Carlos Newton
O Brasil é um país cada vez mais surrealista, cujas autoridades parecem viver num mundo de fantasias e faz-de-conta. Vejam a atual campanha lançada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, oferecendo um número 0800 para que os trabalhadores de “cooperativas” denunciem estar sendo explorados.
“Se você é cooperativado e tem um chefe, denuncie”, pede o Ministério, numa campanha cujo objetivo é combater as falsas cooperativas, criadas para burlar as leis trabalhistas. Mas como acreditar numa campanha dessas, se o governo é o maior incentivador das falsas cooperativas, que terceirizam suas atividades? A Caixa Econômica, por exemplo, está cheia de terceirizados/cooperativados. Leia essa mensagem enviada por um leitor da Tribuna:
“Parabenizo à todos que se levantam contra os desmandos na administração pública e aproveito para sugerir matéria sobre as terceirizações na Caixa Econômica Federal. É fato que mesmo após a realização de concurso no ano passado (2010) para o cargo de advogado em diversos estados da Federação, bem como a aprovação de aproximadamente 1.500 pessoas, em uma processo seletivo rigoroso, os aprovados assistem com revolta quase que diariamente a contratação de escritórios terceirizados para a realização exatamente das mesmas atividades para as quais o concurso foi realizado. Não podemos mais nos calar! A Constituição Federal simplesmente é ignorada e mais, os terceirizados contrariamente ao que podem muitos pensar, representam gasto muito superior ao da contratação regular dos concursados! Então resta uma pergunta: A quem interessa a manutenção desses desmandos???”
A Petrobras também turbinou a contratação de funcionários terceirizados e está usando esse tipo de mão de obra de forma irregular até em atividades estratégicas e de alto risco, como a fiscalização de serviços de prospecção de petróleo nas plataformas em alto-mar. Os terceirizados chegam perto de 300 mil funcionários em todo o sistema. Com base em cálculos do Ministério Público do Trabalho e do Tribunal de Contas da União, em torno de 80% estão em situação irregular, exercendo atividades-fim que só poderiam ser executadas por concursados, segundo determina a Constituição, no artigo 37.
Pelo último balanço oficial da estatal, relativo a 2009, para cada funcionário concursado a Petrobras tinha 3,8 terceirizados. Em 2010, a proporção teria sido de 3,6, segundo a estatal: 291 mil terceirizados para um quadro de carreira de 80 mil funcionários.
Confirmado esse quadro na divulgação do próximo balanço de sustentabilidade, a Petrobras terá contabilizada a contratação de 135 mil terceirizados desde 2005 – quando 92 mil foram aprovados em concurso – enquanto o quadro de concursados aumentou em 26 mil. Nos últimos cinco anos, para cada concursado admitido pela empresa, entraram cinco terceirizados/cooperativados.
Nos governos estaduais e nas prefeituras, o panorama é o mesmo. Proibição de concursos públicos e liberdade total à terceirização, que é uma das formas mais criativas de favorecer a corrupção na administração pública, daí o sucesso da prática nas últimas décadas.
Em meio a essas irregularidades, vem o Ministério do Trabalho e lança uma campanha falsa, tão falsa quanto as cooperativas que fornecem mão de obra especializada aos governos, em seus vários níveis. Mas que país é esse, Francelino Pereira? Ora, é o pais das maravilhas, onde Alice, Peter Pan e a Fada Sininho circulavam num mundo do faz-de-conta e do nunca-jamais.
Fonte: Tribuna da Imprensa