Posted on by Tribuna da Internet
Vera RosaEstadão
Ninguém se entende no Palácio do Planalto sobre a comunicação do governo. Mas, entre uma e outra cotovelada, um auxiliar aconselhou Jair Bolsonaro a ser “mais Bolsonaro” e menos Zero Um, Dois ou Três, expressões usadas por ele para se referir aos filhos. A ideia é que o presidente não fique mais refém dos rebentos, nem do núcleo militar e muito menos do escritor Olavo de Carvalho, seu guru ideológico.
A portas fechadas, Bolsonaro se queixou, recentemente, até mesmo de militares que o acompanham no governo. Os resmungos ultrapassam a fronteira do gabinete do vice, general Hamilton Mourão, alvo preferencial da ofensiva do vereador Carlos Bolsonaro (PSC-RJ). As críticas do “Zero Dois” são endossadas por Bolsonaro.
ALFINETADAS – Na prática, têm sobrado alfinetadas para muitos amigos da ala fardada, mas nunca para o general do Exército Fernando Azevedo e Silva, titular da Defesa, com quem Bolsonaro se reuniu neste Dia do Trabalho, ao lado de outros ministros e comandantes das Forças Armadas, para tratar da crise na Venezuela.
Nos últimos dias, Bolsonaro ficou aborrecido, por exemplo, com o general Santos Cruz, que comanda a Secretaria de Governo e não está se entendendo com o novo chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), Fábio Wajngarten.
O núcleo militar quer proteger Bolsonaro e construir uma espécie de cordão de isolamento, no terceiro andar do Planalto, para evitar que ele escorregue em novas cascas de banana. Não sem motivo: tropeços em palavras podem sempre causar mpacto sobre a política e a economia.
LINHA DIRETA – Os olavistas e os filhos, por sua vez, acham que o presidente, no palanque virtual, não precisa de porta-voz ou de intermediários, muito menos da imprensa, para transmitir sua mensagem à população. E o novo chefe da Secom, sob fogo cruzado dos dois grupos, quer que Bolsonaro seja “gente como a gente”, mais espontâneo e contador de “causos”, sem seguir nenhuma cartilha de comportamento.
No diagnóstico da Secom, Bolsonaro perdeu popularidade justamente por ter ficado enclausurado, só expondo suas ideias pelo Twitter e afins. Não é à toa que, agora, ele tem dado “escapadas” para, em seguida, posar para selfies com apoiadores. O novo estilo foi exibido no feriado prolongado de Páscoa, quando o presidente dirigiu uma moto por meia hora, no Guarujá, com um colete à prova de balas. No domingo passado, 28, ele também apareceu de surpresa na casa do senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), o “Zero Um”, que comemorava aniversário. “Será que estou no prédio certo? Parece que tem um filho meu que mora aqui, se não me engano”, brincou.
BASE ALIADA – A tentativa de ser mais simpático, no entanto, ainda não resultou na formação de uma base aliada no Congresso. “Para defender o governo eu preciso de um canhão, mas consigo no máximo um estilingue”, disse ao Estado o líder do PSL no Senado, Major Olímpio (SP), irritado com o que classifica como “falta de articulação política” do Planalto. “Eu nunca recebi orientação do Executivo”, resumiu o senador.
A reforma da Previdência continua sendo a prioridade do governo nesta temporada, mas surge agora outra preocupação no horizonte em um céu que, diga-se de passagem, não é de brigadeiro. Para aprovar a Medida Provisória que diminui o número de ministérios de 29 para 22, deputados e senadores querem esvaziar o poder do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, e devolver o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) para a equipe econômica.
RECUO – Bolsonaro já havia concordado com a exigência, mas, diante da resistência de Moro, recuou. O Coaf atua na prevenção e no combate à lavagem de dinheiro. Foi o colegiado que identificou movimentações bancárias atípicas nas contas de Flávio Bolsonaro, quando ele era deputado estadual, e também de seu ex-assessor Fabrício Queiroz, como revelou o Estado.
O Centrão, bloco que reúne cerca de 250 dos 513 deputados e dá as cartas na Câmara, já avisou que ou o Coaf sai da alçada do ex-juiz da Lava Jato ou a MP da reforma administrativa não passará. A medida provisória caduca em junho e, se Bolsonaro não conseguir apoio, o desenho da Esplanada ficará como era na gestão de Michel Temer.
Mesmo antes dessa definição, porém, o embate sobre os rumos da comunicação trouxe à tona as discussões sobre uma reforma ministerial, ainda que mais enxuta. Um dos modelos em estudo prevê que a Secom volte para o guarda-chuva da Secretaria-Geral ou fique diretamente ligada à Presidência. A Casa Civil também poderá sofrer ajustes.
DIZ O ZERO DOIS – “Vejo uma comunicação falha há meses da equipe do Presidente”, escreveu Carlos Bolsonaro no Twitter, na segunda-feira, 29. “Tenho literalmente me matado para tentar melhorar, mas, como muitos, sou apenas mais um e não pleiteio e nem quero máquina na mão. É notório que perdemos oportunidades ímpares de reagir e mostrar seu bom trabalho”, emendou ele.
Pouco tempo depois, o pastor Silas Malafaia postou mensagem apoiando o vereador nas redes sociais. “O filho do presidente Carlos Bolsonaro tem razão. Concordo em gênero, número e grau com o que ele diz. (…) Na minha humilde opinião, a Secom deveria ser subordinada diretamente ao presidente, sem nenhuma interferência do ministro”, observou Malafaia, em referência a Santos Cruz.
Autor de um pedido de impeachment contra Mourão, devidamente arquivado, o deputado Pastor Marco Feliciano (Podemos-SP), vice-líder do governo, foi na mesma toada e, nesta terça-feira, 30, atacou o chefe da Secretaria de Governo. “Enquanto Santos Cruz trava toda a publicidade do Governo Federal, em especial a campanha da Nova Previdência, somos nós deputados da base aliada que apanhamos sem dó da oposição (…)”, afirmou Feliciano no Twitter.
CENTRÃO APLAUDE – A brigalhada é aplaudida por integrantes do Centrão, como o presidente do Solidariedade, Paulo Pereira da Silva. “Já dizia um experiente político: ‘Se os seus adversários estão se matando, não atrapalhe.’”, provocou o deputado.
Neste 1.º de Maio, Paulinho da Força admitiu até mesmo que o Centrão planeja desidratar a reforma da Previdência para não garantir a reeleição de Bolsonaro, em 2022.
Depois de tanto bate-cabeça, todos os ministros foram convocados a apresentar, neste mês, as metas de suas pastas para os 200 dias de governo. Resta saber quem sobreviverá às redes sociais até lá.