Novas medidas, se vierem, dependem de um inexistente espaço no teto de gastos
O rumo da inflação no Brasil depende em grande parte do rumo dos preços do petróleo. O presidente Jair Bolsonaro, cujos instintos intervencionistas são conhecidos, está mais preocupado do que nunca neste momento com isso, porque pode arruinar sua campanha pela reeleição. Tema sensível para a economia em geral e para a população de menor renda, em particular, dados seus impactos nos preços dos alimentos, do gás e do transporte, o tema tem sido tratado pelo governo com uma mistura de inércia e palanque eleitoral.
É impossível discernir uma tendência no curto prazo para as cotações do petróleo, exceto a de grande volatilidade. Depois do susto dos preços encostarem nos US$ 140 por barril logo após a invasão da Ucrânia pela Rússia, eles recuaram por algum momento um pouco abaixo de US$ 100, para retomar uma trajetória altista, fechando ao redor de US$ 115 na sexta-feira. Bolsonaro, ao primeiro sinal de alívio, cobrou redução nos preços praticados pela Petrobras, esquecendo-se de que, para os grandes aumentos anunciados recentemente, a estatal esperou 57 dias.
Há fatores que podem contribuir para uma escalada dos preços, com alguma permanência a médio prazo, e outros que, no curto prazo, podem fazer a diferença. O desfecho da guerra não é claro, mas o que parece certo é que as sanções contra Vladimir Putin não deixarão o cenário logo, pelos estragos que a Rússia fez no mercado de commodities - um mal grande, mas menor - e, mais importante, pela sacudida que deu no mapa geopolítico europeu e global. O autocrata russo perdeu a confiança de quase todos (a China é uma enorme exceção) ao ferir os princípios da governança global e invadir um país soberano.
A transição energética, por outro lado, já vinha sofrendo percalços diante de uma escalada, antes da guerra, dos preços do petróleo, provocada, entre outros motivos, pela redução dos investimentos em exploração, ele próprio influenciado pela necessidade de reduzir as emissões de combustíveis fósseis, uma meta global. Isto é, a tendência de preços já era de elevação.
Por outro lado, o Brasil, desde 2016, é um exportador líquido de petróleo e grande vendedor de boa parte das commodities que estão com as cotações em alta. Com isso, felizmente, a gangorra entre o dólar e commodities voltou ao normal, depois de ter sido quebrada pelas peripécias fiscais do governo, e a moeda americana exibe agora boa, ainda que provisória, desvalorização.
O real foi uma das moedas emergentes que mais perdeu valor entre meados de 2020 e o fim de 2021, e agora, em 2022, é uma das que mais se valoriza. A valorização vem em um momento crucial, ao atenuar a inflação importada no momento em que o IPCA aproxima-se dos 11%. Na última reunião do Copom, o cenário alternativo para as cotações do petróleo foram determinantes para a decisão preliminar do Banco Central de encerrar o ciclo de alta de juros na próxima reunião, elevando a Selic a 12,75%.
Mas não só as cotações do petróleo e do câmbio são instáveis - a política oficial sobre preços dos combustíveis também é. Bolsonaro, que se exime de todas as culpas, acredita que, diante de um choque da magnitude causada pelo maior conflito em solo europeu desde a Segunda Guerra, a culpa pelos aumentos de diesel, gás de cozinha e gasolina é do presidente da Petrobras, Joaquim Silva e Luna. O governo bate cabeças há três anos sobre o assunto. O ministro da Economia, Paulo Guedes, sugeriu ao primeiro presidente da estatal no governo Bolsonaro, Roberto Castello Branco, que adotasse uma média móvel de 100 dias para suavizar as variações dos preços internacionais ao mercado doméstico. O fato de o ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque, não haver liderado em tempos de paz uma discussão sobre esse tema é motivo de reclamações de Guedes nos bastidores do governo.
Ao sabor das pesquisas eleitorais, a máquina de soluções ruins do governo está a plena carga. A mudanças feitas pelo Congresso não reduzirão os preços, apenas o atenuarão. Subsídios à gasolina ou aumento do Auxílio Brasil dependem de um inexistente espaço no teto de gastos - houve agora bloqueio de R$ 1,7 bilhão em despesas discricionárias.
Se for o caso de adotar medidas adicionais será necessário recorrer a alguma solução amarga ou uma nova gambiarra no arcabouço fiscal. Nos bastidores, discute-se se seria o caso de editar um crédito extraordinário. O governo continua inquieto sobre o assunto, sinal de que o pior ainda está por vir.
Valor Econômico