Superando a derrota certa no primeiro turno, mas recuperando-se no segundo, Alckmin pensará duas vezes antes engajar-se por inteiro na campanha de Serra para o palácio do Planalto.
Para que conhecer o óbvio?
Corre em Brasília a informação de estar o Palácio do Planalto prestes a contratar uma das grandes agências de pesquisa de opinião para saber quais os índices de popularidade do governo Lula. Trata-se de um direito dos que governam conhecer o comportamento da sociedade, mas, no caso, haverá algo mais na iniciativa?
Porque pelos números divulgados periodicamente em pesquisas não encomendadas pelo governo, o presidente Lula cresce dia a dia, registrando-se hoje que 65% dos brasileiros o apóiam. Não se pergunta de modo específico para quê, mas é óbvio que "para governar". A pesquisa não deve alargar-se mais, ao menos de forma ostensiva, mas se incluírem nas perguntas o nome da ministra Dilma Rousseff, dificilmente ela conseguirá dois dígitos.
Onde localizar o algo mais? "Elementar" ouviria o dr. Watson, caso Sherlock Holmes houvesse afirmado a frase que Connan Doyle jamais escreveu. Elementar porque ficará mais claro ainda que para preservar o poder, seus atuais detentores só dispõem de um candidato: ele mesmo.
O presidente Lula nega, irrita-se, mas nem tanto, com a indagação sobre suas intenções, mas mesmo sem querer aproxima-se do momento em que precisará decidir. Logo depois de conhecidos os resultados das eleições de outubro, sairá para a rua a "procissão da Dilma". Se a imagem não despertar a devoção dos fiéis, logo atrás virão Santíssimo Sacramento, diante do quais todos se curvam...
Semana morta? De jeito nenhum
Recesso remunerado, de um lado, esforço concentrado, de outro. É sempre assim, no período das campanhas eleitorais, porque deputados e senadores precisam estar em suas bases. A semana em curso é de ausências em Brasília, mesmo com alguns líderes fazendo plantão. O vazio no palácio do Congresso desperta poucas reações, o povão não está nem aí.
Talvez nem esteja para as eleições, apesar de haver começado o período de propaganda eleitoral gratuita. De qualquer forma, há males que vem para bem. Privada das imagens de seus astros e suas reuniões, a TV Senado aproveita para retransmitir a memória nacional. Segunda-feira, o dia foi dedicado ao presidente Juscelino Kubitschek, com a apresentação de diversos filmes a seu respeito. Tomara que ainda esta semana mostrem o acervo que dispõem sobre João Goulart, Getúlio Vargas e, quem sabe, Leonel Brizola. Os telespectadores sairão ganhando.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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