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sábado, setembro 03, 2022

Entrevista: Gerd Leonhard: "A Rússia é o último grande país que pode levar a um potencial desastre"




Para o escritor e futurólogo Gerd Leonhard, a "única coisa totalmente incerta no mundo" é a Rússia. A guerra tornou a Europa mais "atenta à História" e o continente deve impulsionar mudança global. 

O futurista alemão Gerd Leonhard é erscritor, consultor — e optimista. Reflete sobre os atuais desafios que a Humanidade enfrenta, tais como a crise climática ou a guerra na Ucrânia, e como os poderá superar. Convicto de que os próximos 10 anos poderão trazer mais transformações do que os últimos 100, acredita que o futuro poderá ser melhor do que o presente — mas, para isso, é preciso agir já.

À margem das conferências do Estoril, onde foi um dos oradores convidados, Gerd Leonhard abordou, em entrevista ao Observador, vários desafios que a Humanidade enfrenta atualmente. Na mudança de paradigma que defende, o futurista alemão aponta que Portugal pode ter um papel importante — devido ao seu “humanismo” e “criatividade”.

A guerra na Ucrânia continua a ser um tema que preocupa a Europa e que tem impactos na vida de todos os europeus. A invasão levada a cabo pelo atual regime russo é uma prova do falhanço da democracia e da diplomacia?

É uma questão difícil, mas a única coisa totalmente incerta no mundo hoje em dia é a Rússia. É a potência mais incerta e o poder está concentrado nas mãos de uma pessoa — Vladimir Putin. Se compararmos com a China, por exemplo, vemos que o regime de Pequim não reside apenas numa pessoa, há várias relações com o partido [comunista]. A Coreia do Norte é difícil, mas é mais pequena. Se há um país no mundo que não sabemos como avaliar é a Rússia. A Rússia é o último grande país que pode levar a um potencial desastre.

Enquanto futurista, como é que vê o fim do conflito?

Eu penso que há uma grande hipótese de compromisso no futuro, assim que Putin entender que a guerra foi um sucesso. É difícil dizer quando, porque depende apenas de uma pessoa, não de um governo.

Mas quais é que pensa que são as condições para Putin sair da Ucrânia e considerar que obteve uma vitória?

Aos olhos da Rússia, o principal problema da Ucrânia é a NATO. Para a Rússia — e na minha opinião também —, não foi muito boa ideia alargar a NATO para perto das suas fronteiras. Assim, considero que a Ucrânia ser um país neutral será uma condição fundamental.

O que é que a Europa aprendeu desde o início da guerra?

A Europa aproximou-se e respondeu conjuntamente a esta crise. Além disso, aprendemos que temos de prestar mais atenção à História — o conflito na Ucrânia estava a formar-se há 15 anos. E também temos de estar mais focados no futuro e entender os riscos. Por exemplo, a Alemanha estava dependente do gás russo e a estratégia que adotava relativamente aos vizinhos de Leste foi um falhanço, principalmente no que diz respeito à política energética e à sua relação com a Rússia.

É um grande defensor da utilização das energias renováveis. Considera que a guerra na Ucrânia pode impulsionar o uso de energias limpas?

Sim, está a fazer a Europa ir mais rápido. Mas, ao mesmo tempo, está a forçar-nos a trazer de volta a centrais a carvão. E a guerra mostra que estamos demasiado dependentes do gás e do carvão — e isso vai requerer mudanças drásticas.

O que sugere para diminuir o uso de energias fósseis?

Um imposto pan-europeu de emergência. Todos os cidadãos de todos os países europeus devem contribuir para um fundo de emergência para a construção de tecnologias renováveis e para a sua implementação. O objetivo é lutar contra a poluição e, no fundo, salvarmo-nos. Devemos, depois, retribuir esse imposto aos cidadãos doutras maneiras, como créditos para carros elétricos ou para a colocação de painéis solares. Se fizermos isso, também criamos milhares de empregos.

E como é que a Europa vai implementar isso?

Temos todos de concordar que é a coisa certa para fazer. Na altura da pandemia de Covid-19, as pessoas estavam a morrer e concordámos todos em usar máscara e produzir uma vacina. Chegámos a acordo nessa altura; agora, também temos de chegar a acordo no que concerne à crise climática. Temos de aumentar os impostos na aviação e na pecuária.

Defende que a Europa deve estar na dianteira de uma mudança global. Que papel pode desempenhar Portugal?

A mudança tem de vir precisamente do sul — de países como Portugal, Espanha, Itália e Grécia. São países mais humanistas e conseguem arranjar soluções mais criativas. Por exemplo, os alemães não são muito criativos, são mais engenheiros. Nas energias renováveis, Portugal pode também ter um papel preponderante, principalmente na energia solar.

Já referiu que a Covid-19 obrigou a Europa a repensar as suas prioridades. Passados dois anos e meio desde o início da pandemia, o que se aprendeu?

Penso que aprendemos muitas coisas, algumas delas dolorosas. Apesar de algumas disputas ou lutas, aprendemos que podemos colaborar: fizemos uma vacina em poucos meses. Não havia regras, não havia patentes, não havia marcas a competir: em 13 meses, o mundo conseguiu uma vacina. E demo-la a toda a gente. Aprendemos que a ciência e a tecnologia podem ajudar-nos. Temos de fazer isso agora com a crise climática.

Como?

A Covid-19 foi um teste para a crise climática: aprendemos a superar todas as diferenças e atuámos. Temos de fazer o mesmo naquele domínio. A tecnologia vai ajudar-nos.

Tem alertado, ainda assim, para os perigos da tecnologia.

Penso que a tecnologia pode ser poderosa ao ponto de nos desumanizar. Noutras palavras: a tecnologia pode ser fantástica, precisa é de ter contexto e sabedoria para usá-la. Vou dar um exemplo: dentro em breve podemos ter a cura para o cancro e também robôs que combatem numa guerra. No meio disto tudo, temos de encontrar um compromisso e perceber o que é bom para nós.

O Brasil tem eleições daqui a um mês…

Vou lá estar daqui a uma semana. Vou encontrar-me com Lula da Silva e com Simone Tebet numa conferência.

O que pensa que vai acontecer?

É complicado. Jair Bolsonaro perdeu toda a credibilidade para fazer o que quer que seja. A resposta à pandemia de Covid-19 foi má. As respostas aos problemas climáticos foram terríveis.

Se tivesse que fazer um prognóstico para as próximas eleições, qual seria?

Acho que Bolsonaro vai sair da presidência. Provavelmente, Lula vai ganhar. Ainda assim, é complicado prever. O Brasil é um país difícil, tem a ver com questões históricas, apesar de ter o potencial para tornar-se o país do futuro. Os recursos estão todos lá. Mas vai ser complicado corrigir o Brasil, mesmo que Lula ganhe.

E como antevê o futuro pós-eleitoral no Brasil?

Com muito caos, prevejo um conflito muito grande entre as duas fações [de Lula e Bolsonaro]. Contudo, tenho esperança de que a situação poderá resolver-se e o Brasil poderá mudar para melhor.

Observador (PT)

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