Os brasileiros - quem diria - estão recorrendo à Justiça para reivindicar o direito de abrir mão da aposentadoria que recebem do INSS. É a “desaposentadoria”, prática que ganhou força no país, a partir de 1999, quando entrou em vigor o fator previdenciário - fórmula que reduz o valor dos benefícios da maioria dos trabalhadores e cuja extinção foi vetada nesta semana pelo presidente Lula.
Como muitos aposentados continuam trabalhando - e sendo obrigados a contribuir para a previdência - a briga judicial é para desistir da aposentadoria antiga e pedir uma nova, que leve em conta os anos trabalhados a mais e a idade atual do trabalhador. Isso porque, com o advento do fator previdenciário, quanto maior a idade da pessoa e o número de anos que trabalhou, maior o valor do beneficio.
“Como no Brasil ninguém consegue parar de trabalhar, a “desaposentadoria” surgiu como uma possibilidade do segurado que já se aposentou buscar alguma contrapartida econômica pela contribuição que é obrigado a fazer. É também uma maneira de amenizar o impacto do fator previdenciário. Já tive casos em que a nova aposentadoria ficou 50% maior, mas o segurado tinha trabalhado por mais 10 anos”, diz o advogado Edson Machado Filgueiras Junior, fundador do Instituto de Advogados Previdenciários de São Paulo.
As estimativas indicam que existem cerca de 15 mil ações pedindo desaposentadoria só no Estado de São Paulo, número que tende a continuar crescendo. Só no escritório de Filgueiras Junior entram, em média, 40 novas ações por mês.
Segundo o IBGE, o país tem um contingente de 19,6 milhões de aposentados que continuam trabalhando. A Previdência não soube informar quantos destes são aposentados pelo INSS.
As decisões dos juízes têm variado entre garantir o direito à nova aposentadoria, garantir o direito mas com a devolução dos valores recebidos na aposentadoria antiga ou simplesmente rejeitar o pedido. O assunto também já chegou ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), última instância para este tema, com decisões favoráveis aos aposentados.
Na mais recente delas, de março do ano passado, a ministra Laurita Vaz, garantiu ao segurado o direito à desaposentadoria sem a devolução dos valores já recebidos. ( Leia aqui a decisão da ministra do STJ ). Mas ainda não há jurisprudência firmada sobre o tema.
“É um processo com grandes chances de vitória, mas também com risco de derrota. O que não existe é a possibilidade de o trabalhador deixar de receber a aposentadoria que já recebe. Se ele perder, só não faz a troca, continua com o benefício antigo. E antes de entrar com o processo, é preciso calcular o valor da nova aposentadoria para ter certeza de que a mudança é vantajosa”, alerta o advogado.
O Ministério da Previdência afirma que não há previsão legal para a ’desaposentadoria’ - também chamada ’desaposentação’ - e acrescenta que acordo com o Decreto 3048/99, a "aposentadoria é irreversível e irrenunciável". A Previdência só admite a possibilidade de desistência, se o segurado fizer isso antes de sacar o FGTS, o PIS e o primeiro pagamento feito pelo INSS.
Os defensores da proposta, por sua vez, argumentam que se trata de um decreto, mas que nenhuma lei nem a Constituição proíbem o trabalhador de desistir da aposentadoria. "Não há Lei que diga respeito a nenhuma proibição nesse sentido, e o princípio constitucional é o de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei", diz o texto da justificativa de um projeto apresentado este ano pelo senador Paulo Paim (PT-RS), que pretende tornar a ’desaposentadoria’ uma opção para todos os trabalhadores.
O senador acrescenta que o "Tribunal de Contas da União tem, reiteradamente, proclamado o direito de o funcionário público renunciar à aposentadoria já concedida para obter outra mais proveitosa em cargo público diverso". A proposta, apresentada este ano, aguarda votação na Comissão de Assuntos Sociais do Senado.
E antes mesmo que a questão da desaposentadoria esteja resolvida, os advogados já levantam a tese da ’despensão’. Trata-se da mesma proposta, só que apresentada pela esposa ou filho de alguém que chegou a trabalhar algum tempo depois de aposentado e já faleceu. Ou seja, o herdeiro pede a desaposentação para seu parente e, uma vez corrigida a aposentadoria, a pensão será corrigida em igual valor. As primeiras ações com este pleito devem chegar aos tribunais no próximo mês.
Fonte: Foco Regional