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Italo Nogueira
Folha
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O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral terá nesta segunda-feira, dia 10, o seu primeiro teste como colaborador da Justiça ao depor sobre acusações contra sua mulher, Adriana Ancelmo, pela suposta lavagem de dinheiro por meio do escritório de advocacia dela.
Este será o primeiro interrogatório do ex-governador após ter o acordo de colaboração com a Polícia Federal homologado pelo ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal). O processo ganha relevância porque os procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato no Rio de Janeiro desconfiam que o agora delator omitiu crimes cometidos pela ex-primeira-dama mesmo após passar a confessar seus delitos.
LAVAGEM DE PROPINA – A defesa do ex-governador chegou a tentar adiar o depoimento. Mas ele foi mantido pelo magistrado. Cabral será ouvido pelo juiz Marcelo Bretas sobre a acusação de ter lavado R$ 3,1 milhões da propina obtida junto a fornecedores do estado por meio da rede de restaurantes de comida japonesa Manekineko e o escritório da ex-primeira-dama.
De acordo com o Ministério Público Federal, o dinheiro vivo obtido como suborno do ex-governador era usado para remunerar funcionários dos restaurantes. Em contrapartida, o Manekineko fazia transações bancárias de mesmo valor para o escritório de Adriana, que por sua vez emitia notas fiscais para simular serviços advocatícios não prestados à empresa.
“PROBLEMAS” RESOLVIDOS – A dinâmica solucionava um problema para os dois lados. Cabral conseguia dar aparência legal, por meio do escritório da mulher, aos valores que recebeu ilegalmente. A empresa, por sua vez, pagava seus funcionários por fora do registro em carteira, o que reduzia custo de encargos e eventuais ações trabalhistas futuras –que usam como base de condenação o valor do salário oficial.
O esquema da lavagem foi detalhada pelo dono do Manekineko, o empresário Ítalo Garritano. Ele firmou acordo de delação premiada após a Folha revelar as suspeitas sobre a rede de restaurantes. Garritano era cunhado do advogado Thiago Aragão, sócio de Adriana Ancelmo. Os três também vão depor nesta segunda-feira.
PROTEÇÃO – O depoimento é esperado com expectativa por procuradores fluminenses. Um dos pontos de resistência à delação de Cabral no Ministério Público Federal era a suspeita de que ele buscava proteger a mulher. Foi o que ele fez em seu primeiro depoimento a Bretas em que confessou os crimes que lhe eram imputados.
Cabral disse que enganou a mulher ao pedir que dinheiro de propina fosse repassado ao seu escritório. Na ocasião, ele se referia aos repasses da Reginaves, empresa também conhecida como Frangos Rica.
CONTAMINAÇÃO – “A Adriana tinha o escritório dela e eu contaminei esse escritório quando eu pedi o repasse de caixa dois, que ela não sabia, para o dono da Rica [empresário Alexandre Igayara]. Eu contaminei. Ela insistiu comigo e questionou para saber por que estava sendo utilizado. Eu enganei e a prejudiquei. E ela entrou como orcrim [organização criminosa] de uma maneira que me dói o coração”, afirmou o emedebista.
A versão parece inverossímil para os investigadores. Cabral ainda não explicou como ela permitiu a entrada de recursos sem a prestação de serviço correspondente. O casal, inclusive, já foi condenado por lavagem por meio do Manekineko. A ação penal da Operação Calicute, a primeira contra o ex-governador, já relatava a lavagem de R$ 990 mil dessa mesma forma.
TORNOZELEIRA – Adriana já foi condenada em quatro ações penais e já soma 36 anos e 1 mês de pena. Ela está em liberdade, usando tornozeleira eletrônica, após ter passado um período presa. A ex-primeira-dama também responde pela lavagem de dinheiro por meio da compra de joias.
Cabral, por sua vez, já foi condenado em 13 processos e soma mais de 282 anos de prisão. Preso há mais de três anos, ele espera conseguir a liberdade usando o selo de colaborador da Justiça para derrubar os quatro mandados de prisão que tem contra si.
RISCO – A expectativa da defesa de Cabral —e temor dos procuradores fluminenses— é a de que, ao se tornar colaborador, não há mais razão para mantê-lo preso preventivamente, sob risco de interferir na investigação ou permanecer cometendo crimes.
O advogado Alexandre Lopes, que defende a ex-primeira-dama, afirmou que ela “jamais participou de qualquer ilícito porventura praticado por terceiros envolvendo o restaurante Manekineko”.
“O referido restaurante contratou o escritório Ancelmo Advogados para a prestação de serviços jurídicos, que efetivamente foram realizados. A denúncia formulada pelo Ministério Público Federal não possui base real”, disse o advogado. A defesa de Cabral não se manifestou.