Dora kramer
Brasília faz aniversário na quarta-feira, dia 21 de abril, data de homenagear também Tiradentes e Tancredo Neves, simbolismos positivos, guardados benquistos.
Mas quis um ardil do destino que a capital do Brasil completasse seus 50 anos – justamente o tempo que Juscelino Kubitschek imaginou condensar o desenvolvimento do país no plano de metas “50 anos em 5” do qual a mudança da capital era sua síntese – imersa no dissabor.
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Na amargura de ver em tão pouco tempo de vida a cidade se modernizar e a política se deteriorar a ponto de um governador ser preso, o Legislativo quase todo se comprometer, um ex-governador renunciar ao Senado por improbidade, isso depois de um senador ter sido o primeiro a ter o mandato cassado por quebra de decoro parlamentar.
O Supremo Tribunal Federal está para julgar pedido de intervenção federal feito pelo Ministério Público nos poderes Legislativo e Executivo e as pesquisas mostram que, para a população, seria a solução mais adequada.
Célio Borja, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal, estudioso de Constituições, está inteiramente de acordo. “A intervenção se tornou indispensável para assegurar o princípio da moralidade previsto no artigo 37 da Constituição.”
Para ele, a eleição indireta do sucessor de José Roberto Arruda não resguarda o preceito constitucional pelo fato de boa parte da Câmara Legislativa de Brasília ter sido envolvida no escândalo que levou Arruda à cadeia e, depois, ao afastamento do cargo pela Justiça.
Duas questões propostas ao olhar experiente de Célio Borja: a autonomia política do Distrito Federal e a influência da transferência da capital sobre os meios e modos da política brasileira.
A primeira, no entendimento dele, é inevitável. Quando o Rio de Janeiro era capital, lembra, foram feitos alguns movimentos em prol da autonomia. Todos fracassados.
“Os tempos mudaram e não há como argumentar contra o direito das comunidades ao autogoverno. O problema não está na concepção da autonomia de Brasília, mas na maneira como ela é exercida, na péssima qualidade dos políticos, na falta de responsabilidade dos partidos e também em boa medida na ausência de opinião pública em Brasília.”
Como exemplo de que a autonomia de um distrito federal por si não é necessariamente uma distorção, Célio Borja lembra que Washington, a capital dos Estados Unidos, tem independência
O problema de Brasília são os vícios de origem bastante conhecidos desde as origens do Brasil. “Tudo em Brasília resultou de favores de administração federal. É uma cidade administrada por favores. Quando isso se dava só no âmbito federal ainda se mantinham as aparências, mas, agora, no plano local, nem as aparências mais se salvam.”
Passemos à segunda questão. Costuma-se atribuir a deterioração da política e dos políticos à mudança da capital para uma região geograficamente “longe do povo”. Isso confere?
Na opinião de Célio Borja, em parte é verdade.
“Juscelino argumentava que o poder central não poderia ficar submetido à pressão das demandas do povo de uma unidade da Federação. O governo federal não podia se preocupar com a falta de água ou de luz em Copacabana. Não levou em conta que o poder precisa sempre ser pressionado.”
Célio Borja acha que houve sim um vácuo de informação entre a mudança da capital e a formação de uma geração de jornalistas independentes, porque os principais nomes do jornalismo – à exceção de Carlos Castello Branco –não se transferiram para Brasília.
A crônica política ficou distante e a opinião pública, à época ainda não referida na televisão, permaneceu alheia ao que se passava na capital.
Pois bem, mas como se explica a baixa qualidade da representação nas Assembleias Legislativas e Câmaras Municipais, que continuam perto do povo e nem por isso sofrem pressões ou são importunadas com denúncias sobre suas mazelas?
“A moralidade geral de fato é muito baixa e não pode se explicar apenas pela transferência da capital 50 anos depois.”
Serve de espelho. Ao brasiliense, os cumprimentos.
Fonte: Gazeta do Povo
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