Carlos Newton
Jamais se viu nada igual na História do Brasil – um general de quatro estrelas prestar um depoimento mentiroso ao Supremo Tribunal Federal, como procedeu o ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, ao afirmar que a reportagem de Guilherme Amado sobre os relatórios da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) é apenas uma “narrativa fantasiosa” do repórter. Nas explicações enviadas à ministra Cármen Lúcia, relatora da ação no STF, o general negou peremptoriamente que a Abin tivesse feito sugestões às advogadas de Flávio Bolsonaro para anular as investigações sobre as rachadinhas.
Ao fazê-lo, o ministro pensou (?) que poderia se socorrer na conhecida estratégia de que “é apenas minha palavra contra a dele”, sem outras provas ou testemunhos, e tudo acabaria em pizza. Mas se enganou redondamente.
JÁ HAVIA PROVAS… – Em sua certeza da impunidade que vigora no Brasil, o general Augusto Heleno jamais imaginaria que o jornalista Guilherme Amado tivesse uma carta na manga, que iria desmentir e desmoralizar não somente as declarações do ministro do GSI, como também o depoimento de Alexandre Ramagem, diretor-geral da Abin, aquele delegado federal que Bolsonaro tentara nomear em abril para dirigir a Polícia Federal, mas o então ministro da Justiça, Sérgio Moro, se recusou a aceitar, para que não houve interferência na ação da PF, lembram-se?
Pois bem. A dupla Heleno e Ramagem não imaginou que suas “narrativas fantasiosas” ao STF seriam imediatamente desmentidas pelo próprio repórter, que tivera a prudência de entrevistar uma das advogadas de Flávio Bolsonaro e ela confirmou ter recebido as propostas da Abin para anular as investigações contra o filho 01 do presidente.
Detalhe importantíssimo: a entrevista da advogada Luciana Pires foi feita dia 9, antes da publicação da primeira matéria de Guilherme Amado.
FORMAÇÃO DE QUADRILHA – Em tradução simultânea, ficou comprovado que a reunião ilegal no Planalto, com a presença do presidente, do ministro, do diretor da Abin e das duas advogadas, constituiu um clássica formação de quadrilha, em conluio com objetivo declarado de descumprir a lei, visando a evitar que a Justiça seja feita. Apenas isso.
E como no Brasil tudo precisa de um toque de humor, na entrevista advogada Luciana Pires esculhambou o diretor-geral da Abin, responsável pelas sugestões à defesa de Flávio Bolsonaro.
“Eu não tenho contato nenhum com o Ramagem. Ele ia ajudar em quê? Ele não tem a menor ideia do que está acontecendo lá dentro [da Receita], eu tenho mais informação do que ele. Ele sugeriu esse monte de ação que ninguém seguiu nada”, ironizou.
CRONOLOGIA DOS FATOS – Fica assim estabelecida a cronologia da atuação da quadrilha: 1) na reunião no Planalto, fica decidida a atuação da Abin. 2) Os espiões/trapalhões da Agência fazem os relatórios propondo a demissão do ministro Gilberto Walle Jr., da Corregedoria-Geral da União, para ser substituído por um delegado federal ligado à quadrilha palaciana, e propõem também a exoneração de três altos funcionários da Receita, entre outras maluquices. 3) Ramagem envia os relatórios a Flavio Bolsonaro, que os repassa às advogadas. 4) Elas desprezam as sugestões, só aproveitando a ideia de fazer uma petição ao Serpro (órgão da Receita).
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P.S. – Aliás, sob comando desse personagem asqueroso e bajulador, a Abin precisa urgentemente mudar de nome e passar a ser conhecida como “Agência Brasileira de Interferência”, permanecendo com a mesma sigla. E quem está de parabéns é o ex-ministro Sérgio Moro, que não admitiu as interferências palacianas na Polícia Federal, através do mesmo Alexandre Ramagem, e pediu demissão com a maior dignidade. (C.N.)