Leonardo Vieceli
Folha
O uso de queimadas está associado a um tipo de produção arcaico e deve ser combatido com punição e mais informações no país, afirma o pecuarista Mauro Lúcio Costa, 59 anos, presidente da Acripará (Associação de Criadores do Pará). Para ele, atividades rurais e conservação ambiental podem andar lado a lado, ao contrário de visões que colocam o agronegócio como o vilão da crise climática. Nascido em Minas Gerais, Costa migrou para o Pará em 1982. Com o passar do tempo, ganhou evidência ao criticar o desmatamento na Amazônia e defender a produção somente em áreas já abertas, com respeito à legislação.
Em entrevista à Folha, o fazendeiro reconhece que as queimadas ameaçam a imagem do Brasil e diz que o governo federal precisa fazer sua parte, mas considera que o agronegócio também tem de “ajudar” na resolução dos problemas.
O sr. fala muito em trabalhar com “pecuária sob princípios”. Quais são eles? O que é isso?
As regras só foram criadas porque os princípios foram quebrados. A regra é respeitar uma legislação. O princípio é o estilo de vida, o lifestyle. O que entendo: quanto mais eu cuido da natureza, mais ela cuida de mim. Nossas atividades, a pecuária e a agricultura, são extremamente dependentes do clima. Então, temos de ter uma preocupação muito grande com isso. Cuidar da natureza é minimizar o impacto. Isso se chama princípio da reciprocidade.
O país vive uma forte seca com avanço de queimadas, e o agronegócio é apontado como vilão. Qual é a avaliação do sr. sobre isso?
Para todo mundo que trabalha com tecnologia, é impossível trabalhar com fogo, porque se queima tudo, as árvores, não tem condição. O fogo é uma medida arcaica. Se tem as pessoas que desmatam, com certeza tem as pessoas que usam fogo também. Agora, essas pessoas são erradas. É uma coisa que a gente precisa realmente coibir, proibir mesmo. Não tem necessidade de uso de fogo para produzir.
Como fazer?
Quem faz isso não tem responsabilidade. Uma coisa que tenho procurado muito é conversar com pequenos produtores. Por exemplo, aqui no Pará, a gente vê muitas pessoas falando que, para o pequeno, o fogo é uma questão cultural. Não tem nada de cultura. Pelo contrário: tem falta de cultura, falta de conhecimento. As pessoas queimam para plantar mandioca, essas coisas, buscando a fertilidade do solo. O pessoal queima, exaure o solo, aí tem de ir para outro pedaço de novo. Fogo é coisa do passado e tem de ser realmente combatido. Não pode.
Por quais medidas passa a resolução do problema?
Para os produtores que usam tecnologia, que melhoram a fertilidade do solo, o fogo é um inimigo. Então, é preciso ensinar isso ao máximo, disseminar isso para as pessoas. Agora, quem achar que pode fazer o que quiser, botar fogo, tem de ser punido. Aí tem de ter a punição.
Como avalia as políticas implementadas até o momento para combater os incêndios no país?
Quando tem uma crise econômica, se começa a cortar a verba, o dinheiro, para fazer essas coisas. Então, diminui muito o poder, às vezes, dos órgãos que cuidam disso. É algo que já vem acontecendo, não é de agora. Foram diminuindo orçamentos, diminuindo a condição desses órgãos. Eles não conseguem atuar numa região muito grande. A punição, o comando e controle, tem de existir. Precisamos de comando e controle. Mas nós precisávamos ter muito mais informação também. É ensinar, é mostrar para as pessoas por que [o fogo] é perigoso.
Qual é a opinião do sr. sobre a política ambiental do governo Lula? É satisfatória ou não?
Olha, não quero culpar governo, mas acho que a gente vem perdendo oportunidades. A natureza no Brasil é muito forte, muito exuberante. E, mesmo tendo isso, a gente tem terras muito férteis, topografias muito boas. Ou seja, poderíamos produzir muito mais do que produzimos hoje e cuidar do meio ambiente mais do que cuidamos hoje.
O que fazer?
A dicotomia cresceu muito, e estamos deixando de ser inteligentes. Temos de cuidar do meio ambiente, mas se coloca um discurso tolo de que a natureza é contra a produção. Não tem nada disso. Essas coisas dependem umas das outras. Andam juntas. Cuidar bem da natureza não atrapalha nada. Temos condições de cuidar melhor para produzir melhor. Falta para a gente ter uma clareza maior disso, deixar de ideologia. Isso é ciência, é pesquisa, é futuro. Não tem nada a ver com ideologia. A gente fica colocando dicotomias onde não precisa.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Uma entrevista oportuna e importante, de quem sabe o que diz. Mas quem se interessa? (C.N.)