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terça-feira, janeiro 05, 2010

A verdadeira história de Arraes e Francisco Julião. O primeiro, servindo a si mesmo no “exílio dourado”. O segundo, só à coletividade, sem qualquer mordomia


Francisco Julião,
grande brasileiro.
nada a ver com Arraes

Valdir Stédile
“Hélio, faço votos que a candidatura do Governador Requião à Presidência da República seja vitoriosa, pois é um político preparado, corajoso e que tem condições de acabar com a bandalheira que tomou conta do Brasil. É uma alternativa válida, para destruir a malfadada e antidemocrática bipolarização que Lula pretende impor.

O PDT também deve lançar candidato, como você diz, no primeiro turno, todos os partidos deveriam apresentar nomes. No segundo turno então estudariam a melhor proposta para o país, pois só disputam os dois primeiros.

A respeito das tuas notas sobre Arraes e Francisco Julião, tive a honra de conhecer o Líder das Ligas Camponesas, Dr. Francisco Julião, um dos maiores brasileiros do século passado. Participei com ele de algumas reuniões e organizei no Paraná uma palestra na Casa do Estudante Universitário. Essa palestra serviria para a apresentação de Francisco Julião. Só que o Reitor vetou a reunião, com o vil argumento de que “um comunista não podia falar para universitários”.

Mais tarde, na casa de uma sua filha, Dona Anatilde, doutor Julião nos confidenciava suas decepções com Arraes. E contou que ARRAES, JUNTO COM OUTROS, TRAMOU PARA QUE BRIZOLA NÃO VOLTASSE DO EXÍLIO. Essa é a História, Helio”.

Comentário de Helio Fernandes
Excelente, Stédile, as informações e as opiniões sobre os dois assuntos. É depoimento de quem participou, se envolveu, não fugiu de coisa alguma. Vejamos, em primeiro lugar, (temos que começar de alguma forma) a candidatura própria dos partidos. O PMDB que dizia que “a maioria não quer um candidato, por isso não temos quem queira se apresentar”, agora perdeu a desculpa. Está aí o governador Requião, deixando o cargo pela terceira vez, tem voto, coragem, vontade e desprendimento.

Poderia cuidar apenas dos seus próprios interesses, voltar para o Senado, mais 8 anos de vida garantida. Também, não é um iniciante como presidenciável, em 1994 tentava obrigar o PMDB a ter candidato, a cúpula era praticamente a mesma, não houve chance. Eleito senador, insistia em 1998, quem conseguiria convencer a esses aproveitadores a se arriscarem, já que a lei não obriga (devia obrigar) à candidatura presidencial?

Você fala pelo PDT, o partido que foi de Brizola, e que ele começou a fundar quando perdeu o PTB. Por causa da interferência de Golbery, que cooptou Dona Ivete, e entregou a ela o PTB. E assim, tratando dessa dupla traição, entramos no segundo episódio, mais traição e novamente contra Brizola. Que sempre soube de tudo, e não aceitava Arraes de modo algum. Dizia: “Ele não tem nada a ver com a minha história”. Era verdade.

Fui muito amigo de Julião, nunca, nem uma vez que fosse, falei com Miguel Arraes. Podem dizer que os 15 anos em que fiquei no Brasil e Arraes e Julião foram para o exterior, criaram uma barreira de relacionamento intransponível. Mas antes disso, tivemos outros 15 anos de participação, (antes do golpe) fiquei muito amigo de Julião e jamais quis me aproximar de Arraes.

O depois governador de Pernambuco várias vezes, não admitia concorrência com a liderança de Julião. Quando este criou as Ligas Camponesas, Arraes já governador, montou o que chamou de Sindicato Rural. Visível, ostensiva e perseguidora ação contra Julião. Este, desprendido, generoso, construtivo, não protestou, continuou na luta, só muito mais tarde revelou a trama contra a coletividade, na verdade um golpe contra os que não o apoiavam.

O que você conta no final do post, Stédile, revelação de Julião, era do conhecimento de Brizola há muito tempo. O governador do Rio Grande do Sul e da Guanabara costumava fazer comparação com o comportamento da ditadura, em relação a ele, Brizola e na proteção, (como ele dizia) a Arraes.

Brizola, textual, nas suas conversas que não paravam nunca: “A ditadura deixou Arraes escolher para onde ir, eu tive que fugir para Montevidéu, ou seria assassinado”. Totalmente verdade. E continuando: “Dias depois de chegar a Montevidéu, a ditadura pediu o meu INTERNAMENTO numa praia deserta, longe da capital”.

E insistia, aí no que era público e notório: “Arraes teve um asilo maravilhoso, tendo a Argélia à sua disposição, amigo do ditador comunista, passava fins de semana em Paris e em outros lugares praticamente vizinhos”.

“Sofri na carne o fato de ser oposição mesmo, fomos governadores, (Arraes também), mas sem diálogo, não podia esquecer das manobras dele contra mim”. Brizola gostava de informação, não havia nada, em matéria de política, que desconhecesse. Não espalhava nem admitia intrigas, mas tomava conhecimento do que se passava nos bastidores.

Todos respeitavam Brizola, ninguém ou poucos se aproximavam de Arraes. Vejam o que Brizola realizou, principalmente no Rio Grande do Sul. Em Pernambuco, Arraes foi o Campeão Mundial do NADA.

* * *

PS – A última vez que vi Julião, na inauguração da Linha Vermelha. Fui com Brizola, ele fez questão de convidar o fundador das Ligas Camponesas, não admitia de maneira alguma, que algum protocolo, botasse o nome de Arraes. Se colocassem, ele tiraria, muito justamente.

PS 2 – Eu e Julião trocamos longo e emocionado abraço. Como demorasse a inauguração, (o atraso foi inexplicável, Brizola cobrava muito), ali no asfalto, em pé, nós três, em algumas horas, bastaria que tivéssemos a conversa gravada e poderíamos editar um livro de História. Vivida, sofrida, escolhida pela convicção de cada um.

PS 3 – Se fosse um livro individual, poderia ter o mesmo título que Pablo Neruda colocou no seu: “Confesso que vivi”.

Helio Fernandes /Tribuna da Imprensa

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