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domingo, julho 02, 2023

Juros elevados são uma aberração no Brasil, mas já foi pior e não faz muito tempo…

Publicado em 2 de julho de 2023 por Tribuna da Internet

Taxa Selic Inflada!! – Jornal Tempo Real

Charge do Gilmar Fraga (Gaúcha/Zero Hora)

Vinicius Torres Freire
Folha

É fácil entender a fúria quase geral contra a altura horrível das taxas de juros, agora associadas diretamente à política do Banco Central. No entanto, as taxas de linhas importantes de crédito bancário já estiveram em nível mais alto do que no arrocho de agora. É impossível medir o nível de fúria em relação a juros de outros anos. O que pode ter mudado?

A parte da renda mensal dedicada ao pagamento de empréstimos está no nível mais alto desde que o Banco Central publica esse indicador, março de 2005. Útil quanto possível, esse número tem suas insuficiências. É um agregado ou média: grosso modo, quanto dos rendimentos das famílias do país inteiro é dedicado a pagamentos de juros e principal de empréstimos, por mês. É fácil supor que deve haver gente com menos dívida e mais renda e vice-versa.

ÉPOCA DA COVID – Além do mais, houve baixa grande das taxas de juros durante o colapso da Covid, tendência que vinha dos anos pós-Grande Recessão, de PIBinho e de inflação cadente. Por comparação a esse vale, a alta recente causa mais revolta; houve de resto uma onda de endividamento.

O fato maior é que o rendimento médio do trabalho é apenas 5% maior do que em 2012. Desde então, vidas, empregos e empresas foram arruinados por dois colapsos recessivos e pelo crescimento quase nenhum de 2017-19.

Obviamente, não se quer dizer que o nível da taxa de juros no Brasil, aberração mundial, seja motivo menor da grita dirigida contra BC, rentistas, bancos ou o que seja.

TEM DE ENTENDER – Quer se dizer que: 1) temos um problema crônico de crédito; 2) taxas bancárias já estiveram mais altas; 3) mesmo que a Selic caia, certas taxas continuarão altas por algum tempo, por motivos conjunturais e estruturais.

Exemplo: a taxa média de financiamento de bens que não veículos está no nível mais alto desde 2011 (desde quando há dados comparáveis) com exceção de meados de junho de 2015 a meados de 2018 —foram os anos da Grande Recessão e do seu rescaldo, quanto quase todas as taxas foram recordes em 12 anos.

Por outro lado, a taxa média do financiamento imobiliário, apesar da alta ruim recente, é menor que no período que vai de 2011 a 2017. Mas essa taxa baixou de patamar devido a mudanças regulatórias e na concorrência, entre outras.

CARROS E CARTÕES – O custo médio de financiar um veículo subiu muito de meados de 2021 para cá (de cerca de 16% ao ano para 22%), mas está no nível registrado em 2011. Etc.

A taxa média do cartão de crédito parcelado (201% ao ano) está em altura jamais vista desde 2011. A do cartão rotativo ainda é menor do que os 498% ao ano do pico de 2016. Mas é piada sinistra dizer “menor” quando a taxa atual é de 448% ao ano. É mortal do mesmo jeito.

As taxas do cartão rotativo mal vão se mover com Selic menor ou pintada de roxo. É um crédito ruim, que precisa ser revisto e em que inadimplência é de mais de 50%.

TAXAS BÁSICAS – Sim, o custo do crédito varia com as taxas básicas da economia, embora seus níveis não sejam determinados pela Selic. Situação de crédito das famílias, evolução da renda do trabalho, garantias, melhorias regulatórias, concorrência, PIB, tudo isso vai influenciar o destino dos juros.

No caso das empresas que levantam dinheiro no mercado de capitais, as taxas começam a despiorar. As taxas de juros mais longas caem, apesar da Selic imóvel, por melhorias de expectativas macroeconômicas.

Sim, se a Selic cair e dívida pública estiverem controladas, com menos instabilidade econômica, os ditos juros longos vão cair ainda mais. No entanto, não basta o BC rodar uma manivela para que o crédito seja menos aberrante ou que a dor do arrocho diminua muito. Estivemos em colapso socioeconômico por muito tempo, até para nossos padrões ruins.

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