Publicado em 26 de janeiro de 2024 por Tribuna da Internet
Catarina Storcecci
Folha
À frente da defesa do senador Sergio Moro (União Brasil-PR), o advogado Gustavo Bonini Guedes diz que haveria a criação de um “precedente perigoso” na Justiça Eleitoral caso haja a cassação do ex-juiz da Lava Jato a partir dos argumentos apresentados pelo PL e o PT.
As duas siglas entraram com uma representação no TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Paraná no final de 2022. Há a expectativa de que a Aije (ação de investigação judicial eleitoral), que pede também a inelegibilidade de Moro, possa ser julgada em fevereiro, após troca de juízes da corte.
NA PRÉ-CAMPANHA? – “Como eles não conseguiram pegar nada na campanha, eles foram criar a tese do abuso do poder econômico na pré-campanha, algo que nunca existiu antes. E o alerta que eu faço é o seguinte: criar um precedente deste na Justiça Eleitoral vai pegar mais gente lá na frente”, diz o advogado, que atua há 20 anos na área do direito eleitoral.
“Como a Justiça Eleitoral é de precedentes, de jurisprudência, isso vai refletir. Na linha do que o próprio PT quer [no caso Moro], o recente evento do Lula em São Paulo deveria entrar na conta da pré-campanha do [Guilherme] Boulos”, compara ele.
Guedes nega que tenham ocorrido gastos excessivos de Moro no período anterior à campanha eleitoral formal de 2022 e defende que haja uma análise a fundo, “gasto a gasto”, para eliminar despesas que, segundo ele, não podem ser incluídas no rol de gastos de pré-campanha pagos pelos partidos Podemos e União Brasil. “PT e PL nunca pegaram gasto a gasto. Precisa se colocar uma lupa”, diz o advogado.
FILIAÇÕES – Moro se filiou ao Podemos em 2021 de olho na disputa presidencial. Mas, perto do prazo final para trocas partidárias, em 2022, abandonou o Podemos, anunciando filiação à União Brasil que depois brecou sua candidatura ao Planalto e Moro teve de disputar o Senado.
Por isso, os partidos opositores apontam que os gastos de pré-campanha, voltados inicialmente para a disputa ao Palácio do Planalto, tornaram-se “desproporcionais” e “suprimiram as chances dos demais concorrentes” ao Senado no Paraná.
“Eu não acredito, mas, se o Moro for cassado, Moro sai da política, mas a política continua existindo. Outros adversários serão escolhidos para a batalha. Os inimigos se renovam. Se o TSE cassar o Moro, nas eleições municipais este precedente vai ser usado para cassar mais gente”, afirma Guedes.
LISTA DE ATOS – O advogado de Moro diz que há uma lista de atos que podem ser realizados pelos partidos antes da campanha oficial, sem que eles sejam identificados como propaganda eleitoral antecipada, mas não existe uma regra de “pré-campanha”.
“Quanto posso gastar, com o quê eu posso, quando é a pré-campanha. Não tem. É um vácuo legislativo. Quando se deixa para o Judiciário o preenchimento deste vácuo legislativo, às vezes as decisões não são as melhores”, diz ele, ao defender que o Congresso Nacional deveria se debruçar sobre o tema.
Segundo ele, um valor equivalente a 30% do teto da campanha estaria razoável. O parâmetro consta em um parecer feito à União Brasil pelo advogado e suplente de Moro, Luis Felipe Cunha, em conjunto com Guedes. Ele afirma ainda que o processo contra Moro pode jogar luz no tema da pré-campanha, que, a seu ver, é pouco analisado.
SOMENTE NO PARANÁ – Além disso, ele sustenta que somente podem ser considerados os gastos realizados na circunscrição da disputa (no Paraná) e que tenham atraído algum benefício eleitoral (para a candidatura ao Senado).
“O Podemos pagou uma viagem do Moro para o Nordeste para visitar a estátua do padre Cícero, acompanhado do senador [Eduardo] Girão, do Ceará. É uma viagem que importa para o eleitor daqui de Ubiratã, no Paraná?”, comenta ele.
O gasto também precisaria ter conexão eleitoral relevante. Ele exclui, por exemplo, a aquisição de veículos blindados destinados “unicamente ao transporte e segurança do filiado”. Por fim, ele também contesta despesas que aparentemente contemplam um conjunto de pré-candidatos, de forma genérica. O gasto teria que estar identificado individualmente.
SEM COMPARAÇÃO – Embora a legislação eleitoral não trate expressamente do período da “pré-campanha”, a jurisprudência aberta pelo recente “caso Selma” tem sido apontada entre aqueles que defendem a cassação de Moro. Mas, para Guedes, os casos não podem ser comparados.
“Pouca gente conhece mais este caso do que eu — atuei no caso dela — e é uma bobagem quando tentam comparar. O que mais pegou foi um empréstimo que ela fez do suplente. No caso do Moro, é 100% dinheiro dos partidos políticos, que é o que manda a legislação. Não tem dinheiro de pessoa física”, diz ele, adicionando que respeita a decisão do TSE no caso da juíza, mas que não concorda.
Por 6 votos a 1, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) cassou o mandato da Juíza Selma (Podemos-MT) no final de 2019, ao entender que houve abuso de poder econômico e também captação ilícita de recursos ligados à campanha eleitoral de 2018. A conclusão foi de que houve omissão de quantias expressivas usadas para pagar despesas de campanha no período pré-eleitoral.
###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Chega a ser comovedor o esforço que se faz para cassar Sérgio Moro. É uma situação curiosa, em que um ex-presidiário condenado por 10 juízes em três instâncias pode ser presidente da República, mas um dos juízes que o condenou não pode nem mesmo ser senador. Que República!, diria Helio Fernandes. (C.N.)