Depois de uma rodada de negociações de paz entre Rússia e Ucrânia nesta terça-feira (29/3), o vice-ministro russo da Defesa, Alexander Fomin, disse que, em um esforço para "aumentar a confiança mútua", seu país iria reduzir "drasticamente" as operações de combate perto da capital ucraniana, Kiev, e de Chernigov, cidade no norte da Ucrânia.
Por Alessandra Corrêa
O governo turco, que recebeu as delegações da Rússia e da Ucrânia, disse que o resultado desta terça representa o progresso mais significativo desde o início da guerra, em fevereiro. Mas, apesar dos sinais positivos, autoridades dos Estados Unidos e do Reino Unido reagiram com cautela.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, disse que não vai tirar conclusões antes de ver as ações da Rússia. "Veremos se irão fazer o que estão sugerindo", afirmou.
O secretário de Estado americano, Antony Blinken, disse ainda não ter visto "sinais de seriedade" por parte da Rússia sobre buscar a paz.
"Existe o que a Rússia diz e existe o que a Rússia faz. Estamos focados neste último", disse Blinken em entrevista coletiva durante visita ao Marrocos. "E o que a Rússia está fazendo é a contínua brutalização da Ucrânia e de sua população, que continua enquanto falamos."
Um porta-voz do primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, disse que a Grã-Bretanha quer que as forças russas deixem completamente a Ucrânia. "Julgaremos Putin e seu regime por suas ações, não por suas palavras", afirmou o porta-voz.
Em entrevista à agência russa de notícias TASS, o chefe da delegação russa, Vladimir Medinsky, disse que as negociações foram "construtivas", mas esclareceu que a promessa de reduzir atividade militar ainda não significa um cessar-fogo imediato.
"Isso não é um cessar-fogo, mas esse é nosso desejo, gradualmente atingir uma desescalada do conflito pelo menos nessa frente", disse Medinsky.
Entre os temas tratados nas negociações está a neutralidade da Ucrânia, que seria protegida por garantias de segurança de um grupo de dez países, entre os quais os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (Rússia, Estados Unidos, Reino Unido, França e China). '
A Ucrânia desistiria de aderir à Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e se comprometeria em não colocar em seu território armas de destruição em massa, tropas estrangeiras ou bases militares internacionais.
Também foi discutido o futuro da Crimeia, península ucraniana anexada pela Rússia em 2014 sob oposição da Ucrânia e de países ocidentais. A proposta seria a de uma "pausa por 15 anos", período no qual seriam conduzidas negociações bilaterais sobre o status da Crimeia, sem hostilidades militares.
Foi também discutida a possibilidade de um encontro entre os presidentes da Rússia, Vladimir Putin, e da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. Segundo o governo turco, o próximo passo envolveria negociações entre os ministros do Exterior de ambos os países, que fariam ajustes finais sobre questões mais complexas.
Depois que os pontos para um acordo fossem moldados e aprovados pelos ministros, um encontro entre os dois presidentes poderia ocorrer.
Segundo o governo ucraniano, qualquer acordo teria de passar por referendo e ser ratificado pelos parlamentos dos países que vão oferecer garantias de segurança.
Durante o encontro na Turquia, o governo russo disse ainda que a Ucrânia deve seguir a Convenção de Genebra em relação ao tratamento de prisioneiros de guerra russos. Houve denúncias de abusos cometidos pelo Exército ucraniano.
"Acho que há algum progresso, mas não estou muito otimista", diz à BBC News Brasil o cientista político Eugene Finkel, professor da Universidade Johns Hopkins. "Mesmo que os russos estejam negociando de boa fé, as questões que permanecem sem solução têm importância enorme."
Entre essas questões, Finkel destaca o futuro dos territórios ucranianos ocupados pela Rússia, não apenas a Crimeia, mas também Donbas [onde estão localizadas as regiões separatistas de Donetsk e Luhansk], que o governo russo não reconhece como parte da Ucrânia.
"Pelo que ouvimos hoje, o melhor cenário é o congelamento do conflito como está por 15 anos", ressalta Finkel. "E não acredito que a maioria da população ucraniana irá apoiar (esse plano)."
Finkel também destaca entre as grandes questões sem solução as sanções de vários países contra a Rússia. "Não vejo as sanções sendo levantadas quando o conflito ficar congelado", observa.
BBC Brasil