Posted on by Tribuna da Internet
Carlos Newton
Foi decepcionante a decisão do ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, ao determinar que a delação premiada do ex-governador Sérgio Cabral, assinada com a Polícia Federal, não deve beneficiá-lo nas ações penais nas quais ele já foi condenado a um total de 282 anos de prisão, o que na prática pode inviabilizar o prosseguimento do acordo de colaboração entre o réu e a PF.
A grande dúvida é a seguinte: sem contar com quaisquer benefícios concretos, pois a delação só terá efeitos nos processos que a Justiça vier a abrir a partir das novas denúncias, qual será o interesse que moverá Sérgio Cabral a fazer novos depoimentos?
ALTAS AUTORIDADES – Como se sabe, a delação assinada com a Polícia Federal possibilita investigações envolvendo altas e altíssimas autoridades, todas com foro privilegiado, algumas delas já respondendo a inquéritos que já tramitam em foro privilegiado.
A delação de Sérgio Cabral é considerada altamente explosiva e tem potencial para detonar grande número de juízes, desembargadores, procuradores e ministros de tribunais superiores.
Segundo reportagem de Aguirre Talento em O Globo, por enquanto são duas dezenas de anexos. Mas os depoimentos do ex-governador, se prosseguirem, devem provocar a abertura de pelo menos 80 anexos.
FACHIN ERROU – Tenho muito respeito pelo ministro Edson Fachin, que está fazendo um trabalho admirável na Lava Jato. No entanto, como a máxima vênia, como dizem os advogados, peço licença para discordar de sua decisão, cujo efeito mais prático será “blindar” essa série de altas e altíssimas autoridades, evitando um dos maiores escândalos da História Republicana.
É voz corrente no Rio de Janeiro que o esquema de Cabral envolvia importantes membros do Judiciário e do Ministério Público Estadual, como o ex-procurador-geral Cláudio Lopes, que chegou a ser preso em 2018 e agora é réu por crimes de formação de quadrilha, corrupção e quebra de sigilo funcional.
Portanto, a decisão mais acertada de Fachin seria condicionar aos resultados da delação os benefícios a serem concedidos a Cabral, diante da inequívoca importância do teor de suas denúncias, ao invés de desestimular o delator, ao lhe tirar a perspectiva de obter qualquer resultado satisfatório na redução de sua pena.
CABRAL DEU EXEMPLO – Em seus primeiros depoimentos, Cabral deu exemplo de até onde sua delação pode chegar. Para começar, destruiu o próprio casamento, ao denunciar a própria mulher, Andriana Ancelmo, afirmando que ela não apenas sabia do esquema de corrupção, como participava ativamente, transformando seu escritório de advocacia num centro de lavagem de dinheiro.
Espera-se que Cabral não esmoreça com a decisão de Fachin e siga em frente em sua delação, na esperança de que mais na frente, em função da gravidade de suas denúncias, possa haver real benefício carcerário. Que a meu ver seria mais do que justo, se o ex-governador realmente desmascarar esses bandidos de toga, como diz a ministra aposentada Eliana Calmon, ex-corregedora nacional de Justiça.
###
P.S. – Sinto-me pessoalmente ofendido quando algum comentarista diz que estou defendendo Patricia Campos Mello por “corporativismo”. Tenho desprezo por essa prática. Para mim, quem demonstra “espírito de corpo”, na verdade exibe também “espírito de porco”. A piada é velha, mas se aplica perfeitamente a essa decisão do ministro Fachin, eivada de um corporativismo inaceitável. (C.N.)
P.S. – Sinto-me pessoalmente ofendido quando algum comentarista diz que estou defendendo Patricia Campos Mello por “corporativismo”. Tenho desprezo por essa prática. Para mim, quem demonstra “espírito de corpo”, na verdade exibe também “espírito de porco”. A piada é velha, mas se aplica perfeitamente a essa decisão do ministro Fachin, eivada de um corporativismo inaceitável. (C.N.)