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quarta-feira, janeiro 06, 2010

Enquanto Serra não vem

Dora Kramer

Depois de muita conversa entre a cúpula do partido nessa virada de ano, o PSDB resolveu inverter o enunciado do problema segundo o qual o início dos trabalhos eleitorais dependia da definição oficial do candidato a presidente.

De agora até março passa a vigorar o oposto: o partido dá a largada exatamente para preservar o candidato, ocupando todos os espaços de ataque, defesa e organização da logística a fim de reduzir as pressões para que o governador de São Paulo, José Serra, assuma a condição de porta-voz da oposição no processo de sucessão do presidente Luiz Inácio da Silva.

Trata-se, no dizer dos dirigentes, da “montagem de uma retaguarda” composta pelos parlamentares, diretórios e as estruturas das campanhas estaduais.

São eles os encarregados de falar sobre as posições do partido, comentar as notícias do dia a dia, criar fatos políticos, denunciar ações do governo que se prestarem a denúncias, enfim, chamar sobre si todas as atenções.

Com isso, atendem a uma reivindicação de Serra, que há tempos vinha aborrecido com o fato de o PSDB achar que a tarefa do embate caberia exclusivamente àquele que na eleição vai representar a voz e a face do partido.

Como isso o governador não queria nem podia fazer, inclusive porque havia outro pretendente (Aécio Neves), o campo oposicionista simplesmente não se mexia, vivia uma espécie de compasso de espera permanente.

A nova linha de ação foi facilitada por dois fatores que, na visão dos tucanos, fizeram o PSDB “fechar” 2009 em situação favorável: a desistência do governador de Minas, Aécio Neves, de pleitear a candidatura presidencial e a permanência do governador de São Paulo num primeiro lugar praticamente sem oscilações.

A retirada de Aécio livrou o PSDB da formalidade da dúvida sobre o candidato e a vantagem consolidada (até agora) dá ao partido desenvoltura para contrapor a versão do governo de que a ministra Dilma Rousseff está em situação privilegiada.

“Não está, com toda a popularidade de Lula, Dilma tem 23% no melhor cenário, aquém dos 30% previstos para o fim do ano pela expectativa divulgada pelo PT em meados de 2009”, diz o deputado Jutahy Magalhães, que tem participado dessas avaliações sobre a agenda do PSDB nesse vácuo até a saída de Serra do governo de São Paulo, em 2 de abril.

Na pauta, além de “bater o bumbo” sobre a vantagem nas pesquisas, o PSDB inclui a “denúncia” dos comerciais de empresas privadas cujos textos são muito semelhantes ao discurso do governo. Ou seja, não vendem seus produtos, mas o “mood” publicitário do governo.

Qual prejuízo isso imputaria ao campo do adversário?

Além de desvendar a manobra, “alertar”, principalmente multinacionais como a Ambev e a GM, sobre a politização de suas filiais.

Nessa agenda há, no entanto, um tema interditado: a formação da chapa puro-sangue. Pergunte-se mil vezes a respeito ao presidente do partido, Sérgio Guerra, e mil vezes ele responderá: “Por enquanto é tempo de calar.”

Processo (in)decisório

Para quem não gosta de arbitrar, preferindo pairar acima de qualquer conflito, Lula tem paradas duras para resolver antes de passar a faixa presidencial: a escolha dos novos aviões caças da FAB (ele prefere os franceses, a Aero­­­náutica os suecos), a querela entre os Ministérios da Defesa e Justiça sobre os crimes da ditadura e a extradição de Cesare Battisti.

Aos dois primeiros assuntos o presidente sempre poderá aplicar seu habitual método de impulsão com a parte mais protuberante do abdome.

Já sobre Battisti, a partir da publicação do acórdão do Su­­­premo Tribunal Federal, prevista para fevereiro ou março, o presidente tem 40 dias para dar o veredicto.

Perdas e ganhos

Prefeito do Rio, Eduardo Paes começou se inspirando em projetos de ordenamento urbano de São Paulo, mas, pelo resultado de seu “choque de ordem” na cidade apinhada de turistas, pode terminar exportando tecnologia.

O projeto foi um sucesso na virada do ano e no cotidiano tem feito, pelo menos da zona sul, um espaço de convivência mais civilizada. Barracas de praia padronizadas, ambulantes uniformizados, guarda municipal em todo canto, frescobol, futebol e assemelhados banidos da beira do mar, aplicação rigorosa da lei seca, fiscalização das regras de estacionamento, presença do poder público, enfim, é o melhor remédio.

O governador Sérgio Cabral, cuja ação na ocupação dos morros livrou parte deles do domínio do tráfico, ficou em desvantagem no quesito menção honrosa por seu sumiço nas primeiras 24 horas da tragédia de Angra dos Reis, onde seis meses antes havia autorizado construções em área de proteção ambiental.

Se, como disse ele, a tragédia era “anunciada”, Cabral é réu confesso do crime de omissão.
Fonte: Gazeta do Povo

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