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sábado, junho 04, 2016

Carta aberta de Jorge Béja a Luiz Fux e Luís Roberto Barroso, ministros do Supremo

Carta aberta de Jorge Béja a Luiz Fux e Luís Roberto Barroso, ministros do Supremo

Ministro Luiz Fux
Senhores Ministros.
Selecionei Vossas Excelências, ministros Luiz Fux e Luís Roberto Barroso para lhes endereçar esta carta, porque nos conhecemos. Quando juiz titular da 9ª Vara Cível da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, por quase uma década tratei com o Dr. Luiz Fux em razão de processos que sob sua presidência patrocinei. E o tratamento entre advogado e juiz foi marcadamente cordial, isento e sem a menor intimidade do advogado com o magistrado. O respeito e a admiração eram – e continuam sendo – recíprocos. E com o Dr. Luís Roberto Barroso em razão de pleito indenizatório do qual fui defensor da família da vítima que morreu por causa do “tabagismo pesado”, conforme atestado pelo médico-perito, e o então advogado Luís Roberto Barroso foi o defensor da empresa Souza Cruz, fabricante de cigarros, contra quem o processo foi aberto.
Como não poderia deixar de ser, petições, debates orais e diálogos que mantivemos enquanto durou o processo sempre foram de elevado nível e da mais fina educação.
MOTIVO DA CARTA
O objetivo desta carta é merecer dos senhores ministros uma explicação de interesse coletivo e nacional. A Constituição Federal proclama o chamado princípio da legalidade no artigo 5º, item II com esta redação “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei”. Daí se conclui que todos os atos e fatos da vida dos brasileiros, sejam autoridades ou não, governantes e governados, devem ser norteados pela lei, que diz o que pode e o que não pode, o que é certo e o que é errado.
Esta introdução se justifica porque o senhor ministro-presidente do Supremo Tribunal Federal, de forma pública e solene, assinou termo em que assume o comando, a presidência do processo de impeachment nesta segunda fase em curso no Senado Federal.
Ministro Luís Roberto Barroso
INSTÂNCIA RECURSAL INDIVIDUAL
O Excelentíssimo Ministro Ricardo Lewandowski passou a ser então, individual e solitariamente, a instância recursal, derradeira, única, definitiva e absoluta, para decidir os recursos apresentados pelas partes (acusação e defesa), por partidos políticos e senadores e referentes ao processo do impeachment nesta etapa final no Senado Federal.
Já se tem notícia da apresentação de quatro recursos contra decisões tomadas pela Comissão Especial formada pelo senadores. Um deles refere-se à redução do prazo para as alegações finais. E tais recursos e todos os demais que virão, são etiquetados e denominados como se fossem “recurso ao Supremo”, mas que na verdade não são, pois são recursos ao ministro-presidente Ricardo Lewandowski,
UM SUPER E SURPREENDENTE PODER
É aí que reside a incompreensão. A Constituição Federal, as leis e o Regimento Interno do STF não delegam ao presidente da Suprema Corte este super e surpreendente poder absoluto e derradeiro de decidir sozinho recurso(s) dirigido(s) à Corte e originados do processo de Impeachment no Senado. O Regimento Interno do STF, atualizado até Setembro de 2015 e em vigor, por força da Emenda Regimental 49 e da Resolução 514/2013, ao dispor nos artigos 5º, 6º e 7º sobre a competência do plenário e as atribuições do presidente, não consta a outorga para, em nome dos demais 10 outros ministros da Corte, o presidente do STF decidir sozinho recurso que lhe chegue às mãos, menos ainda oriundo do processo de impeachment contra o presidente da República. Tem lá no artigo 13, item VII, a prerrogativa do presidente do STF de “decidir questões de ordem ou submetê-las ao Tribunal quando entender necessário”. Mas “questão de ordem”, ministro Fux e ministro Barroso, não são recursos vindos de fora, e sim arguições levantadas nos autos e em função de um recurso interposto e em tramitação na Corte. E nem diz respeito a processo de impeachment do chefe da Nação.
A LEI DO IMPEACHMENT
A denominada “Lei do Impeachment”, a de nº 1.079, de 1950, mesmo após a “filtragem” que o STF nela fez recentemente, adaptando-a à Constituição de 1988, não confere ao presidente do Supremo Tribunal Federal o poder de receber e decidir recurso interposto em função do processo de impedimento do presidente da República.
Diz a lei que recebido pelo Senado e vindo da Câmara dos Deputados, o processo será enviado ao presidente do STF, com a comunicação do dia designado para o julgamento (artigo 24, parágrafo único). E no dia marcado para o julgamento o presidente do Supremo abrirá a sessão, mandará ler o processo e passa a inquirir as testemunhas (artigo 27) e após, findos os debates orais, o presidente do STF fará o relatório resumido da denúncia e das provas da acusação e da defesa e submeterá à votação nominal dos senadores o julgamento (artigo 33) e a resolução que sobrevier constará de sentença a ser lavrada pelo presidente do STF, assinada pelos senadores e publicada no Diário Oficial e no Diário do Congresso Nacional (artigo 35).
Ou seja, a função do presidente do STF é o de presidir a sessão final de julgamento. E sem a prerrogativa e o poder de decidir recurso. Em outras palavras, sem poder jurisdicional. Sem o poder de dizer o Direito. É uma distinção, uma honraria, que a lei presta a quem ocupa a presidência da Suprema Corte. Nada mais que isso, visto que os três poderes da República antes de serem harmônicos, são independentes.
AS QUATRO INDAGAÇÕES
Permitam os senhores ministros Luiz Fux e Luís Roberto Barroso indagar:
1) qual a lei, ou mesmo o Regimento Interno, que deu suporte jurídico-legal a conferir ao ministro-presidente do STF, Ricardo Lewandowski, a faculdade, a prerrogativa e o poder de, em nome do STF, que é um tribunal colegiado, presidir desde logo esta fase do processo de Impeachment no Senado e decidir, só e individualmente, os recursos apresentados em decorrência do processo de Impeachment?
2) Na hipótese de ter sido assim convencionado pelos ministros do STF, existe lei e/ou regimento que disponha nesse sentido autorizativo e que empreste legalidade a tal convenção?
3) Os recursos apresentados e decididos pelo ministro Lewandowski  são irrecorríveis e têm o valor e peso como se tivessem sido apreciados e julgados pelo plenário da Corte, ou por uma de suas turmas? Ou das decisões ainda cabe recurso para o plenário do STF?
4) No julgamento da ADPF 378, da autoria do PCdoB, decidida e votada pelo plenário do STF, consta esta previsão de se conferir ao presidente da Corte a prerrogativa e o poder de assumir a presidência do processo de impeachment no Senado, antes mesmo do momento previsto na Lei 1079/50, e decidir sozinho os recursos em nome do Supremo?
PARTE FINAL DA CARTA
Creiam Vossas Excelências que as respostas serão de suma importância e do interesse de todo o povo brasileiro, haja vista a defesa do princípio da legalidade, da defesa da Constituição Federal, das leis, da segurança jurídica, do aperfeiçoamento da democracia e da defesa do Estado de Direito.
De Vossas Excelências,
Jorge Béja
(Advogado no Rio de Janeiro)

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