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sexta-feira, dezembro 31, 2010

Por trás da megalomania ou o Dr. Pangloss tropical

Carlos Chagas

Mais do que megalomania, é remorso, diria um estudante do primeiro ano de Psicologia. Uma necessidade absoluta de, autoelogiando-se, tentar inutilmente demonstrar que fez o melhor para o país e que não traiu seu eleitorado em 1994. Porque quando Fernando Henrique Cardoso firmou-se como candidato, graças ao apoio do então presidente Itamar Franco, trazia o perfil de um socialista moderado. Era alguém que daria mais alguns passos no rumo da justiça social, que governaria para o andar de baixo e para a classe média, respeitando e até ampliando os direitos trabalhistas e afirmando a soberania nacional.

Não é brincadeira: por isso ele foi votado, em contraposição a um Lula ainda tido como o lobisomem das elites e do mercado. O país queria mudanças, mas dentro da tranqüilidade, sem radicalismos.

Depois, foi o que se viu. A farsa da flexibilização, que o candidato jamais admitiu em campanha. O desmonte dos direitos sociais fixados na Constituição, a quebra dos monopólios essenciais à nacionalidade e a entrega pura e simples de nossa economia ao estrangeiro. Mais as privatizações, boa parte com dinheiro público, dos fundos de pensão, do BNDES, do Banco do Brasil e similares.

Tudo isso era o oposto do que o Brasil esperava, mas, como o andar de cima entrou em orgasmo financeiro, ampla campanha de propaganda ofuscou a perplexidade e a indignação nacional. O campeão do socialismo transmudou-se em tirano do neoliberalismo sem que seus eleitores nada pudessem fazer.

Nem se fala, hoje, do golpe sujo da reeleição comprada a dinheiro vivo, muito menos do uso da máquina pública para garantir-lhe mais um mandato.�

O resultado aí está: de forma compulsiva, FHC não perde um dia sem aparecer na mídia, buscando travestir a História e mostrar-se como quem mudou o Brasil, conforme ainda esta semana declarou num programa de televisão. Chegou a dizer, “sem falsa modéstia”, que o país era um, antes dele, passando a ser outro, depois. Nesse particular pode ter razão: outro que ele transformou em paraíso dos especuladores e inferno do trabalhador e dos assalariados de pequena renda, sem falar nos miseráveis cujo número multiplicou-se.�

Vendo as coisas mudarem nos anos Lula, ainda que nem tanto na economia, o ex-presidente passou a exaltar o que realizou de pernicioso como se tivesse sido a base do que o sucessor realizou de benéfico para a população carente. Um artifício de raciocínio digno do Pinóquio, no qual ninguém mais acredita.

Assim estamos quando o ex-presidente começa a trocar o alvo de suas invejas. Do Lula, está passando para Dilma, a quem acusou de não terminar raciocínios, não entendendo o que ela quer dizer. Deve-se, essa oclusão, a estar utilizando um tipo novo de óculos, no caso, de um dr. Pangloss dos trópicos…

MALHAR EM FERRO FRIO

Será repetir o que muitas vezes temos escrito, mas o absurdo vem desde 1988 e o Congresso, em sucessivas Legislaturas, não se animou a corrigir. A posse de presidentes da República no primeiro dia de janeiro, de quatro em quatro anos, significa uma aberração. Não dá para nenhum ser humano festejar a passagem do ano, em família ou sem família, e horas depois assistir a cerimônia de posse de um novo chefe de governo.

Não é por conta da presença ou da ausência de chefes de estado e de governo, muitos impossibilitados de pegar o avião e chegar a Brasília a tempo homenagear quem entra e quem sai. Falta, propriamente, eles não fazem, numa festa essencialmente nossa. O que salta aos olhos é a diversidade de situações. Dizem vir por aí a reforma política, mais uma oportunidade de alterar o calendário para dez dias antes ou dez dias depois do Ano Novo, já que este não pode mesmo ser mudado.

Fonte: Tribuna da Imprensa

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