Uma boa gerência de coalizão cria condições para a sustentabilidade democrática e inclusão social responsável
Por Carlos Pereira* (foto)
Até que ponto o equilíbrio da Constituição de 1988 e do Plano Real, caracterizado pelo tripé inclusão social, responsabilidade macroeconômica e democracia, estaria ameaçado?
Meu colega Marcos Mendes, um dos maiores especialistas em contas públicas, acredita que existem problemas estruturais que estariam colocando em risco tal equilíbrio. Na sua coluna na Folha de S. Paulo (22/04/2022), Marcos vaticinou que, diante do enfraquecimento do Executivo na política orçamentária e do baixo crescimento econômico, as condições de governabilidade estariam se deteriorando e que problemas institucionais se avizinhariam.
Marcos tem razão ao expressar preocupação com a perda de discricionariedade do presidente no orçamento. Hallerberg e Marier já haviam demonstrado que um Executivo forte, via centralização do processo orçamentário, é a chave para reduzir déficit público e gerar políticas públicas universais, especialmente em sistemas eleitorais proporcionais de lista aberta para o Legislativo que estimula paroquialismos, como é o brasileiro.
Eleições que resultam em derrota do incumbente é um fenômeno raro. De acordo com Przeworski, 4 em cada 5 incumbentes se reelegem. O fato de o presidente Jair Bolsonaro estar correndo sérios riscos de não ser reeleito é um sinal claro de que a crença de inclusão social responsável e sob democracia é um imperativo dominante e que gera perdas eleitorais para quem desvia.
Ineficiências nas relações Executivo-Legislativo têm sido consequência da sucessão de péssimos gerentes do presidencialismo multipartidário brasileiro e não de problemas estruturais de seu desenho institucional.
A saída encontrada por Bolsonaro via “orçamento secreto” para lidar com a impositividade da execução das emendas foi predatória porque escolheu se aliar ao Centrão em condições de extrema vulnerabilidade política e, portanto, com baixo poder de barganha para estabelecer os termos de negociação.
Se souber como o presidencialismo multipartidário opera, nada impede que um novo presidente eleito possa se valer da sua legitimidade e popularidade para reverter o quadro e montar e gerenciar de forma virtuosa e eficiente uma coalizão majoritária alinhada às crenças de inclusão social responsável e democracia. Não será difícil convencer parlamentares que o jogo orçamentário coordenado pelo presidente gera menos incertezas para os próprios legisladores.
O inquietante é que a alternativa eleitoral mais viável para derrotar Bolsonaro até o momento também demonstrou ser um mau gerente de coalizão e não há sinais claros de aprendizado diante de seus erros.
*Cientista Político e professor titular da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas (FGV Ebape)
O Estado de São Paulo