De acordo com a Paraná Pesquisas, 58% dos curitibanos já reduziram despesas, riscando itens do orçamento ou optando por marcas mais baratas
Publicado em 26/04/2011 | Cristina RiosA alta da inflação e da taxa de juros começa a surtir efeito no orçamento da população. A maioria dos moradores de Curitiba já cortou gastos e compras por causa do cenário econômico. Levantamento da Paraná Pesquisas realizado com exclusividade para a Gazeta do Povo mostra que 58% dos consumidores reduziram seu consumo desde o início do ano e 60% pretendem fazê-lo nos próximos meses. A imensa maioria dos entrevistados – 93% – afirma que sentiu os efeitos da inflação e 78%, do aumento dos juros.
Com os reajustes dos preços dos alimentos e de outras despesas, como aluguel, combustível, água e educação, a maioria dos entrevistados disse que está cortando itens do orçamento e trocando marcas mais caras por outras mais baratas.
“Com a inflação ‘bombando’, o consumidor começa a ter mais precaução, contendo despesas e evitando novos gastos. O que é uma medida saudável”, lembra o consultor em finanças pessoais Raphael Cordeiro.
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Crédito
Maioria quer evitar parcelamento
A sondagem da Paraná Pesquisas mostra que o consumidor está mais cauteloso em relação aos financiamentos, principalmente depois das medidas macroprudenciais adotadas pelo governo para contornar a inflação.
Além de aumentar a taxa de juros – hoje em 12% – por três vezes neste ano, o governo tem tomado, desde o fim do ano passado, uma série de medidas para esfriar a economia e, por tabela, tentar conter a alta dos preços. Em dezembro de 2010, aumentou o depósito compulsório – dinheiro que os bancos precisam deixar no Banco Central – e limitou as condições de crédito para financiamento de automóveis, por exemplo. Em abril, voltou a mexer diretamente no consumo, com o aumento do IOF sobre as compras no exterior e financiamentos no mercado interno.
Do total de entrevistados, 64% disseram que pretendem deixar de fazer novas compras parceladas depois que o governo dobrou o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), para 3%. Se a intenção se confirmar, trata-se de uma mudança importante no comportamento do crédito no país. Nos últimos 12 meses, o crédito cresceu 21%, acima do que o Banco Central considera o ideal – 15% – para não gerar novas pressões inflacionárias. Entre os entrevistados, porém, a maioria (65%) afirmou que não tem financiamento. Entre os 35% que têm dívidas, a maioria contratou prazos acima de seis meses para pagamento.
Enganando o dragão
Veja abaixo dicas de especialistas para enfrentar a alta dos preços e das taxas de juros:
Seja prudente
Especialistas dizem que os tempos de inflação alta devem ser de cautela, principalmente se o consumidor já compromete boa parte do orçamento com dívidas. Nesse caso, qualquer alta de preços pode levar as contas para o vermelho. O ideal é não comprometer mais do que 30% da renda com financiamentos.
Evite
Se você tem dívidas, procure não fazer novos empréstimos para não comprometer ainda mais o orçamento. O crédito já está mais caro, por causa da alta dos juros e das medidas do governo para esfriar o consumo. Troque dívidas mais caras, como a do cartão de crédito, por mais baratas, como a do consignado, por exemplo.
Priorize
Estabeleça prioridades. Gaste somente o necessário. Troque marcas mais caras por mais baratas, pesquise preços e aproveite promoções. Avalie seus gastos, mas não sacrifique demais seu padrão de vida .
Economize
Procure fazer uma reserva financeira para emergências.
Para o economista Cid Cordeiro, analista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o fato de a alta dos preços estar bastante concentrada nos alimentos e em alguns serviços faz com que a inflação esteja muito próxima do cotidiano, dando a ela uma evidência maior. “Mas é claro que os alimentos e os combustíveis, que estão mais caros, têm um peso considerável no orçamento das famílias”, afirma.
Corrosão
Segundo Murilo Hidalgo Lopes de Oliveira, diretor da Paraná Pesquisas, o consumidor é geralmente mais sensível à alta dos preços do que ao aperto no crédito na hora de conter os gastos. “A inflação está no dia a dia. No caso do crédito, mesmo com o aumento dos juros, se a prestação cabe no bolso ele vai continuar a comprar. Já a inflação corrói a renda”, diz.
Desde novembro do ano passado, a inflação vem subindo mais do que a média de salários. Dados do IBGE mostram que em março o rendimento médio real do trabalhador brasileiro ficou em R$ 1.557,00, o que representou um aumento de apenas 0,52% em relação a março do ano passado. Nesse mesmo período, a inflação, medida pelo IPCA, ficou em 6,3%. “Os dissídios salariais levam em consideração a inflação dos últimos 12 meses e a inflação atual é maior do que a passada. Esse fenômeno faz com que o poder de compra seja afetado”, lembra Cid Cordeiro.
Troca
A aceleração dos preços pegou no contrapé uma parte da população que se endividou nos últimos tempos. A cabeleireira Alaíde dos Santos, 49 anos, colocou o pé no freio do consumo para poder manter em dia a prestação do carro e do apartamento. “Eu tive que diminuir meus gastos porque tudo subiu muito e o salário ficou defasado”, conta Alaíde. Se antes ela costumava gastar R$ 300 por semana no supermercado, hoje a conta não passa de R$ 100. O caminho mais comum foi a substituição de alguns produtos – carnes e biscoitos, por exemplo – por outros de marcas mais baratas ou qualidade diferente. O leite foi riscado do cardápio, e a compra de roupas ficou em segundo plano.
A representante comercial Angela Dias Proc, de 36 anos, também encontrou na substituição dos produtos mais caros a forma para driblar a inflação. Na hora das compras no supermercado, a escolha do leite, por exemplo, passou a ser feita de acordo com o preço e não mais com base na marca. O mesmo ocorreu com os produtos de limpeza, que Angela substituiu por similares mais baratos. “Eu troco tudo, inclusive de supermercado, quando encontro preços mais acessíveis”, conta. Segundo ela, entre os itens que mais estão pesando no seu orçamento estão os combustíveis.
“A inflação tem um efeito psicológico sobre o consumo, que pode se manifestar de duas formas. O primeiro é o receio de fazer novas compras. O segundo, mais perigoso, é o de provocar a antecipação do consumo, com medo de novas altas. Foi o que ocorreu no passado e é um fenômeno que ajuda a alimentar a inflação”, lembra Murilo de Oliveira, diretor da Paraná Pesquisas.
Colaborou Cintia Junges, especial para a Gazeta do Povo