Carlos Newton
Com a eleição dos novos dirigentes da Câmara e do Senado, o presidente Jair Bolsonaro espera estar retomando o pacto entre os três Poderes, a pretexto de garantir a governabilidade, nos exatos termos que lhe foram propostos pelo ministro Dias Tofolli em 2019 no início do mandato. Nesta segunda-feira, foi fácil dobrar o Legislativo com 30 dinheiros, e o esquema de Bolsonaro para evitar impeachment e blindar os filhos é quase perfeito.
Mas quase também é mais um detalhe, como diria Roberto Carlos, e a articulação política ficou capenga, porque faltou combinar com o atual presidente do Supremo, Luiz Fux.
NÃO É TOFFOLI – O fato concreto é que Fux nada tem a ver com Toffoli, cuja mulher lhe dava mesada bancária de R$ 100 mil e foi apanhada na malha fina da Receita, exatamente o que aconteceu também com Gilmar Mendes, que não recebia mesada, mas ele e a esposa também caíram na fiscalização financeira.
Fux é um jurista de grande valor. Seu ponto fraco é o amor pela filha que virou desembargadora às custas dele, e o único grave erro jurídico que cometeu foi ter assinado um voto que repetia, ipsis litteris, textos da defesa de Silvio Santos no processo da Telesena.
O problema ocorreu no STJ. À época, fui o único jornalista que denunciou o fato, nas o erro pode ter sido de algum assessor da equipe do ministro, que fez Fux passar essa vergonha.
MINISTRO CONFIÁVEL – De toda forma, Fux é um ministro confiável, que no Supremo integra a bancada contra a corrupção, junto com Edson Fachin, Cármen Lúcia, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso, que pode chegar a seis votos e fazer maioria, dependendo da volúvel Rosa Weber, cujo voto decidiu o veto à prisão após segunda instância, colocando o Brasil na contramão dos demais 192 países da ONU.
A presença de Fux na presidência do Supremo é fundamental, porque agora Bolsonaro tem praticamente tudo dominado. Polícia Federal, Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Ministério da Justiça, Advocacia-Geral da União e Procuradoria-Geral da República, hoje todos esses órgãos trabalham prioritariamente para a família Bolsonaro, com o interesse público ficando em plano inferior.
HÁ UMA EXCEÇÃO – O único órgão que mantém uma certa independência é a Controladoria-Geral da União, cujo ministro Ricardo Waller Jr. se comporta com independência e teve sua demissão sugerida pela Abin, no relatório destinado a blindar o senador Flávio Bolsonaro.
No Congresso, com a eleição do rachadista Arthur Lira na Câmara, réu em ações penais e que nem pode assumir interinamente a Presidência da República, e do político-empresário Rodrigo Pacheco no Senado, o presidente se livra até da possibilidade de ser alvejado por uma CPI, como aconteceu com Fernando Collor.
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P.S. – Portanto, Bolsonaro hoje reina em meio à podridão e ao silêncio obsequioso e servil dos generais que o cercam. Nesse quadro, o ministro Fux agora se tornou a grande esperança da nação para evitar que Bolsonaro, sua família e seus parlamentares corruptos se coloquem acima da lei e da ordem. Aliás, o discurso de Fux, criticando Bolsonaro de corpo presente, merece entrar na História. Jamais o Jornal Nacional deu tamanho destaque ao discurso de um presidente do STF. (C.N.)