Dora Kramer
Quem ganha em 2010 com o zero a zero que se estabeleceu entre os grandes partidos em matéria de escândalos de corrupção é uma questão em aberto. Mas, por ora, quem perde não resta a menor dúvida de que é o discurso pela retomada da ética na política e, consequentemente, o país.
Algumas mentes deformadas chegam a comemorar o empate nesse macabro campeonato porque, assim, o assunto estaria devidamente interditado na campanha eleitoral durante a qual os concorrentes tratariam apenas de assunto relevante: a comparação entre os governos Luiz Inácio da Silva e Fernando Henrique Cardoso e a tão desejada polarização em feitio de “nós” contra “eles”.
Há quem chegue quase a dar graças a Deus pelo fato de a cúpula do governo do Distrito Federal ter se exibido podre em praça pública, porque isso retiraria o moral das críticas à rotina de imoralidades que tomou conta do ambiente político e facilitaria um compromisso de não-agressão entre os contendores nessa área.
Teríamos chegado então àquele patamar em que, na impossibilidade de se restaurar a moralidade, locupletam-se todos. É um cenário realmente desanimador, que não permite celebrações, mas possibilita a indagação à capacidade de o Brasil prosseguir em sua trajetória bem-sucedida e obter ainda os avanços em áreas como saúde, educação, segurança pública, preservação do meio ambiente, se não houver um mínimo de preocupação com a correção de condutas.
Impossível imaginar um país desenvolvido onde a dissolução dos costumes seja uma praxe incorporada à rotina pela força do hábito, pela tradição e pela amplitude da adesão.
Alguém terá de romper a inércia e dizer que é preciso pôr um paradeiro nas transgressões simplesmente porque um Estado de Direito não sobrevive se não houver respeito às leis.
Se os partidos não o fizeram por falta de credibilidade para tal, acabarão atropelados pela sociedade. No curso da campanha do ano que vem será absolutamente impossível os partidos ignorarem a mazela.
Não adianta desqualificar o assunto dizendo que é “udenismo” ou “farisaísmo”. A questão vai aparecer justamente pelos motivos que os partidos hoje acreditam que ela possa desaparecer.
Como já se viu que não se trata de um mal localizado, é evidente que o desconforto com a indecência generalizada acabará se impondo talvez até de forma preponderante.
Não há pacto de não-agressão firmado no Planalto que resista à realidade percebida na planície.
E, nesse aspecto, o escândalo de Brasília foi devastador para todos. Não é uma discussão em tese nem se trata de indícios, suspeitas ou meras acusações. As cenas mostradas na televisão atingem à massa do eleitorado, que imediatamente – até pelas referências feitas no noticiário – se remete a outros casos.
De imediato o maior prejudicado é o DEM. Mas a ele já surgem acoplados personagens do PSDB e do PMDB, para citar apenas os personagens essenciais da eleição presidencial, não obstante legendas das áreas de influência das forças adversárias também estejam representadas na quadrilha.
Isso faz uma conta de soma zero? Ao contrário. Exibe de maneira escancarada um somatório de atitudes delituosas que não escaparão ao juízo do eleitorado.
Sangue frio
Na sexta-feira em que explodiu o escândalo em Brasília, o vice de José Roberto Arruda, Paulo Octávio, estava de folga em Itaparica (BA). Foi avisado por um amigo empresário do que ocorria na capital e aconselhado a voltar para lá. Paulo Octávio não se abalou: ficou, dançou, jogou tênis e se divertiu como se não houvesse amanhã.
Pela condescendência do DEM, que não vê motivo para punições não obstante as referências nas gravações sobre a parte que lhe cabia na partilha do dinheiro distribuído por Durval Barbosa, o vice sabia de antemão que não havia por que se afligir.
E, pelo menos por enquanto, não viu razão para demitir seu executivo Marcelo Carvalho, que aparece em um dos vídeos guardando dinheiro numa mala preta.
Só na certa
Observação de um tucano engajado (na campanha de José Serra): “Aécio só aceitará ser vice se tiver certeza de que o Serra vai ganhar”.
Troca de guarda
Parcela expressiva do setor produtivo e do mercado financeiro nutre a expectativa de que em algum momento Lula substitua Dilma Rousseff por Antonio Palocci na candidatura presidencial.
Não por coincidência, quem diz isso – e não são poucos – considera José Serra intervencionista demais.
Em dois encontros recentes, e em locais diferentes, reunindo gente da indústria e da área de investimentos, foi bem recebida a informação de que o candidato pode desistir a qualquer tempo mesmo depois de oficialmente indicado em convenção do partido.
Fonte: Gazeta do Povo
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sexta-feira, dezembro 04, 2009
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