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sexta-feira, dezembro 24, 2010

Um saco de gatos

Carlos Chagas

Composto o ministério, vale menos ficar calculando quantos ministros o PT emplacou a mais do que o PMDB ou se os ministros paulistas estão em maioria. Fica irrelevante até saber se os homens superam as mulheres. Importante, mesmo, será conhecer que diretriz Suas Excelências deverão receber e seguir. Porque acima e além das obrigações e projetos específicos de cada pasta, sempre existiu, em todos os governos, uma espécie de marca geral unindo o conjunto.

Já foi o desenvolvimento, nos tempos de Juscelino Kubitschek, como havia sido a justiça social, para Getúlio Vargas. Chegou a ser a redemocratização, com Tancredo Neves e José Sarney, a modernidade, com Fernando Collor e a flexibilização, com Fernando Henrique. Com o Lula, pode-se concluir pela incorporação de parte das massas carentes ao mercado, ainda que algum tempo transcorra para a cristalização dessa hipótese.

E com Dilma Rousseff, será mesmo válida sua promessa de erradicar a pobreza? Se cada ministro tiver essa meta a norteá-lo, a presidente da República terá como caracterizar a grande proposta de seu mandato. Realizar é outra história, mas precisamente na dependência da equipe agora completada e por enquanto solta no espaço.

Existem ministros que não se conhecem. Ministros que foram apresentados a Dilma na hora de ser convidados. Outros, até, escolhidos pelo telefone, sem ter tido oportunidade de apertar-lhe a mão. Estes, empenhados em cumprir as determinações de seu partido, aqueles ainda sem saber direito porque ocuparão o ministério “X” e não o “Y”. Os que serviram o governo Lula e os que pela primeira vez pisam a Esplanada dos Ministérios.�

Em suma, até agora um saco de gatos, à espera da palavra da presidente, que já tarda.

PAPAI NOEL DE SACO CHEIO (DE PRESENTES)

Hoje à noite o trenó do Papai Noel sobrevoará Brasília, distribuindo presentes.

Antônio Palocci, da Casa Civil, receberá uma fotografia emoldurada de José Dirceu, para botar na parede. Explica-se: George Smiley, obcecado chefe do Serviço Secreto inglês, tinha em seu gabinete a imagem de Karla, seu principal adversário, chefe da KGB.

Para Gilberto Carvalho, Secretário Geral, um exemplar do livro “Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas”. Para José Eduardo Cardoso, da Justiça, a relação dos atuais ministros do Supremo Tribunal Federal que se aposentarão nos próximos anos.

Para Fernando Haddad, da Educação, um CD com a música “Devagar não se chega ao longe”. Para Guido Mantega uma miniatura do deus Juno, da Grécia Antiga, aquele de duas faces. Para Wagner Rossi, da Agricultura, um jogo infantil de pá e carrinho de mão.

Para Idely Salvatti, da Pesca, um molinete com anzol e um peixe de plástico. Para Alexandre Padilha, da Saúde, o estetoscópio que aposentou faz muito. Para Aloizio Mercadante, da Ciência e Tecnologia, a biografia do Dr. Silvana.

Para Mario Negromonte, das Cidades, a maquete de Salvador dos tempos em que foi capital. Para Afonso Florence, da Reforma Agrária, um boné do MST. Para Orlando Silva, do Esporte, reportagens de “Porque perdemos a Copa de 50”.

Para Nelson Jobim, da Defesa, a miniatura do caça F-18. Para Moreira Franco, dos Assuntos Estratégicos, a última tese de Mangabeira Unger sobre a influência das barbas do camarão egípcio nas correntes do Mar Vermelho.

Nenhum dos novos ministros deixará de receber seu presente, ainda que muitos caiam embrulhados num significativo papel azul, próprio para escrever bilhetes, contendo pirulitos.

No Congresso, Papai Noel despejará pacotes em profusão: uma peruca para José Sarney, uma vassoura para Marta Suplicy, com instruções de Harry Potter sobre como voar, um uniforme do Super-Homem para Eduardo Suplicy, uma estrela de xerife para Pedro Simon, um título de sócio-proprietário da Praia de Ipanema para Aécio Neves, histórias de James Bond para Roberto Requião, detalhados mapas do Chile para Marco Maciel, a biografia do General Custer para Índio da Costa, um exemplar de “Como Era Verde o Meu Vale” para Marco Maia, o filme “Fugindo do Inferno” para Tasso Jereissatti.

Para todos os deputados e senadores, como brinde, mensagem escrita em letras garrafais contendo o número IV do artigo 7 da Constituição, onde se lê que o salário mínimo atenderá as necessidades vitais do trabalhador e sua família, como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social.

Ao passar sobre o Supremo Tribunal Federal, o Bom Velhinho distribuirá cópias da crônica de um dos Felipes, rei da França, que diante de prolongadíssimo conclave de cardeais para escolher o novo Papa, em Avignon, mandou prendê-los numa pequena igreja, da qual retirou o teto. Expostos ao sol, à chuva e à neve, recebendo apenas um pão por dia, para repartir, Suas Eminências logo elegeram um deles.

Junto com o texto sutil estará um calendário marcando a protelação, já por quatro anos, do julgamento dos quarenta réus do mensalão, pela mais alta corte nacional de Justiça.

Terá Papai Noel esquecido das duas maiores figuras da capital federal, o presidente que sai e a presidente que entra? Nem pensar, ainda que o segredo pareça desconhecido até dos anões fazedores de brinquedos. Pelos boatos, no entanto, o Lula receberá a coroa que um dia foi de D. Pedro II. E Dilma, a biografia de Margareth Tatcher.

Fonte: Tribuna da Imprensa

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