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terça-feira, junho 05, 2007

Especial Meio Ambiente/Reciclagem de lixo é solução ultrapassada

Alexandre Lyrio
Bem cedo o leite era deixado na porta das casas. Entregue em recipiente de vidro, a embalagem não apenas conservava o sabor do produto recém-extraído, mas também era devolvida no dia seguinte para ser reutilizada. A realidade comum no passado, e ainda presente em algumas cidades do interior, pode ser a solução futura para os problemas trazidos pelo excesso de lixo das grandes metrópoles. É o que defendem atualmente alguns especialistas, propagadores do princípio da não geração de resíduos. Mesmo a reciclagem, antes recurso principal no combate à poluição, é considerada mero instrumento de contribuição ambiental, diante da possibilidade do “lixo zero”. O retorno ao tempo dos tradicionais “cascos de cerveja”, que voltavam às fábricas para depois retornar ao consumidor, pode significar o fim do que se defendeu amplamente nos últimos anos. As questões ambientais relacionadas aos resíduos não se limitam à tão conhecida reciclagem, preocupada apenas com o lixo depois de gerado. Evoluir dessa visão é partir da idéia de que o lixo sequer deve existir. A nova vertente de pensamento serve de base para as pesquisas realizadas pela Rede de Tecnologias Limpas (Teclim), da Universidade Federal da Bahia. Pesquisadora do grupo, a professora Maria de Fátima Nunesmaia esclarece que a minimização na produção de resíduos não deve ser confundida com a reciclagem, comumente apontada como principal beneficiadora do meio ambiente.
“Reciclar não é dar um fim ao lixo. Apesar de essa também ser uma etapa importante, pensar a geração é ainda mais prioritário”, explica a ambientalista. Por isso, buscar estratégias para o chamado desenvolvimento sustentável envolve a análise de toda a matéria-prima que se gasta até chegar ao lixo. As etapas de produção e consumo devem levar em consideração as conseqüências, a longo prazo, ao meio ambiente. “Como resolver a questão do consumo desordenado? Definitivamente não é a reciclagem que vai fazer isso”, diz a especialista.
Educação - Tudo dependeria de investimentos na educação. Reduzir o lixo significa freio no consumo. A possibilidade de se consumir menos embalagens nos supermercados, por exemplo, está intimamente ligada à cultura da população. “Na Europa, é comum as pessoas usarem os dois lados do papel para diminuir a quantidade de lixo produzido”, revela Maria de Fátima. O simples uso indiscriminado de copinhos plásticos também é condenável. Até mesmo mudanças no hábito alimentar seria interessante. Reutilizar cascas de alimentos é apenas uma das opções viáveis.
Pesquisadora do lixo fabricado pelas cidades, Maria de Fátima, que também é titular da Universidade Estadual de Feira de Santana (Uefs), defende a gestão integrada de resíduos urbanos. O tema virou tese de doutorado em ciências ambientais da UPC, na França. Em seu estudo, a professora argumenta que os aterros sanitários recebam apenas o que não há nenhum valor agregado. No novo modelo de gestão, quase nada deveria ser lixo.
No Brasil, os resíduos gerados em 2.758 municípios, o que corresponde a mais de 50% do total do país, são vazados em lixões e em alagados. A especialista aconselha a identificação das grandes fontes geradoras de resíduos e um posterior planejamento da eficiência ambiental no tratamento do lixo e do material do qual ele é gerado. “Talvez o ‘lixo zero’ seja um desejo impossível. Mas é a partir dele que desenvolvemos o nosso pensamento”, completa.
***NÚMEROS
Composição gravimétrica dos resíduos domiciliares de Salvador/Bahia
FRAÇÕES VALOR EM %Matéria Orgânica 54,14 Papel/Papelão 5,26 Vidro 1,89 Plástico 12,78 Metais 1,73 Tetra Pak 0,97 Trapo/Couro 1,79 Entulho 0,44 Madeira 0,56 Outros 20,11 Fonte: Tese de Doutorado de Maria de Fátima Nunesmaia/ UCP(França)
***Catadores aquecem mercado
É deles o trabalho mais complicado. São os catadores de rua os principais responsáveis pelo crescimento do mercado de recicláveis no Brasil, país campeão mundial no reaproveitamento de latas de alumínio, com 95% do material utilizado. Famílias inteiras transformaram o lixo na sua principal fonte de renda.
Resíduos recuperados dos lixões e ruas das cidades são matéria-prima na fabricação de novos produtos ou possibilitam o seu reaproveitamento. Embora não seja a solução para a constante geração de resíduos, a reciclagem representa um novo encaminhamento do lixo já produzido.
Uma ex-gari é a presidente da Coopermac, cooperativa de reciclagem que atua em Camaçari, exemplo de sucesso no setor. Glória Marta da Silva é uma das fundadoras do grupo de 57 associados, que, em 2006, completa seis anos. “Não imaginava que chegaríamos tão longe”, comemora Glória. Abastecida por 64 catadores de rua, a Coopermac trabalha independente de órgãos governamentais, e reúne mensalmente mais de 150 toneladas de lixo reciclável. As vendas chegam a um valor bruto de R$35 mil ao mês, divididos entre os “sócios”.
Existem também programas oficiais de coletas seletivas dos governos. No total, estão presentes em 257 municípios. Mas na avaliação da ambientalista Maria de Fátima Nunesmaia, ainda atuam de forma tímida. Faltam-lhes programas de educação ambiental que estejam inseridos em planos integrados de gestão de resíduos sólidos. “Fica para os catadores a maior quantidade de material recolhido. A reciclagem, no Brasil, é fruto de uma população carente e não consciente”, explica a especialista. A prefeitura tenta ampliar o número de cooperativas de reciclagem municipais existentes em Salvador. Hoje são apenas quatro, no final do ano serão dez. “Queremos criar, no mínimo, uma cooperativa para cada AR. Quando terminar a nossa gestão teremos cerca de 20 locais de reciclagem municipais”, assegura o presidente da Limpurb, Hary Alexandre Brust. Além de reciclar, as cooperativas visitam condomínios, empresas e o comércio em geral para fazer a coleta seletiva do lixo. A Limpurb calcula conseguir arrecadar mensalmente, junto com o trabalho dos catadores, cerca de 400 toneladas de lixo reciclável.
***Compostagem para orgânicos
Lixo transformado em adubo. Ainda pouco utilizada no Brasil, a compostagem poderia ser importante aliada na redução dos impactos ambientais do lixo produzido nas grandes cidades. O processo consiste na transformação de resíduos orgânicos em terra limpa, das mais férteis. Através de tratamento biológico, restos de alimentos e podas de árvores, que correspondem a 54% de todo o lixo de Salvador, passariam a ser matéria útil para a agricultura e jardinagem. Estudos da ambientalista Maria de Fátima Nunesmaia indicam que, somente com a compostagem dos resíduos de feiras livres, podas de árvores e supermercados, a quantidade de lixo na capital baiana poderia ser reduzida em 10%.
Especialistas em meio ambiente não entendem porque o processo é tão desvalorizado no país. Um dos motivos seria a fascinação pela reciclagem e coleta seletiva de lixo inorgânico. O que não justifica, já que, assim como Salvador, mais da metade do lixo brasileiro é formado por matéria orgânica. Além disso, a compostagem baratearia os custos na tentativa de redução dos resíduos. “Os ganhos seriam enormes. É muito mais barato investir em compostagem do que em coleta seletiva, por exemplo”, assegura Maria de Fátima. Trata-se exatamente do lixo mais tóxico. Devido ao chorume, líquido preto produzido no processo de decomposição, os resíduos orgânicos são os principais responsáveis pela poluição dos rios e lençóis freáticos.
A Cooperbrava, cooperativa localizada no Parque Sócioambiental de Canabrava, é um dos poucos locais que lidam com compostagem em Salvador. Em parceria com a Empresa de Limpeza Urbana de Salvador (Limpub) e com a Superintendência Municipal de Parques e Jardins (SPJ), parte da poda das árvores se transforma em adubo. “A terra é transferida para os canteiros e áreas verdes da própria cidade”, informa o presidente da Limpurb, Hary Alexandre Brust. Num país de clima quente como o Brasil, a compostagem seria ainda mais viável. O processo consiste em triturar e submeter o lixo a temperaturas entre 60o e 70o, nas quais, na presença de oxigênio, bactérias atuam de forma rápida na decomposição de toda a parte ruim do material.
***Educação independe de classe social
Flavio Novaes
É como um inimigo perverso, que deve ser exterminado imediatamente. Depois de fazer as refeições e misturar os restos dos alimentos com o material sólido, como vidro e papel, a ordem é se livrar logo do lixo, seja para aonde for. No caso das residências mais pobres, os sacos são depositados, muitas vezes a qualquer hora do dia, nas portas das casas, nos vãos das escadarias ou nas encostas, para o posterior desespero nos dias de chuva.
Nos bairros ricos, em edifícios com piscina e segurança reforçada, recipientes nas calçadas abrigam o chamado lixo rico. Hora e vez dos catadores autônomos atravessarem locais abastados da cidade como o Corredor da Vitória e deixar um rastro de destruição e sujeira, forçando os pedestres a dividirem com os carros um espaço na rua estreita.
O tratamento dado ao lixo independe da classe social quando a intenção é deixar a casa limpa. “Quando termino de almoçar, arrumo tudo e jogo o saco plástico com o lixo na esquina até porque dentro de casa não tem onde eu guardar”, diz a empregada doméstica Claudia Santos, que mora em uma casa humilde, em Coutos. Mais organizados e com espaços, os condomínios possuem áreas próprias para receber os resíduos, mas não é raro moradores depositaram sacos nos contêineres minutos depois da passagem do caminhão de lixo. Em alguns casos, os dejetos ficarão ali pelo menos por 24 horas.
Assim, áreas nobres e menos favorecidas têm tratamento diferenciado na prefeitura. As coletas na periferia, onde estão situadas as regiões mais pobres da cidade, acontecem diariamente, o que representa 64% do total. Já nas zonas mais abastadas, a coleta é alternada, dia sim dia não, ou 36% do total.
Agentes - Em uma cidade repleta de zonas de difícil acesso, com muitos becos e escadarias onde não chegam os caminhões, a solução encontrada pela Limpurb foi a de firmar convênios com as empresas terceirizadas que fazem a coleta e algumas associações de moradores. As empresas fornecem equipamento e uniforme, enquanto que a associação indica os chamados agentes solidários que recebem uma cesta básica de R$50 por semana para fazer a coleta nessas áreas. “Eles fazem também a coleta seletiva cuja renda é revertida para as próprias associações”, diz Alexandre Brust, presidente da Limpurb, que supervisiona as atividades.
Bom para a Rua do Céu, na Liberdade, referência do PAV, como é chamado o Programa de Agentes Solidários. Situada em uma baixada, recebia muito lixo e os esgotos ficavam constantemente entupidos. “Achamos que é importante colaborar com os órgãos públicos e fazer a nossa parte, afinal, nós é que vivemos aqui e não podemos morar no meio do lixo”, explica Edson Marcelino, líder comunitário na rua. Hoje o programa possui 210 agentes.
Enquanto atividades pontuais são realizadas, todos concordam que a educação é única saída viável. A Limpurb irá distribuir cinco cartilhas que serão encartadas nos cadernos de ensino fundamental da rede publica municipal. As crianças vão ter noções básicas de coleta, meio ambiente, alem de reciclagem de metais, papel e vidro.
Por: Correio da Bahia

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