Carlos Newton
Enviado pelo jornalista Marcelo Auler, ex-diretor da Associação Brasileira de Imprensa, esse artigo foi publicado recentemente no blog de Cláudio Fonteles, ex-procurador-geral da República, e merece ser divulgado a todos os que se interessam pelos destinos deste país.
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E O QUE FAZ O PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA??
Cláudio Fonteles
“Quem decide se o povo vai viver em uma democracia ou ditadura são as Forças Armadas. Não tem ditadura onde as Forças Armadas não a apoiam” – são palavras de Jair Messias Bolsonaro, ditas no dia 18 de janeiro do ano em curso.
São palavras gravíssimas. Primeiro, porque enunciadas por quem preside a República Federativa do Brasil, definida como Estado Democrático de Direito e fundamentada na: soberania; na cidadania; na dignidade da pessoa humana; nos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e no pluralismo político.
MISSÃO MILITAR – Segundo, porque a missão das Forças Armadas, também definida em nossa Carta Constitucional, não é de julgar coisa alguma; não é de decidir nada de natureza política – tomado o termo política, aqui, como a significar a condução dos assuntos pertinentes ao interesse social e ao bem comum -; não é de imiscuir-se em assuntos que não os que, estrita e textualmente, postos no artigo 142 da Constituição Federal.
“Artigo 142: As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais, permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.
Portanto, nas atribuições de “defesa da Pátria, garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”, lugar não há para que se tenha as Forças Armadas como juízes a decidir sobre a forma de governo: democracia ou ditadura.
Aliás, apresentando Jair Messias Bolsonaro a ditadura como opção a ser considerada, no mesmo patamar da democracia, sem a menor dúvida expõe a lesão o regime representativo e democrático.
LEI DE SEGURANÇA NACIONAL – Essa sua conduta tipifica-se, criminalmente, no âmbito da Lei nº 7170/1983 que, justamente, foi promulgada para descrever as condutas delituosas “que lesam ou expõe a perigo de lesão o regime representativo e democrático, a Federação, e o Estado de Direito (artigo 1º da Lei nº 7170/83, grifei).
E, dentre as condutas elencadas e definidas como crime está a de: “incitar à subversão da ordem pública e social”. (artigo 23, inciso I, da Lei nº 7170/83.
Ora, Jair Messias Bolsonaro, como presidente da República, em pronunciamento público que faz, propagando o que propaga – as Forças Armadas como juiz único sobre a forma de governo do Brasil: se democracia ou ditadura -, claramente motiva, incita seus correligionários – como aliás já o fez em fatos sob apuração em sede de inquérito judicial em tramitação no Supremo Tribunal Federal sobre comportamentos antidemocráticos – a indisporem-se contra o regime representativo e democrático.
DIZ A CONSTITUIÇÃO – O artigo 127 da Constituição Federal é textual no dizer que o Ministério Público, instituição permanente, tem sua razão de ser, o porquê de sua existência na “defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”.
E o que faz o procurador geral da República, Augusto Aras, ante essa situação gravíssima? Nada!
Cabe, para finalizar, a transcrição de sábia advertência que o Papa Francisco faz a propósito do “Fim da Consciência Histórica”:
“São as novas formas de colonização cultural. Não nos esqueçamos de que os povos que alienam a sua tradição e – por mania imitativa, violência imposta, imperdoável negligência ou apatia – toleram que se lhes roube a alma, perdem, juntamente com a própria fisionomia espiritual, a sua consistência moral e, por fim, a independência ideológica, econômica e política”. Uma maneira eficaz de dissolver a consciência histórica, o pensamento crítico, o empenho pela justiça é esvaziar de sentido ou manipular as “grandes palavras”. Que significado têm hoje palavras como “democracia”, “liberdade”, “justiça”, “unidade”? Foram manipuladas e desfiguradas para serem utilizadas como instrumentos de domínio, como títulos vazios de conteúdo que podem servir para justificar qualquer ação”. (Carta Encíclica Fratelli Tutti – nº 14 – pg. 17/18 – edições CNBB).