Carlos Chagas
Conforme o Aurélio, pantomima significa logro. Embuste. Também é a arte da expressão por meio de gestos. Mímica, onde se prescinde da palavra.
Com todo o respeito à memória do dr. Ulysses Guimarães, foi o espetáculo encenado pelo PMDB, no sábado que passou. Por aclamação, Michel Temer viu-se reeleito presidente do partido. A imagem que ficou foi do parlamentar paulista de mãos dadas e levantadas com José Sarney, Romero Jucá, Waldir Raupp e outros, comemorando sabe-se lá o quê. Porque dividido o PMDB estava e continuou, apesar do registro de seu presidente sobre apresentar-se unido. Deixaram de comparecer Roberto Requião, Pedro Simon, Luiz Henrique, Orestes Quércia, Jarbas Vasconcelos, André Pucinelli e outros defensores da candidatura própria à presidência da República. Como apesar de prevista sua visita aos convencionais, Dilma Rousseff não apareceu, a conclusão é de que continua tudo na mesma. O presidente Lula não quer Michel Temer como companheiro de chapa da candidata do PT e o PMDB aguarda melhores dias para definir-se. Talvez só na outra convenção, em junho.
Encolheu-se até o solitário presidente de honra do partido, Paes de Andrade, que havia anunciado a disposição de contestar a reeleição de Michel Temer, com base num discutido compromisso de fazer do deputado Eunício Oliveira o novo presidente.
Em suma, uma pantomima mesmo, muito diferente das antigas e já esquecidas reuniões dos tempos em que o então MDB insurgia-se contra o regime militar e formava na primeira linha da resistência democrática. A democracia foi restabelecida e a legenda murchou. Há quem preveja a perda da condição de maior partido nacional, nas eleições de outubro. Não vai ser fácil manter o maior número de governadores, senadores e deputados.
Trinta anos depois
O PT comemora esta semana trinta anos de existência. Durante as preliminares para sua fundação, discutiu-se com intensidade se deveria declarar-se uma legenda marxista. Foi por pouco que o rótulo deixou de ser adotado, mas entre as primeiras propostas estavam a decretação da moratória sobre a dívida externa, a estatização das indústrias de base, a participação dos trabalhadores no lucro das empresas, a limitação do ensino particular, a taxação das grandes fortunas e a imediata distribuição da terra através de radical reforma agrária. Bem como a obrigação de jamais o partido aliar-se a outras agremiações burguesas. O objetivo seria de disputar sozinho a conquista do poder.
Pois é. O PT está no poder, muita gente caiu fora, outro tanto foi mandado passear e a pureza dos tempos antigos saiu pelo ralo. Nada mais burguês do que um companheiro de hoje, a começar pelo primeiro deles. Nunca o empresariado viveu dias tão felizes, jamais a política econômica foi neoliberal como agora, ao tempo em que raras vezes se tem visto tão poucas greves e manifestações sindicais. Nem mesmo o MST constitui exceção, apesar de suas excentricidades.
A conclusão será uma de duas: ou as propostas ideológicas de 1980 estavam erradas ou o PT sucumbiu às tentações da burguesia.
Rompendo a barreira
Dois meses atrás, quando o governador Roberto Requião admitiu a hipótese de candidatar-se à presidência da República, pelo PMDB, a mídia erigiu em torno dele uma verdadeira cortina de silêncio. E não apenas a mídia, mas também as elites, os demais partidos, as associações de classe e até os institutos de pesquisa eleitoral. Nem relacionavam seu nome como uma opção para os consultados.
As coisas começaram a mudar, menos pela crise que atropela o PMDB, mais pela reação que a presença do governador vem despertando nos diversos estados que percorre. A razão é simples: enquanto Dilma Rousseff, José Serra, Marina Silva e Ciro Gomes apresentam-se como candidatos, mas sem planos ou programas de governo, Requião aparece com um elenco de postulados concretos. Promete a redução drástica da carga fiscal, a participação dos empregados no lucro das empresas, a descentralização administrativa, o apoio à pequenas e médias atividades industriais, comerciais e agrícolas, investimentos públicos maciços na infra-estrutura rodoviária e ferroviária, além dos portos, e mais uma série de objetivos diretamente voltados para quantos o ouvem. Pelo menos um serviço ele vem prestando ao processo sucessório: tira-lo da estratosfera. A prova é de que a mídia já começa a acompanhá-lo, cedendo à natureza das coisas.
Parece que não o conhecem
De uns dias para cá tem aparecido certos disparates em torno da sucessão presidencial. Ora se divulga a formação da chapa Aécio Neves-Ciro Gomes, ora se fala na permanência de José Serra no governo de São Paulo. A impressão é de que os boateiros perderam a noção da realidade. Para o bem ou para o mal, quer dizer, quaisquer que sejam seus planos para o país, neoliberais ou progressistas, José Serra não deixará de ser candidato ao palácio do Planalto. Gostaria de ter Aécio Neves como seu vice, mas não será a ausência do governador de Minas, na chapa, que o fará voltar atrás. Da mesma forma, como supor Ciro Gomes atrelado aos tucanos, ele que tem sido ferrenho adversário do PSDB, desde os tempos de Fernando Henrique?
Fonte: Tribuna da Imprensa