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segunda-feira, junho 21, 2010

Vínculo empregatício precisa de subordinação

Por Mariana Ghirello

"Eu amo nosso presente, você todo, você todo é lindo, bonito, gostoso, adorável, carinhoso, ótimo parceiro — pra tudo — tudo em você é perfeito, adoro te afagar, beijar, abraçar, te agradar, você é o único para quem eu disse 'eu te amo', eu te adoro, meu homem bonito, você é lindo, você é o máximo."

Esse é um dos bilhetes enviados pela autora de processo de reconhecimento de vínculo empregatício ao réu na ação. Ao analisar a prova anexada ao processo pelo reclamado, a 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (TRT-2) concluiu que é preciso haver uma relação de subordinação para que seja caracterizado o vínculo empregatício. A corte também negou o pedido de registro em carteira de trabalho e demais verbas.

De acordo com os autos, uma mulher entrou na Justiça para requerer os direitos trabalhistas contra o homem que teria sido seu chefe. Ela alegou que trabalhou para ele, na função de assessora, recebendo o salário mensal de R$ 3 mil. Diante das provas apresentadas pelo acusado, ela disse que a foto em que os dois aparecem juntos tratava-se de uma "brincadeira". Em seu depoimento, disse que não foi namorada do reclamado.

O homem, em sua defesa, afirmou que alugou uma sala para ela, que pagava o aluguel como taróloga. Porém, negou que ela tenha sido sua funcionária.

O juiz Sergio Pinto Martins, relator do processo, destacou que no caso "o conjunto da prova existente nos autos não evidencia brincadeira entre as partes". O juiz aponta que no caso não há como comprovar que existiu um vínculo empregatício, porque "estão ausentes os requisitos dos artigos 2º e 3º da CLT para a configuração do vínculo de emprego entre as partes". O primeiro caracteriza sobre o empregador, e o segundo, o empregado.

"Não havia entre as partes subordinação, mas uma relação afetiva", escreveu o em seu voto.

Martins aponta que os documentos apresentados pela defesa "demonstram de forma cristalina a existência de uma relação amorosa". E ainda que "os bilhetes indicam a existência de 'muita intimidade' amorosa entre a autora e o réu. O conteúdo dos bilhetes denotam a profunda intimidade que existia entre os litigantes".

Para o relator, as provas apresentadas pela autora não foram suficientes para provar o que ela pretendia. "Em que pesem os depoimentos das testemunhas da autora, não se extraem argumentos fortes e capazes de modificar a sentença recorrida", afirma. Ele explica que os relatos apenas esclarecem a relação que os dois tinham, e que "o fato de as duas testemunhas afirmarem que a reclamante era a única empregada do reclamado não corroboram as assertivas da autora".

"Só não posso quebrar o carinho e o amor que tenho por você, mesmo assim continuo te amando muito", diz o trecho de bilhete extraído da decisão. Segundo o relator, "as provas dos autos não favorecem a autora. Os depoimentos das testemunhas trazidas se apresentaram frágeis. Além do mais, o reclamado demonstrou documentalmente, por ocasião de sua defesa, que a relação existente não era de trabalho".

Assim, diante dos bilhetes e fotos, o juiz considerou que as provas apresentadas pela autora eram frágeis e não poderiam servir para reconhecer o vínculo trabalhista. "Considerando-se a prova documental trazida pelo réu, mantenho a decisão de origem que não reconheceu a relação de emprego entre as partes."

Por fim, o juiz negou provimento ao recurso da mulher e manteve o valor arbitrado para efeito do cálculo das custas.

Processo: 00.916.200.602.102.003 (20080870095)

Leia aqui o voto do relator.

21ª Vara do Trabalho de São Paulo

EMENTA

Relação amorosa. Inexistência de vínculo de emprego.

Ficando demonstrado pela prova dos autos que houve relação amorosa entre as partes, não se pode falar em vínculo de emprego. Não havia entre as partes subordinação, mas uma relação afetiva.

I- RELATÓRIO

Interpõe recurso ordinário Tilda Lax, às fls. 164/174, insurgindo-se contra a sentença, sob alegação de que existiu vínculo de emprego entre autora e réu. Que não foram apreciadas todas as provas constantes nos autos. Que não foi provada a existência de relacionamento amoroso entre os litigantes. Deve ser dado provimento ao recurso para modificar a sentença.

Houve isenção das custas (fls. 162).

Contrarrazões de fls. 170/184.

É o relatório.

II- CONHECIMENTO

VOTO

O recurso é tempestivo.

Conheço do recurso por estarem presentes os requisitos legais.

III- FUNDAMENTAÇÃO

A prova do vínculo de emprego era da autora, nos termos do artigo 818 da CLT, por se tratar de fato constitutivo do seu direito (art. 333, I, do CPC). Não basta serem feitas meras alegações (allegatio et non probatio quasi non allegatio).

Na exordial, a autora afirma que trabalhou para o reclamado, na função de assessora, percebendo o salário mensal de R$ 3.000,00, requerendo o reconhecimento do vínculo de emprego, registro em sua CTPS e demais verbas.

Na audiência de instrução, cuja ata está nos autos às fls. 46/49, a autora, em depoimento pessoal, afirma que não foi namorada do reclamado e que se reconhece na fotografia constante do documento 7, de fls. 84. Porém, afirmou que tratava-se de uma “brincadeira”. Sustentou, ainda, que: “...quanto aos documentos 2 e 3 confirma que a anotação manuscrita e que o teor está correto; ... quanto ao contrato de locação, documento 4 da defesa, confirma ter assinado o mesmo”.

O conjunto da prova existente nos autos não evidencia brincadeira entre as partes.

O documento de fls. 11, ao contrário do que sustenta a autora, aponta um “excesso” de intimidade entre as partes.

O reclamado, em seu depoimento pessoal de fls. 46, aduz que alugou a sala para a reclamante e que recebia os aluguéis em dinheiro ou por meio de serviços de taróloga. Por fim, negou que a reclamante tenha sido sua funcionária.

Em que pesem os depoimentos das testemunhas da autora, não se extraem argumentos fortes e capazes de modificar a sentença recorrida. Limitam-se a esclarecer que a autora convivia com o réu sem, contudo, permitir que dos depoimentos se vislumbre a caracterização dos requisitos necessários ao reconhecimento do vínculo de emprego. O fato de as duas testemunhas afirmarem que a reclamante era a única empregada do reclamado não corroboram as assertivas da autora.

As provas dos autos não favorecem a autora. Os depoimentos das testemunhas trazidas pela obreira se apresentaram frágeis. Além do mais, o reclamado demonstrou documentalmente, por ocasião de sua defesa, que a relação existente não era de trabalho.

A testemunha Nadir afirmou às fls. 48 saber de namoro entre os litigantes.

Os documentos juntados com a defesa (fls. 70/74) demonstram de forma cristalina a existência de uma relação amorosa. Os bilhetes de fls. 73/74 indicam a existência de “muita intimidade” amorosa entre a autora e o réu. O conteúdo dos bilhetes denotam a profunda intimidade que existia entre os litigantes.

(...)

“Morena = é como você sempre chamou os meus órgãos femininos, ou chama...” (fls. 74v).

O documento de fls. 104 indica que havia relação amorosa entre as partes, tanto que foi dito: “José Jorge, amorzinho. Eu amo nosso presente, você todo, você todo é lindo, bonito, gostoso, adorável, carinho só, ótimo parceiro - pra tudo – tudo em você é perfeito, adoro te afagar, beijar, abraçar, te agradar, você é o único para quem eu disse, eu te amo, eu te adoro, meu homem bonito, você é lindo, você é o máximo”.

No documento de fls. 105 consta: ”... só não posso quebrar o carinho e o amor que tenho por você, mesmo assim continuo te amando muito”.

De se notar, pois, a robusta prova documental acostada com a defesa. O contrato de locação abojado às fls. 75/80, comprova, inclusive, que a relação entre os litigantes não era de emprego.

Frise-se que, embora não contestado o período do almejado contrato de trabalho, a teor do artigo 302 do CPC, dele a autora não pode se socorrer, uma vez que as provas orais e documentais se sobrepõem às demais.

Nada obstante o inconformismo da autora nas razões de seu recurso, suas afirmações não podem prosperar. Demonstrado está no conjunto probatório dos autos, a relação amorosa existente entre as partes. Logo, diante deste fato, tem-se por afastada a pretensão da recorrente.

Não havia entre as partes subordinação, mas uma relação afetiva.

Não foi demonstrado o pagamento de valores a autora pelo réu.

Com efeito, para que se caracterize o vínculo empregatício é necessária a presença de todos os requisitos contidos nos artigos 2.º e 3.º da CLT, ou seja, que se trate de pessoa física realizando trabalho não eventual, subordinado, o que não se verifica no caso em tela.

A autora não comprovou suas alegações.

A realidade dos fatos demonstra que a autora não era empregada, pois não havia subordinação na prestação de serviços.

O réu fez a prova das suas alegações (art. 333, II, do CPC).

Estão ausentes os requisitos dos artigos 2.º e 3.º da CLT para a configuração do vínculo de emprego entre as partes.

Destarte, ante a fragilidade e insuficiência dos depoimentos das testemunhas da autora e, ainda, considerando-se a prova documental trazida pelo réu, mantenho a decisão de origem que não reconheceu a relação de emprego entre as partes.

Nego provimento.

Atentem as partes para a previsão do parágrafo único do artigo 538 do CPC e artigos 17 e 18 do CPC, não cabendo embargos de declaração para rever fatos e provas e a própria decisão.

IV- DISPOSITIVO

Pelo exposto, ACORDAM os magistrados da 8ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região conhecer do recurso, por atendidos os pressupostos legais, e negar-lhe provimento, mantendo a sentença. Fica mantido o valor arbitrado para efeito do cálculo das custas. É o meu voto.

Sergio Pinto Martins


Mariana Ghirello é repórter da Consultor Jurídico.

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