Ministros da Educação do governo Bolsonaro.
O FNDE está sob comando do PP, que sustenta o presidente
Mais um capítulo do show de horrores em que se transformou o Ministério da Educação terminou com o pedido de demissão de Milton Ribeiro, o terceiro a ocupar a pasta em pouco mais de três anos de governo Bolsonaro. Como ocorreu na Saúde, que seguia a orientação oficial de denegrir as vacinas, enquanto um esquema paralelo de atravessadores tentava obtê-las com lucro, agora surgiram pastores picaretas vendendo influência para intermediar verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Como os três ocupantes do ministério até agora foram péssimos, aguarda-se com justificado temor, a nomeação de um substituto, que deverá seguir o mesmo padrão de ignorância e preconceito que o presidente da República implantou em área vital para o desenvolvimento cultural, social e econômico do país.
A ideologia reacionária do governo e seu apoio em algumas seitas evangélicas não conseguiram esconder que há dinheiro corrente por trás de tão severos princípios. O presidente Jair Bolsonaro, depois que surgiram as suspeitas sobre vendilhões agindo no templo ministerial, chegou a exagerar no dito e dizer que “colocaria a cabeça no fogo” pelo pastor Ribeiro. Deve ter tido um diálogo breve com sua assessoria do Centrão, que lhe esclareceu sucintamente que não daria, em plena campanha eleitoral, e em um momento em que o presidente começava a recuperar parte do apoio perdido, para sair por aí propagando que não há corrupção em seu governo. Então, Bolsonaro, com a cabeça ilesa, partiu para outra - foi demitir o presidente da Petrobras, Joaquim Silva e Luna.
Quando o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira, do PP, disse que a permanência de Ribeiro não estava assegurada, antes dos pedidos de inquérito feitos pela Procuradoria Geral da República, o destino de Ribeiro estava selado. Nas duas demissões ocorridas na segunda - uma a pedidos, outra não - se vê a ação da cúpula do governo de limpar o terreno eleitoral para alavancar as chances de Bolsonaro, que aumentaram um pouco. Assim como corrupção tira votos, o aumento dos combustíveis retira dinheiro do bolso dos contribuintes e sufrágios do candidato.
Assim como se passou na Saúde e no Ambiente, na Educação o descaso planejado do governo destruiu as capacidades operacionais públicas, sem colocar nada no lugar. Bolsonaro, que pouco governa, se safa de suas responsabilidades com relativo sucesso até agora. A CPI da Covid acusou o presidente de não ter agido para deter os atravessadores de vacinas, mesmo depois de avisado pessoalmente por um deputado. Mas um responsável pelo inquérito concluiu que não está entre as funções do presidente da República denunciar falcatruas em seu próprio governo. É absurdo, mas se entende.
Sobre o escândalo dos pastores que vendiam facilidades a peso de ouro, Ribeiro não desmentiu as denúncias, só um trecho de fala sua cuja gravação foi obtida pela Folha de S. Paulo, em que disse que os pedidos dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura deveriam ser atendidos por indicação de Jair Bolsonaro. Ribeiro encaminhou denúncias a respeito à CGU em agosto, mas continuou se reunindo com eles depois disso, um habeas corpus preventivo.
No ministério, Ribeiro foi só menos estridente que Ricardo Vélez Rodriguez e menos boquirroto que o inacreditável Abraham Weintraub, seus antecessores. Discretamente, porém, disse barbaridades à vontade, entre elas sobre o papel da educação sobre a sexualidade (para ele, nenhum, fora a repressão) e ganhou um inquérito contra si por homofobia. Como os outros, nada fez em prol da educação. Não moveu uma palha para coordenar o setor durante a grave pandemia, que deixou as escolas brasileiras por mais tempo paradas do que qualquer país relevante do planeta. Gastou a maior parte do tempo sem fazer nada de relevante, ciceroneando ávidos comerciantes de bíblias.
Mas há algo intrigante, que enseja desdobramentos. Ribeiro está certo ao dizer que os repasses são determinados pelo FNDE. Este é um feudo do PP, do ministro Ciro Nogueira. O fundo é dirigido por seu ex-chefe de gabinete, Marcelo Lopes da Ponte. Mais de R$ 1 bilhão hoje, e de R$ 5 bilhões em 2021, compuseram verbas discricionárias, as que atraíram a cobiça de finórios. Ribeiro foi o mestre de cerimônias de dois pastores, não tinha a chave do cofre. É possível que haja mais gente envolvida no trânsito bíblico de recursos públicos para bolsos particulares.
Valor Econômico