Felipe Frazão
Estadão
A cinco meses do início oficial da corrida eleitoral, surgem os primeiros sinais de como tende a ser a combinação entre dinheiro privado e poder público na disputa deste ano. Apesar do fundo eleitoral bilionário aprovado para irrigar as campanhas, um grupo de empresários se apresentou a representantes do agronegócio e pediu contribuições para ajudar na reeleição do presidente Jair Bolsonaro.
O grupo dizia falar em nome de Valdemar Costa Neto, presidente do PL, partido de Bolsonaro, e do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), que é um dos coordenadores da campanha do pai.
CONSTRANGIMENTO – Apesar da simpatia de boa parte dos empresários do campo pela reeleição de Bolsonaro, a maioria dos abordados se sentiu constrangida com a forma como os pedidos chegaram e fez com que esse sentimento fosse transmitido a seus interlocutores no Palácio do Planalto.
Ficaram especialmente apreensivos com as menções a Costa Neto e Flávio Bolsonaro. O presidente do PL foi condenado e preso por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no mensalão, primeiro grande escândalo de corrupção da era PT. E o filho do presidente é investigado pela suspeita de se apropriar de salários de funcionários do gabinete quando era deputado estadual.
Os queixosos não gostaram de ver esses políticos envolvidos na arrecadação de dinheiro. A abordagem pela doação está registrada em mensagens trocadas num grupo de WhatsApp, ao qual o Estadão teve acesso.
GRUPO DE WHATSAPP – Os primeiros pedidos, feitos de forma mais incisiva, partiram de Bruno Scheid, administrador de fazenda de gado em Ji-Paraná (RO). Também atuaram o pecuarista Adriano Caruso, de São José do Rio Preto (SP), filiado ao PL, e Cuiabano Lima, locutor de rodeios e secretário de Turismo de Barretos (SP).
Os três não eram estranhos no grupo de WhatsApp. Todos ali se conheciam por causa de movimentos pró-Bolsonaro desde o ano passado. Recém-filiado ao PL, Scheid gosta de exibir sua proximidade com a família do presidente. Nas redes sociais, posta fotos com Flávio e o vereador do Rio Carlos Bolsonaro (Republicanos). Em fevereiro, viajou com a comitiva no avião presidencial de Brasília a Porto Velho (RO).
As trocas de mensagens ocorreram entre os dias 5 e 21 de fevereiro deste ano. No grupo de WhatsApp estavam pecuaristas de Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Pará, Tocantins, Acre, Rondônia e São Paulo. A maioria defendeu a candidatura de Bolsonaro em 2018 e mantém o apoio.
REUNIÃO COM BOLSONARO – Na abordagem pelo WhatsApp, os arrecadadores propagaram um possível encontro de ruralistas com Bolsonaro, no início deste mês, para tratar de assuntos do setor. A reunião estaria sendo articulada pela Presidência. Os ruralistas dispostos a contribuir com a campanha seriam convidados para um evento no mesmo dia em Brasília, com a presença de Costa Neto e de Flávio.
Ex-presidente da Aprosoja-RO e um dos principais líderes rurais de Rondônia, Valdir Masutti Júnior, o Juca Masutti, disse que chegou a ser procurado por Scheid para discutir um encontro, sem dar detalhes. “Ele me falou que iria falar com Bolsonaro. Perguntei: ‘Falar o quê? Você não vai sair de Rondônia sem uma pauta do setor’, eu disse. E ele não me procurou mais”, relatou. “Eu dei uma cortada. Sou objetivo.”
SEM LIDERANÇA – Secretário de Agricultura de Rondônia e presidente regional do PSL, Evandro Padovani também afirmou que Scheid não representa o setor na Região Norte. “Essa pessoa (Scheid) administra uma fazenda de um proprietário da Itália. Estou há 22 anos em Rondônia, e o desconheço como líder ruralista.”
Na campanha de 2018, o agronegócio, especialmente os médios produtores, apoiou Bolsonaro. Não houve, porém, coleta nacional de recursos nem centralização da busca de dinheiro. Os ruralistas promoveram – de forma isolada, e regional – churrascos, carreatas e comícios.
A conjuntura política agora é outra. Bolsonaro não é mais um nome novo, encara uma corrida dura com o ex-presidente Lula (PT) e fechou alianças com a chamada velha política. Seu comitê de campanha quer uma estrutura profissional. O PL se prepara até para lançar um site destinado a doações.
CONFIRMAÇÃO – De uma família tradicional na criação de gado originária de Maringá, o produtor rural João Delorenzo Neto, hoje em Mato Grosso do Sul, confirmou que houve uma tentativa de levantar fundos para a campanha de Bolsonaro. Mas não entrou em detalhes. Ele se disse a favor de uma articulação, mas “se forem pessoas sérias e comprometidas”.
Já o ex-prefeito de Água Boa (MT) Maurício Tonhá, presidente da Estância Bahia Leilões, admitiu que existe uma expectativa de contribuição por parte de empresários do agronegócio e que pretende ajudar a atrair futuros doadores. Negou, no entanto, ter sido procurado, agora, para arrecadação de recursos.
“Vou pedir sem nenhuma cerimônia. ‘Fulano, você já ajudou? Toma jeito, rapaz’. Alguns vão ficar em cima do muro, e 90% vão doar”, disse Tonhá.
CONTRADIÇÕES – Ao Estadão, o empresário Bruno Scheid negou ter participação ativa na organização da pré-campanha de Bolsonaro com o agronegócio e na estratégia de arrecadação. “Não procede”, afirmou o empresário. Ele também negou ter se filiado ao PL ou a intenção de disputar um mandato de deputado. O próprio Scheid, porém, já havia divulgado sua filiação, abonada por Costa Neto.
O locutor Cuiabano Lima, frequentador do Palácio do Planalto, não respondeu aos contatos da reportagem. Lima atua como agente de Bolsonaro no agro, além de ser garoto-propaganda de estatais, como a Caixa Econômica Federal.
Na semana passada, em cerimônia oficial da Presidência, pediu voto pela reeleição: “Põe no 22 aí”, declarou, ao lado do presidente.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Está claro que Bolsonaro nada tem a ver com isso. Quanto a Valdemar Costa Neto, realmente o dono do PL é bem capaz de estar até envolvido. Sabe-se que Costa Neto de fato é capaz de tudo, conforme a ex-mulher dele, Maria Christina Mendes Caldeira, denunciou publicamente, diversas vezes. Mesmo assim, Bolsonaro resolveu se unir a ele. Então, que sejam felizes para sempre. (C.N.)