Publicado em 1 de setembro de 2022 por Tribuna da Internet
Nelson de Sá
Folha
A cobertura da morte de Mikhail Gorbatchov na Rússia, no que foi possível acompanhar nas primeiras horas, conteve-se nas críticas ao “primeiro e último presidente da União Soviética” —até ele, o cargo não existia; depois, foi a URSS que deixou de existir.
No Kommersant, um dos jornais mais respeitados, o saldo foi até positivo: “Alguns veem isso [seu governo] como a maior tragédia ou mesmo catástrofe, culpando Gorbatchov por todos os erros imagináveis e até crimes. Outros estão cientes de que, sem Gorbatchov, a Rússia moderna dificilmente teria sido possível”.
A home do tabloide russo Komsomolskaya Pravda evitou questionar: “Alguns dirão: ele nos trouxe a liberdade. Outros: ele levou nosso país. Morreu Mikhail Gorbatchov, um dos políticos mais polêmicos da história da Rússia”.
AVALIAÇÃO AMBÍGUA – O site em russo do canal de notícias RT foi pela mesma linha: “Os anos do governo de Gorbatchov foram lembrados por reformas socioeconômicas, que os contemporâneos avaliam de forma ambígua”.
O site do jornal semanal Argumenty i Fakty destacou um vídeo mais duro, sobre “Quem destruiu a URSS?”, se Gorbatchov, Boris Yeltsin ou “ambos ao mesmo tempo”.
O popular agregador de notícias do buscador Yandex reuniu links noticiosos diversos sob o enunciado simples “Mikhail Gorbatchov morreu”. E abriu uma aba só para uma declaração do deputado Alexander Iuschenko, de que “temos uma antiga tradição ortodoxa na Rússia – não falar mal dos mortos”.
LÍDER CONTROVERSO – Na China, a cobertura também foi contida, com o governo lembrando suas “contribuições positivas para a normalização das relações sino-soviéticas”. Mas Hu Xijin, ex-editor e agora colunista do Global Times, ligado ao PC, deu voz às críticas no Twitter e sobretudo no Weibo:
“Um dos líderes mundiais mais controversos, Gorbatchov foi amplamente aclamado no Ocidente por sacrificar os interesses de sua pátria. O Ocidente de fato se tornou seguro por causa dele, mas as consequências do colapso da antiga União Soviética criaram uma série de guerras, primeiro na Tchetchênia, depois na Geórgia e agora na mais brutal guerra na Europa desde a Segunda Guerra.”
Zhang Weiwei, da Universidade Fudan, também questiona seu papel, em comparação com Deng Xiao Ping, numa entrevista ao Guancha.